LÚCIA HIPPOLITO, DESSA VEZ, NÃO ENTENDEU |
por Paulo G. M. Moura, cientista político |
A cientista política Lúcia Hippolitto conquistou o lugar de destaque que merece na mídia. Combinando bom jornalismo com a Ciência Política, Lúcia faz a diferença entre o simples comentário do óbvio – reinante na imprensa brasileira – e a boa análise política. O poder de síntese do seu texto completa suas qualidades como profissional talhada para o rádio e a TV, coisa rara para quem têm formação acadêmica e não sabe (ou não quer) tornar a linguagem e o conhecimento acessíveis ao público leigo. Em seu comentário do dia 14/10, na rádio CBN (reproduzido no blog do Noblat), logo cedo pela manhã, Lúcia não conseguiu desvendar a lógica do comportamento do governo e do presidente Lula no último período da conjuntura. Ao abordar as falas recentes do presidente, nas quais ele afirmou que "não vai recorrer a medidas populistas e eleitoreiras apenas para garantir sua reeleição no ano que vem", Lúcia especula em busca de respostas, dizendo: "E o que seriam essas medidas populistas e eleitoreiras? Talvez obrigar o Banco Central a baixar abruptamente os juros para menos de 10%, ou vender casas populares a um real, ou ainda triplicar o valor do salário mínimo em 2006. Poderia também copiar a Argentina e decretar uma moratória, dando o calote nos credores externos. Acontece que o próprio presidente Lula já reconheceu que muitas das propostas que ele fez quando era oposição significavam apenas bravatas, e Lula decidiu não fazer mais bravatas depois que assumiu a presidência da República." Lula segue fazendo bravatas, mas isso é outro assunto. O presidente-candidato não vai brincar com a política econômica, pois é ela que lhe confere lastro junto a seus aliados no mundo do Kapital, o que, aliás, se comprova pela prática, mais do que pela retórica. Até mesmo o trotskista Raul Pont já assimilou isso. Lúcia Hippolito, no entanto, acha curiosa a insistência de Lula em repetir que não vai fazer loucuras, nem vai cair num populismo desvairado apenas para garantir sua reeleição. "A quem o presidente estaria querendo convencer? Ao PT, que pede modificações no rumo da política econômica?", pergunta ela. E ela mesma responde: "Alguns poderiam imaginar que se trata de um recado à oposição, como se o presidente estivesse querendo dizer que tem a faca e o queijo na mão, e que se a oposição não se comportar bem, ele poderá recorrer a mais pura demagogia para garantir mais quatro anos de mandato. Mas talvez Lula esteja querendo convencer a si mesmo, procurando fugir da tentação fácil das medidas assistencialistas, demagógicas e populistas, tão ao gosto de governantes em busca de reeleição. Para o bem de todos, tomara que o presidente continue resistindo à tentação." Encerra. Lúcia, dois fatores explicam esse comportamento de Lula: 1 – Em primeiro lugar, o recurso à boa técnica do marketing político, que ensina que personalidades públicas com ambições políticas, e que entenderam a lógica da luta pelo poder na era da mídia eletrônica e das pesquisas de opinião publicadas, devem agir como se estivessem em campanha eleitoral permanente. Isto é, pautando suas intervenções públicas a partir de pesquisas quantitativas e qualitativas; produzir factóides midiáticos; disputar com a oposição a difusão das suas versões para os acontecimentos que a imprensa noticia, e recorrer aos conceitos teóricos de foco, posicionamento, imagem e discurso, que orientam as concepções contemporâneas do marketing eleitoral e integram o receituário de quem orienta a propaganda pessoal que Lula faz de sim mesmo, valendo-se das prerrogativas do cargo; 2 – Em segundo lugar, o que explica o comportamento de Lula, é a, digamos, "carência de inteligência" dos seus adversários. As falas de Lula e as ações do Palácio do Planalto e do PT, nesse momento, correspondem à nova correlação de forças entre governo e oposição, decorrente dos erros da segunda ao abrir mão do processo de impeachment contra Lula quando teve a faca e o rabo do rato na mão. A oposição está permitindo a Lula, ao governo e ao PT, começar a retomar a iniciativa e reconstruir suas condições de pautar o jogo político, após essa vantagem competitiva - que raramente escapa das mãos dos governos - ter passado às mãos da oposição com os escândalos de corrupção cujas investigações definham com a cumplicidade dos adversários (?) do petismo. As condições de reversão do quadro adverso em que se meteu ainda impõem dificuldades ao petismo, mas o quadro é, visivelmente, de franca recuperação para o governo, o PT e o presidente-candidato. Considero que nem tudo está perdido para a oposição, desde que ela reconheça seus erros, mude de posição estratégica e saiba aproveitar os imprevisíveis imprevistos – como essa suspeitíssima morte do legista de Celso Daniel – para retomar a ofensiva. Mas, temo que a oposição esteja mais preocupada em esconder seus próprios rabos do que em cortar o de Lula. O centro do esforço de marketing do candidato-presidente está em tentar pautar a agenda eleitoral de 2006 com a questão da política econômica. Feito isso, a tarefa seguinte seria aprofundar, como vem fazendo, a comparação do desempenho de seu governo nessa área, ao desempenho dos governos tucano-pefelistas que o antecederam e que tentam sucedê-lo no cargo. Nesse contexto, tornam-se compreensíveis as falas de Lula como tentativas de acusar a oposição de querer solapar as bases da "sua" bem sucedida política econômica. Suprema ironia, Lula usa contra os tucanos, como fizeram os tucanos contra ele no passado, a política econômica e o medo como armas políticas. Lula quer matar qualquer esperança do povo em ter dias melhores do que esse desempenho econômico medíocre do seu governo nos é capaz de garantir, ao aplicar, com mais ortodoxia, a política econômica do ex-ministro Malan. Para completar, Lúcia, recebi por e-mail uma propaganda-convite do governo para comparecer a um seminário internacional alusivo aos dois anos do Programa Bolsa-família, que, suponho, você deva ter recebido também. Posso estar enganado, mas tudo leva a crer que Duda Mendonça segue pautando o marketing de Lula. Barba, cabelo e bigode. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sábado, outubro 15, 2005
LÚCIA HIPPOLITO, DESSA VEZ, NÃO ENTENDEU Paulo G. M. Moura
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