Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 18, 2007

Brinquedos assassinos


Empresa americana faz gigantesco recall de
bonecas que já feriram crianças e de carrinhos
que podem causar danos neurológicos


Denise Dweck


Fotos AP
A Mattel pretende recolher 21,8 milhões de brinquedos em todo o mundo – 850 000 deles no Brasil. Cinco tipos de boneco do Batman estão entre os produtos condenados

As bonecas Barbie e Polly e os bonecos de super-heróis, como o Batman, estão entre os brinquedos favoritos das crianças em todo o mundo, com vendas na casa das dezenas de milhões de peças. Na semana passada, muitos pais tomaram um susto ao descobrir que, ao brincar com esses personagens, seus filhos correm risco de vida. A advertência foi feita pela própria empresa que produz os bonecos, a americana Mattel, a maior fabricante de brinquedos do mundo. A firma anunciou um recall mundial de 21,8 milhões de seus produtos, 850.000 deles em mãos de crianças brasileiras. As bonecas Polly, oferecidas em dezenas de modelos, têm dois pequenos ímãs aplicados nos vestidos, que servem para grudá-los ao corpo. Esses ímãs às vezes se soltam e as crianças podem engoli-los. Em março do ano passado, um menino de 1 ano e 8 meses morreu nos Estados Unidos ao engolir dois ímãs, semelhantes aos da Polly, que equipavam o brinquedo de montar Magnetix. As peças se atraíram, torceram o intestino da criança e não se detectou o acidente a tempo. Em novembro, três crianças, também americanas, engoliram ímãs soltos de bonecas Polly e tiveram perfurações intestinais.

Após os acidentes de novembro, a Mattel fez um recall de 4,4 milhões de bonecas, 100.000 delas vendidas no Brasil, mas deixou de fora dezenas de produtos incluídos no recall da semana passada. Segundo a filial brasileira da empresa, nas bonecas do recall do ano passado o ímã se soltava com mais facilidade. Desta vez, por precaução, decidiu-se recolher todos os brinquedos com ímã aparente e passar a produzi-los com ímãs embutidos ou cobertos por resina. Polly, Barbie e Batman não são as únicas ameaças no quarto de brinquedos. O lote condenado da Mattel inclui também os carrinhos do personagem Sarge, do filme Carros. A tinta utilizada em sua pintura tem alto teor de chumbo. Essa substância, quando ingerida acidentalmente, pode provocar diarréia, vômitos e, a longo prazo, danos neurológicos irreversíveis. O mesmo problema já fora detectado neste ano em dois lotes de brinquedos nos Estados Unidos. No início de agosto, a empresa Fisher-Price, uma das unidades da Mattel, descobriu chumbo em excesso na pintura de bonecos da Vila Sésamo e da Nickelodeon e retirou do mercado 967.000 produtos. Em junho, a empresa RC2 teve de recolher 1,5 milhão de trenzinhos de madeira também pintados com tinta tóxica.

A Barbie acompanhada do cachorrinho Tanner é a única no Brasil que está na lista negra, por causa do ímã na ponta do bastão que ela segura

Em todos esses casos de recall, inclusive nos três envolvendo a Mattel, os produtos têm uma característica em comum – foram feitos na China. Os chineses fabricam uma miríade de produtos a preços mais baixos que os dos países do Ocidente. Por isso mesmo, grandes empresas usam sua mão-de-obra. Mas as linhas de produção chinesas têm alto índice de terceirização, o que às vezes compromete a qualidade dos produtos. A quantidade de empresas que fazem peças ou fornecem matéria-prima para um brinquedo, por exemplo, é tão grande que em certo ponto se perde o controle sobre o que é fabricado. Soma-se a isso o alto grau de corrupção dos órgãos responsáveis pela fiscalização das indústrias. "As leis que regulam a produção são frouxas e a fiscalização não funciona", diz o economista Peter Navarro, autor do livro The Coming China Wars (As Próximas Guerras Chinesas), sobre o potencial econômico da China. Recentemente, lotes de rações para animais domésticos, pastas de dente, xaropes e remédios fabricados na China, todos contendo substâncias falsificadas e venenosas, foram apreendidos na América Central e na Austrália, depois de fazer centenas de vítimas. Com a proximidade das Olimpíadas, que se realizam no ano que vem, o governo chinês iniciou uma campanha para melhorar a imagem de sua indústria. Fábricas envolvidas em escândalos foram fechadas ou tiveram suas licenças de exportação suspensas.

Seguindo as normas dessa campanha, assim que o recall da Mattel foi anunciado, o governo chinês ordenou o fechamento das fábricas envolvidas. Mas isso não garante que as mesmas tintas tóxicas e os mesmos ímãs que se soltam não apareçam em outros brinquedos. A enorme cadeia de fabriquetas anônimas chinesas fornece produtos a muitas empresas, às vezes até concorrentes. Alguns calçados da Nike, da Puma e da Adidas, por exemplo, saem das máquinas de uma mesma companhia de Taiwan com filial na China. No mesmo dia do recall dos bonecos com ímãs, foi anunciado nos Estados Unidos que alguns babadores infantis da loja Toys "R" Us, importados da China, tinham pinturas com um nível de chumbo três vezes maior que o permitido. Desde março, já foram registrados nos Estados Unidos oito recalls de brinquedos feitos na China. Entre eles, um forninho da marca Hasbro que causava queimaduras nas crianças. No Brasil, segundo o Inmetro, nos últimos cinco anos foi realizado apenas um recall de brinquedo com potencial de provocar acidentes. Em 2002, retirou-se das lojas um ovo de Páscoa cujo brinde tinha uma mola que machucava as crianças. No caso da Polly, da Barbie, do Batman e do carrinho Sarge, os riscos são bem maiores.

O ímã é um perigo

Os ímãs colados nos brinquedos, menores que um bico de chupeta, ficam aparentes e se soltam com facilidade. Três crianças nos Estados Unidos os engoliram. A boneca Polly (abaixo) terá 33 modelos recolhidos no Brasil

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