Mas as dificuldades são inegáveis.
De acordo com dados divulgados na quinta-feira, as construções novas e os pedidos de autorização para construir caíram para os níveis mais baixos já vistos numa década, mostrando que o setor de construção de imóveis residenciais continua em queda livre.
E os preços dos imóveis continuam excessivamente altos. A depressão no setor habitacional, provavelmente, vai durar anos e não meses.
Entretanto, fica claro que o problema hipotecário não está absolutamente controlado. Por exemplo, ele já não se limita às hipotecas subprime, empréstimos feitos a pessoas que não satisfazem os critérios financeiros normalmente aceitos. Problemas existem também, e cada vez maiores, com as chamadas hipotecas Alt-A (não pergunte do que se trata) que constituem outros 20% do mercado hipotecário. E já começam a surgir dificuldades com os empréstimos prime (de baixo risco), o que era de se esperar, diante da profundidade do colapso do setor de imóveis residenciais.
Muita gente em Wall Street vem clamando por um socorro financeiro, para que Fannie Mae (associação hipotecária federal), o Federal Reserve (banco central americano), ou qualquer outro, intervenha e compre os títulos lastreados por hipotecas dos atribulados fundos hedge. Mas esse socorro seria como se os contribuintes auxiliassem financeiramente a Enron ou a WorldCom quando essas empresas faliram - iria redimir maus atores das conseqüências por seus atos iníquos.
Isso porque está cada vez mais claro que tanto a bolha imobiliária dos últimos anos, como a bolha do mercado acionário no final dos anos 90, foram provocadas e alimentadas por má conduta.
As agências de classificação de risco como a Moody?s Investors Service, que são muito bem pagas para classificar títulos lastreados por hipotecas, parecem ter assumido um papel similar àquele dos contadores envolvidos nos escândalos corporativos, há alguns anos. Na década de 90, esses contadores complacentes certificaram como corretas declarações financeiras de empresas que eram questionáveis; e nesta década, as agências de classificação declararam títulos lastreados por hipotecas duvidosos como sendo da mais alta qualidade, ativos AAA.
Contudo, o desejo de evitar que esses maus atores fiquem à solta não deve nos impedir de fazer a coisa certa, não só moralmente como em termos econômicos, no caso dos tomadores de empréstimos vítimas da bolha. Muitas das propostas para solucionar o problema dos tomadores de empréstimos subprimes são do tipo "porta arrombada, tranca de ferro".
Elas poderiam frear as práticas abusivas de empréstimo - o que teria sido muito útil há três anos -, mas não ajudarão muito agora. O que necessitamos neste exato momento é de uma política para lidar com as conseqüências do colapso do setor habitacional.
Consideremos um tomador de empréstimo que não consegue realizar os pagamentos da sua hipoteca e enfrenta uma execução hipotecária. No passado, como sublinhou recentemente Gretchen Morgenson, repórter de negócios do The New York Times, o banco que fez o empréstimo muitas vezes se dispunha a oferecer uma solução, modificando as condições do empréstimo para que ele ficasse mais acessível, já que valeria mais a pena receber o que o tomador do empréstimo pudesse pagar do que incorrer nos custos de uma execução judicial e tentar revender o imóvel. Isso seria especialmente possível ante um mercado imobiliário em queda.
Contudo, como diz Morgenson, hoje o agente hipotecário que realizou o empréstimo no geral é "o primeiro elo do carrossel financeiro". A hipoteca foi colocada num mesmo pacote com outras e vendida a bancos de investimentos que, por seu lado, repartiram os direitos hipotecários de modo a produzir ativos artificiais que a Moody? s, ou a Standard & Poor?s, se dispuseram a classificar como AAA. E o resultado é que não há ninguém para resolver isso.
Para mim, esse é um caso típico exigindo a intervenção do governo.
Existe um sério colapso do mercado e solucionar esse problema pode ajudar enormemente milhares, talvez centenas de milhares, de americanos. O governo federal não deve fornecer um socorro financeiro mas cooperar para que seja encontrada uma solução.
E já fizemos isso antes - para países do Terceiro Mundo e não para cidadãos americanos. A crise da dívida latino-americana dos anos 80 foi encerrada com os chamados acordos Brady, em que os credores ficaram encurralados, obrigados a reduzir o ônus da dívida daqueles países a níveis administráveis. Tanto os devedores, que escaparam da sombra do calote, e os credores, que receberam a maior parte do seu dinheiro, se beneficiaram.
Numa versão doméstica, a mecânica exigiria muito trabalho de advogados e especialistas financeiros. Na minha opinião, as agências federais comprariam as hipotecas - não os títulos forjados a partir delas, mas os empréstimos originais - com um grande desconto e depois renegociariam as condições. Mas estou atento a idéias melhores.
A questão, contudo, é que nada fazer a respeito não é a única alternativa para fazer com que as partes envolvidas nessa confusão saiam dela.
Não ao socorro financeiro.Mas vamos ajudar os tomadores de empréstimos a solucionarem o problema.