Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, outubro 21, 2005

Augusto Nunes - O teórico da roubalheira

Augusto Nunes - O teórico da roubalheira


Jornal do Brasil
19/10/2005

Convidado a dizer o que pensava do caixa dois, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sucumbiu a um raro acesso de sinceridade. "Isso é coisa de bandido", resumiu. Se gosta do emprego, é bom mudar de idéia. Não pensam assim o chefe de governo, o vicepresidente da República e o novo comandante do PT.

Na delirante entrevista concedida em agosto na França, Lula informou que o caixa dois é, digamos, um defeito de fabricação do Brasil. "O PT só fez o que, infelizmente, todos os partidos sempre fizeram", garantiu. Há dias, em meio a comentários sobre cassáveis de estimação, José Alencar desandou de vez.

"Eu penso que pode cassar, mas tem que cassar todo mundo", radicalizou o vice. "Um companheiro de partido falou: 'Lembra dos santinhos do Ildeu nas eleições de 1998?'. Os santinhos foram para a minha campanha para o Senado e não foram declarados. Então, o meu mandato tem de ser cassado". Na Câmara, ganhou apelido novo: "Presidente 2".

Ricardo Berzoini decidiu que sua primeira tarefa como presidente eleito do PT seria desmatar a trilha mapeada por Lula e Alencar. Ao longo da semana, avançou a golpes de foice pelo caminho que o levaria a teorias capazes de explicar que o PT não cometeu nem pecados veniais.

Incumbido de recuperar a Previdência Social, Berzoini fabricou a maior fila de aposentados do mundo. Encarregado de provar que caixa dois é bobagem, que não houve roubalheira nem casos de corrupção no governo, ampliou o acervo de tolices até perder-se na mata dos trapalhões.


Entrevistado pelo E st ad ão , Berzoini declarou que "o caixa dois é do nosso folclore político". Admitiu que se trata de "uma ilegalidade", mas a prática sempre existiu e seguirá existindo – "no PT e fora dele" – até que seja instituído o financiamento público das campanhas eleitorais.

Assim, o desastrado Berzoini reconheceu que nunca houve "o partido da ética na política". Também desafiou a Justiça Eleitoral ao confessar que a lei será atropelada nas eleições de 2006. Enfim, apontou a estratégia traçada pelo governo e pelo PT para safar-se do Pântano do Planalto: agarrar-se à falácia de que ninguém roubou, não há corruptos. Todos ficaram no pecado venial.

"Há caixa dois com corrupção e sem corrupção", diria depois à Fo- lha o inventivo teórico da bandidagem. "Corrupção é ter um relacionamento com o empresariado que condicione contribuições de campanha a decisões administrativas". Pois foi isso que o PT fez.

Isso e muito mais. O valerioduto não poderia financiar campanhas em 2003: não houve eleições, mas jorrou dinheiro. Em 2004, um PT em situação falimentar repassou milhões a parceiros de aluguel. Lavanderias de dinheiro sujo foram instaladas no exterior. Esses e outros crimes foram comprovados pelas CPIs, ou estão perto do esclarecimento. É inútil Berzoini posar de acusador. O réu é o PT.

 


No espantoso "Improviso da Urucubaca", um dos melhores momentos do palanqueiro incontrolável, o Cabôco foi informado por Lula de que, além de brasileiro, "Deus é carioca e marinheiro". O Cabôco deduziu que Lula só queria agradar à platéia e afagar a cidade onde discursava. Quer saber por que nenhum assessor lembrou ao chefe que não estava no Rio. Estava no outro lado da Baía de Guanabara. Em Niterói.

 

A culpa é da vítima
Além da alegria exibida por todo monoglota autorizado a dispensar intérpretes, o presidente Lula mostrou em Portugal o que Nelson Rodrigues chamaria de saúde de vaca premiada. Apesar da agenda superlotada, encontrou tempo e energia para também falar de vacas pouco viçosas. Essas pastam em Eldorado, município de Mato Grosso do Sul onde se localizou um foco de febre aftosa.

Segundo dados oficiais, foram liberados até terça-feira apenas R$ 555,2 mil dos R$ 35,3 milhões prometidos pelo orçamento de 2005 para ações de erradicação da doença. O ministro Roberto Rodrigues (foto) passou o ano alertando para o perigo e pedindo o dinheiro que Lula garante nunca ter faltado. "O principal responsável é o proprietário do rebanho", decidiu. Simples: a culpa é da vítima.

Santo André já provocou sete silêncios
Sorrisos convinha evitar. Mas alguns dirigentes do PT não conseguiram conter suspiros de alívio ao saberem da sétima morte vinculada de alguma forma à tragédia de Santo André. Agora foi a vez do legista Carlos Delmonte Printes, que examinou o corpo do prefeito assassinado Celso Daniel. Morto aos 55 anos, Printes não poderá depor na CPI dos Bingos. Falarão por ele o laudo que produziu e as revelações feitas em setembro ao Ministério Público, algumas reproduzidas no Programa do Jô.

Esse legado, omitido em 2002 por burocratas intimidados pelos petistas, atesta que Celso Daniel não foi vítima de um crime comum. "Antes de morrer, ele sofreu torturas brutais", contaria o legista três anos depois. "Isso só acontece quando criminosos querem informações". O prefeito de Santo André, laboratório onde se criou o esquema do mensalão, sabia muito.

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