Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, outubro 21, 2005

Dora Kramer - Para a oposição, agora é Lula

Dora Kramer - Para a oposição, agora é Lula


O Estado de S. Paulo
21/10/2005

Partidos avaliam que foi um erro preservar a figura do presidente no início da crise A oposição recrudesceu o tom no embate com o governo, não propriamente em virtude da convocação do tesoureiro da campanha de Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais em 1998, mas em função de uma constatação recente: foi um erro de avaliação concordar tacitamente em preservar a figura do presidente Luiz Inácio da Silva do escândalo acerca dos modos adotados pelo PT para financiar o apoio da base no Congresso e sustentar projeto de crescimento eleitoral progressivo por meio de campanhas milionárias.
Os oposicionistas - aí considerando PFL, PSDB e uma parte do PMDB - caminham também para a conclusão de que pode não ter sido eficaz a carga pesada lançada sobre a prática do caixa 2 no PT, permitindo que o governo adotasse essa versão, deixando de lado as evidências de que a contabilidade paralela de campanha eleitoral explica uma parte, mas não diz tudo a respeito dos empréstimos bancários, já admitidos como fraudulentos, intermediados por Marcos Valério Fernandes de Souza.

Essa revisão de procedimentos aparece com nitidez na nota conjunta que PSDB e PFL divulgaram na quarta-feira, responsabilizando Lula pela "montagem de uma farsa" para justificar com o caixa 2 um esquema de corrupção injustificável.

Para recuperar o tempo considerado perdido - pois a oposição avalia que Lula não está eleitoralmente tão alquebrado como esperavam a esta altura -, de agora em diante a orientação é carregar nas tintas dos ataques ao presidente e marcar a diferença entre a prática do caixa 2 e o uso de instrumentos de Estado para favorecer politicamente um governo e vitaminar eleitoralmente um partido.

Se não houver recuo e o procedimento se mantiver, terá vencido a tese desde o início defendida pelo presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen, e pelo porta-voz dos oposicionistas do PMDB, deputado Geddel Vieira Lima.

Ambos sempre argumentaram com o PSDB que os tucanos corriam o risco de se tornar sócios da crise caso não demarcassem, muito bem demarcados, seus terrenos e alvos de ataque.

Escaldado pela derrota na eleição presidencial, precedida de acentuado desgaste do governo Fernando Henrique, o tucanato interpretou que não seria prudente assumir o papel de "carrasco" de Lula e se baseou na antiga estratégia agressiva do PT - adotada nas três derrotas anteriores - para optar por atitude mais branda e, digamos, até civilizada.

Fidalguia, note-se, que não tem sido observada na contenda interna envolvendo as pré-candidaturas do governador Geraldo Alckmin e do prefeito José Serra.

Ira santa

A despeito de todas as declarações polêmicas, para dizer o mínimo, do presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, causou espécie sua conduta durante o julgamento do mandado de segurança de José Dirceu.

Nas interrupções aos votos dos outros ministros, Jobim pareceu agressivo, parcial, autoritário e sobretudo inconveniente. Marcou posição, o que pode ser útil aos planos de deixar o STF para voltar à política a partir de abril, mas se expôs gratuitamente, denotando uma aflição ausente na manifestação dos outros dois ministros que votaram como ele, mas o fizeram de maneira natural.

Ontem no STF já havia quem antecipasse com gáudio a diferença que haverá quando da substituição de Nelson Jobim pela ministra Ellen Gracie na presidência.

Quanto pior

A intenção manifesta pelo Palácio do Planalto de recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra a continuidade dos trabalhos da CPI dos Bingos é uma aposta na tese do quanto pior, melhor.

O governo estará alimentando conflitos entre os Poderes e trocando uma crise política por uma crise institucional.

O argumento do desvio de foco pela CPI é fruto de uma avaliação unilateral, que não necessariamente encontrará abrigo no Congresso.

O governo alega que a comissão não poderia investigar o assassinato de Celso Daniel porque foi criada para examinar crimes ligados às atividades de jogo.

Mas a CPI não abraça a tese do crime comum e considera que o seqüestro do prefeito tem ligação com um esquema de corrupção que tem o jogo como um de seus pilares.

Pior ainda

A tentativa de adiar, se possível cancelar, a acareação entre o chefe de gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho, e os irmãos Bruno e João Francisco Daniel, também não ajuda o PT a ganhar adeptos para a tese do crime comum.

Se ela é firme e inquestionável, Gilberto Carvalho saberá enfrentar o confronto com a tranqüilidade dos justos.

Palacianos argumentam com parlamentares de oposição que Carvalho não teria condições psicológicas nem atributos pessoais suficientes para enfrentar uma acareação daquela envergadura. "É um simplório", alega-se.

Por essa versão, temos um simplório ("crédulo, ingênuo, pacóvio, tolo", diz o Houaiss) na chefia de gabinete da Presidência da República, o que desmerece Lula em sua condição de chefe de equipe responsável pela escolha de auxiliares.

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