Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 08, 2006

O debate de hoje


Os jornais deste domingo estão coalhados de reportagens sobre como Lula e Alckmin se preparam para o debate desta noite, na Band. Algumas coisas são aborrecidamente previsíveis. Lula vai refutar qualquer crítica que receba voltando-se para o passado, comparando o seu governo ao de FHC. A comparação, se bem feita, lhe é desfavorável. Mas, para que assim seja, é preciso entrar em algumas minudências, que escaparão ao telespectador. Por isso Alckmin vai jogar a bola para o futuro, reiterando o que Lula fez de errado e como e por que se pode fazer diferente.

Risco para Lula: parecer agressivo, em molde “oposicionista”, quando quem está na Presidência é ele. Risco para Alckmin: tentar negar a sua origem tucana, deixando de destacar as muitas virtudes que o governo FHC teve: da brutal queda da mortalidade infantil à universalização da telefonia, passando pelo fim da superinflação, com o Plano Real, há um passado do qual pode se orgulhar. Mas tem de ser uma defesa, digamos, ofensiva, não reativa. De todo modo, o que importa é o futuro.

O tema da corrupção deve render bons embates. Lula insistirá que seu governo é implacável com desvios éticos, que enfrentou duas (ou três) CPIs, coisa que FHC e o próprio Alckmin não fizeram. Exaltará as operações da Polícia Federal, que teriam desbaratado quadrilhas que se formaram em governos anteriores etc e tal. Temos lido, visto e ouvido isso todos os dias. Alckmin pode listar os escândalos e indagar quantos malandros petistas foram efetivamente punidos. Até agora, não há um só militante “de um outro mundo possível” em cana. Lula dirá que isso é problema da Justiça. Alckmin pode responder que é também de quem dificulta investigações.

Houve, sim, denúncias de corrupção no governo FHC, mas não no centro do poder, a metros da sala presidencial. E, sobretudo, não com a abundância de provas que se vê. O procurador-geral da República aponta a existência de 40 quadrilheiros que tentaram tomar o país de assalto. Alguns deles eram e são da mais absoluta confiança de Lula. Com falação para lá e para cá, tudo pode terminar numa troca de tiros e, dadas as regras do debate, num empate — que será injusto. O PSDB não tentou comprar o Congresso Nacional ou dar golpe eleitoral com dossiês fajutos. Essas são questões de fato, não de gosto pessoal.

O elemento de desempate é um só: de onde saiu o dinheiro para comprar o dossiê? Alckmin tem de fazer a Lula a pergunta que Diogo fez a Tarso Genro no Podcast: ele, Lula, teve a curiosidade de ligar pra seus amigos pessoais, Jorge Lorenzetti e Osvaldo Bargas, e perguntar de onde saiu o dinheiro sujo? Há mais: Alckmin não deve fazê-lo, o que certamente é um desserviço ao debate democrático, mas deveria também indagar como Lula explica a vertiginosa ascensão de um de seus filhos no mundo dos negócios, com a pressurosa colaboração da Telemar, uma empresa que tem o BNDES como acionista. A questão não é privada, não. O BNDES é um banco público.

“Ah, Reinaldo, você quer uma carnificina?” Quero. O petismo se beneficia do bom-mocismo dos que lhe fazem oposição, embora negue a terceiros a lhaneza com que é habitualmente tratado. E fiquemos atentos também ao padrão jornalístico do encontro. Dada a menor evidência de que se tenta decretar que, “no fundo, todos os partidos são iguais”, decretem soberanamente diante da TV: “Trata-se de um debate fraudado”.
Por Reinaldo Azevedo

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