o globo
Ao abrir o 11 Congresso do PCdoB, quinta à noite, Lula disse que quer ter como aliados "três ou quatro partidos" no ano que vem, mas que isso é como casamento: eles têm que querer. Foi um agrado à esquerda, pois é nesse campo que Lula terá de colher suas alianças para 2006.
Lula jura não ter revelado nem a dona Marisa se vai disputar a reeleição, mas anda a cada dia mais candidato. Falou a linguagem dos mais de mil comunistas reunidos, declarando que não deixará a direita se apropriar das conquistas de seu governo e que não serão as ameaças dos conservadores que o farão se decidir ou não pela candidatura. O presidente deixou o resort da Academia de Tênis, onde se reunia o PCdoB, ao som de "um, dois, três.. Lula outra vez".
Depois de sofrer os efeitos devastadores da pior crise política de seu governo, que teve em sua origem uma opção equivocada no terreno das alianças ao centro e à direita, Lula começa a refazer o caminho quase da estaca zero para reconstruir uma base política para disputar a reeleição. Não é tarefa fácil.
Dos antigos parceiros de 2002, o PL, que lhe deu um vice que ajudou a tranquilizar as elites empresariais, está fora. O PTB e o PP, que a ele se juntaram posteriormente no governo, também estão descartados. Dificilmente alguém vai querer aliança explícita com os partidos do mensalão, que tendem a se desidratar na eleição. PSDB e PFL são os principais adversários e vão estar juntos. O PSOL é uma pedrinha no calcanhar do PT. O PPS, uma sigla raivosa que ou terá candidato próprio ou irá a reboque da oposição.
O velho PMDB de guerra é um caso à parte. Flerta com o governo Lula mas não oferece qualquer garantia de aliança formal. Vai realizar prévias para escolha de um candidato próprio e pode sair de Garotinho, Rigotto ou qualquer outro. Mas pode ir de Lula. Ou de ninguém. Nesse caso, repetiria o comportamento de eleições anteriores, quando não obteve unidade para ter candidato próprio e dividiu-se entre várias opções. Uma vez terminado o processo eleitoral, estava sempre no governo.
Ainda assim, mesmo sem perspectiva de aliança formal sagrada em convenção, e pela metade, Lula quer o PMDB. Mas sabe muito bem que, na linha do pragmatismo que dá o tom no partido, só o terá se estiver muito bem nas pesquisas lá para maio ou junho do ano que vem. Se esse for o caso, não importará sequer o fato de o partido já ter candidato próprio escolhido nas prévias de março. Este será descartado ou cristianizado facilmente pelos companheiros.
O problema é que Lula não pode esperar sentado até lá. Em março ou abril do ano que vem já terá que estar com chapa mais ou menos acertada — e esse prazo já lhe foi colocado pelo próprio José Alencar, que quer ter seu destino definido a tempo de se desincompatibilizar para disputar outra eleição se não for mantido como vice na chapa do PT.
Por isso, enquanto o PMDB não vem, o presidente constrói uma frente à esquerda, com gente considerada de sua confiança: PT, PCdoB, PSB. Se depender dos sonhos do Planalto, o terceiro partido ao qual Lula terá se referido será o PDT (o PMDB é o quarto).
Pode parecer perseguição, já que o ex-petista Cristovam Buarque, sempre às turras com o PT, acaba de se filiar ao PDT e tem uma candidatura presidencial na mira. Mal saiu, já está sendo procurado por intermediários de Lula com a oferta de apoio a uma candidatura a governador no DF. Cristovam dificilmente aceitará, mas o cerco vai continuar. O Planalto ficou muito animado com o comportamento dos pedetistas na eleição de Aldo Rebelo na Câmara e acha que tem jogo para 2006.
A aliança de Lula à esquerda não lhe garantirá grandes coisas em tempo de propaganda na TV e talvez nem mesmo os melhores palanques Brasil afora. Em matéria de estrutura partidária, só a quase impossível aliança formal com o PMDB representaria um grande ganho — ainda assim, a depender da definição da última regra do jogo eleitoral do ano que vem, a manutenção ou não da verticalização das coligações. Lembram os articuladores petistas, porém, que tampouco Lula tinha a seu favor uma grande máquina partidária em 2002.
O maior desafio dessa opção de alianças à esquerda — ou falta de, diriam alguns —, será afinar a viola e botar todo mundo para defender a política econômica de Palocci nos palanques de 2006. Que vai ser engraçado, vai.
Entrevista:O Estado inteligente
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