Serra, partidos, o futuro
O governador eleito de São Paulo, José Serra, fez um discurso emocionado já no início da madrugada a militantes do PSDB, que comemoravam a sua vitória no primeiro turno, um feito inédito em São Paulo desde que está em vigor a atua legislação, e a passagem de Alckmin para o segundo turno. E disse que a sua vitória era a vitória da pluralidade, da legalidade, da democracia. De natural contido, chegou a ficar com a voz embargada. É justo. Ninguém, como ele, desde que foi levado a disputar a Prefeitura em 2004, foi tão disciplinadamente partidário. Em duas eleições consecutivas, impediu que o PT operasse o que lhe parecia tranqüilo, quase burocrático. Marta tinha a certeza da reeleição para a Prefeitura. Havia um Serra no meio do caminho. Mercadante se antevia tomando posse nos Bandeirantes. De novo, surgiu Serra para impedir.
Quando abriu mão de sua candidatura à Presidência e decidiu disputar o governo de São Paulo, mais uma vez, ele o fez por senso de disciplina. Note-se que, nas pesquisas, sempre teve mais votos do que Alckmin tem agora, na reta final. Mas escolheu o caminho do entendimento interno. E, de novo, assegurou para o tucanato o principal Estado da Federação. A votação é consagradora. Se Aécio Neves, em Minas, é, proporcionalmente, o segundo governador mais votado do país — perde para Paulo Hartung —, Serra é o campeão de votos absolutos, numa disputa que evoluiu, como se viu, para o que classificou de “baixaria”. E que era e é bem mais do que isso.
Lula já se via reeleito no primeiro turno. Ainda hoje, claro, segundo as pesquisas, é o favorito — embora eu ache que isso tende a mudar. O que o PT tentou foi dar um golpe na vontade das urnas em São Paulo para aniquilar a oposição, que o tucano era candidato a liderar — e ainda é, a depender do resultado do segundo turno. Era ele o alvo do dossiê fajuto. Elegendo-se, e de forma tão convincente, depois de desmoralizada a falcatrua, ascende ao topo da galeria dos candidatos a disputar a Presidência da República em 2010. Convenha-se que a sua lista de serviços partidários já será bastante longa, vença Alckmin ou não.
Mas, claro, elegendo-se um presidente tucano, a questão da reeleição se coloca desde agora. Alckmin é pessoalmente a favor da possibilidade, mas já andou se dizendo contrário durante a campanha — para atrair, diz-se, o apoio efetivo de Aécio Neves, que também entrou na fila. Entre Serra e Aécio, nessas eleições, há uma diferença de quase 5 milhões de votos. Se alguém acha pouco, que olhe quanto faltou para Lula vencer a disputa no primeiro turno.
Na hipótese de Aclkmin se eleger, concordará mesmo com um único mandato? Dará sinais para que se apresse uma emenda, que o impeça de se recandidatar? Em princípio, não parece ser da natureza humana renunciar a mais poder. Mas isso tudo depende de muita conversa e de muita negociação. A ladainha sobre a hegemonia paulista na política já se ouve. Contra ela, há agora um pólo verdadeiramente virulento que vem lá do Ceará, com Ciro Gomes, que pretenderá ressurgir forte na cena política. E estará em busca de aliados, quem sabe dentro do próprio tucanato...
É por isso que um bom mestre da política, a esta altura, deveria estar empenhado em conversar com lideranças dos mais variados partidos, incluindo o PFL, onde está o bom articulador Kassab, para que se pense num rearranjo partidário. Meu candidato a fazê-lo é FHC. Vença quem vencer, chegou a hora de articular um novo eixo de forças no país, que comece a cuidar desde já de um projeto de desenvolvimento e de modernização do Estado. Se Lula ganhar, nada vai acontecer, a não ser a continuação dessa mediocridade. Se Alckmin vencer, pode-se dar um bom passo, mas não se imaginem grandes mudanças.
O governador mais votado do Brasil, ao lado de outras figuras importantes do PSDB e do PFL, tem de ser o eixo aglutinador de uma nova proposta de desenvolvimento para o país. Precisamos crescer: com Estado de menos, liberdade econômica a mais e, como Serra gosta de dizer, "planejamento".