Entrevista:O Estado inteligente

sábado, outubro 15, 2005

LÚCIA HIPPOLITO, DESSA VEZ, NÃO ENTENDEU Paulo G. M. Moura

BLOG de Diego Casagrande
LÚCIA HIPPOLITO, DESSA VEZ, NÃO ENTENDEU

por Paulo G. M. Moura, cientista político

A cientista política Lúcia Hippolitto conquistou o lugar de destaque que merece na mídia. Combinando bom jornalismo com a Ciência Política, Lúcia faz a diferença entre o simples comentário do óbvio – reinante na imprensa brasileira – e a boa análise política. O poder de síntese do seu texto completa suas qualidades como profissional talhada para o rádio e a TV, coisa rara para quem têm formação acadêmica e não sabe (ou não quer) tornar a linguagem e o conhecimento acessíveis ao público leigo.

Em seu comentário do dia 14/10, na rádio CBN (reproduzido no blog do Noblat), logo cedo pela manhã, Lúcia não conseguiu desvendar a lógica do comportamento do governo e do presidente Lula no último período da conjuntura. Ao abordar as falas recentes do presidente, nas quais ele afirmou que "não vai recorrer a medidas populistas e eleitoreiras apenas para garantir sua reeleição no ano que vem", Lúcia especula em busca de respostas, dizendo:

"E o que seriam essas medidas populistas e eleitoreiras? Talvez obrigar o Banco Central a baixar abruptamente os juros para menos de 10%, ou vender casas populares a um real, ou ainda triplicar o valor do salário mínimo em 2006. Poderia também copiar a Argentina e decretar uma moratória, dando o calote nos credores externos. Acontece que o próprio presidente Lula já reconheceu que muitas das propostas que ele fez quando era oposição significavam apenas bravatas, e Lula decidiu não fazer mais bravatas depois que assumiu a presidência da República."

Lula segue fazendo bravatas, mas isso é outro assunto.

O presidente-candidato não vai brincar com a política econômica, pois é ela que lhe confere lastro junto a seus aliados no mundo do Kapital, o que, aliás, se comprova pela prática, mais do que pela retórica. Até mesmo o trotskista Raul Pont já assimilou isso. Lúcia Hippolito, no entanto, acha curiosa a insistência de Lula em repetir que não vai fazer loucuras, nem vai cair num populismo desvairado apenas para garantir sua reeleição. "A quem o presidente estaria querendo convencer? Ao PT, que pede modificações no rumo da política econômica?", pergunta ela.

E ela mesma responde: "Alguns poderiam imaginar que se trata de um recado à oposição, como se o presidente estivesse querendo dizer que tem a faca e o queijo na mão, e que se a oposição não se comportar bem, ele poderá recorrer a mais pura demagogia para garantir mais quatro anos de mandato. Mas talvez Lula esteja querendo convencer a si mesmo, procurando fugir da tentação fácil das medidas assistencialistas, demagógicas e populistas, tão ao gosto de governantes em busca de reeleição. Para o bem de todos, tomara que o presidente continue resistindo à tentação." Encerra.

Lúcia, dois fatores explicam esse comportamento de Lula:

1 – Em primeiro lugar, o recurso à boa técnica do marketing político, que ensina que personalidades públicas com ambições políticas, e que entenderam a lógica da luta pelo poder na era da mídia eletrônica e das pesquisas de opinião publicadas, devem agir como se estivessem em campanha eleitoral permanente. Isto é, pautando suas intervenções públicas a partir de pesquisas quantitativas e qualitativas; produzir factóides midiáticos; disputar com a oposição a difusão das suas versões para os acontecimentos que a imprensa noticia, e recorrer aos conceitos teóricos de foco, posicionamento, imagem e discurso, que orientam as concepções contemporâneas do marketing eleitoral e integram o receituário de quem orienta a propaganda pessoal que Lula faz de sim mesmo, valendo-se das prerrogativas do cargo;

2 – Em segundo lugar, o que explica o comportamento de Lula, é a, digamos, "carência de inteligência" dos seus adversários. As falas de Lula e as ações do Palácio do Planalto e do PT, nesse momento, correspondem à nova correlação de forças entre governo e oposição, decorrente dos erros da segunda ao abrir mão do processo de impeachment contra Lula quando teve a faca e o rabo do rato na mão. A oposição está permitindo a Lula, ao governo e ao PT, começar a retomar a iniciativa e reconstruir suas condições de pautar o jogo político, após essa vantagem competitiva - que raramente escapa das mãos dos governos - ter passado às mãos da oposição com os escândalos de corrupção cujas investigações definham com a cumplicidade dos adversários (?) do petismo.

As condições de reversão do quadro adverso em que se meteu ainda impõem dificuldades ao petismo, mas o quadro é, visivelmente, de franca recuperação para o governo, o PT e o presidente-candidato. Considero que nem tudo está perdido para a oposição, desde que ela reconheça seus erros, mude de posição estratégica e saiba aproveitar os imprevisíveis imprevistos – como essa suspeitíssima morte do legista de Celso Daniel – para retomar a ofensiva. Mas, temo que a oposição esteja mais preocupada em esconder seus próprios rabos do que em cortar o de Lula.

O centro do esforço de marketing do candidato-presidente está em tentar pautar a agenda eleitoral de 2006 com a questão da política econômica. Feito isso, a tarefa seguinte seria aprofundar, como vem fazendo, a comparação do desempenho de seu governo nessa área, ao desempenho dos governos tucano-pefelistas que o antecederam e que tentam sucedê-lo no cargo. Nesse contexto, tornam-se compreensíveis as falas de Lula como tentativas de acusar a oposição de querer solapar as bases da "sua" bem sucedida política econômica.

Suprema ironia, Lula usa contra os tucanos, como fizeram os tucanos contra ele no passado, a política econômica e o medo como armas políticas. Lula quer matar qualquer esperança do povo em ter dias melhores do que esse desempenho econômico medíocre do seu governo nos é capaz de garantir, ao aplicar, com mais ortodoxia, a política econômica do ex-ministro Malan.

Para completar, Lúcia, recebi por e-mail uma propaganda-convite do governo para comparecer a um seminário internacional alusivo aos dois anos do Programa Bolsa-família, que, suponho, você deva ter recebido também.

Posso estar enganado, mas tudo leva a crer que Duda Mendonça segue pautando o marketing de Lula. Barba, cabelo e bigode.

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