Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, outubro 24, 2006

AUGUSTO NUNES Esse garoto sabe das coisas

Coisas da Política
24/10/2006

Augusto Nunes
augusto@jb.com.br



Esse garoto sabe das coisas


Contei já faz tempo que, até assumir o posto de Primeiro-Filho, Fábio Luiz Lula da Silva, o Lulinha, era apenas mais um entre milhões de jovens brasileiros atormentados pela escassez de empregos e por incertezas financeiras. Formado em biologia, atravessara 2002 sem emprego fixo. Sobrevivera como monitor do Jardim Zoológico de São Paulo e, depois, com os trocados que juntou nas aulas particulares de inglês e informática.

No fim de 2002, associado a dois filhos do companheiro Jacó Bittar, velho amigo da família, Lulinha criou uma agência de publicidade. Se Lula tivesse perdido a eleição, a idéia não iria muito longe. Como ganhou, os jovens empreendedores logo constatariam que o Brasil é, simultaneamente, a terra das oportunidades e um paraíso dos oportunistas.

A vida começou a melhorar quando o primogênito passou a percorrer atalhos desmatados pelo onipresente Daniel Dantas, craque em fazer amigos, influenciar pessoas e ganhar fortunas - e, também, especialista em fazer inimigos, exasperar pessoas e perder dinheiro. Sinuosas rotas mapeadas por Dantas conduziram aos braços da Telemar o primeiro fruto do casamento entre Luiz Inácio e Marisa Letícia.

Em outubro de 2004, Lulinha e os irmãos Bittar fundiram a agência com a Espaço Digital e subordinaram as empresas a uma holding batizada de BR-4. Dois meses depois, a Telemar, prestadora de serviços de telefonia por concessão do governo federal, propôs aos jovens felizardos um contrato que elevaria substancialmente o capital da BR-4. Era só o começo.

O casamento com a Telemar gerou a Gamecorp, destinada a conceber jogos para a internet e produzir peças de entretenimento para canais de TV a cabo. A Gamecorp nasceu com um dote de R$ 10 mil. Em poucos dias lhe caíram na conta R$ 5 milhões depositados pela Telemar. Foi a primeira de uma série de doações singularmente generosas.

Em meados de 2005, sócio de três empresas, o Primeiro-Filho tinha R$ 625 mil em ações. Mais que o patrimônio do pai (à época, R$ 422 mil declarados). Na pátria da gente que faz, Lulinha fez. Hoje com 30 anos, é milionário. Merecia tornar-se garoto-propaganda do Programa Primeiro Emprego. Mas o presidente Lula jura que não é de misturar assuntos de governo com coisas de família.

Reage com especial irritação a notícias que tratam o filhão não como um gênio da informática mas como um beneficiário do sobrenome. Que, como demonstra a edição desta semana da revista Veja, vai aprendendo a transformar o parentesco privilegiado numa das trilhas que encurtam os caminhos do enriquecimento. Lula repetiu que o menino tem todo o direito de tocar a vida longe da vigilância da imprensa, dos adversários políticos e das instituições democráticas. E jurou hostilidade eterna aos que ousam violentar-lhe a privacidade.

Pura bravata. Primeiro, porque Lulinha é um brasileiro como outro qualquer, mesmo que imagine o contrário. Segundo, porque Lula consegue esquecer até agravos reais se assim o aconselharem circunstâncias político-eleitorais. Essa amnésia seletiva o levou a perdoar, por exemplo, os responsáveis pela mais medonha das noites infligidas ao atual presidente.

Em 1989, valendo-se de uma ex-namorada de Lula, Fernando Collor não poupou sequer a adolescente Lurian para tentar destruir moralmente o adversário. Há dias, o agora senador eleito por Alagoas informou que votará em Lula neste dia 29. A vítima retribuiu o mimo do algoz. Declarou que, no Congresso, Collor poderá fazer "um trabalho excepcional".

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