Entrevista:O Estado inteligente

sábado, outubro 21, 2006

Os coronéis de Lula


Os petistas tomam o lugar dos velhos
caciques nordestinos do PFL e do PMDB


Otávio Cabral


Alexandre Belém/JC Imagem/AC
Eduardo Martins/Ag. A Tarde/AE
Eduardo Campos, em Pernambuco (tocando bumbo), e Jaques Wagner, na Bahia, são estrelas dos "novos tempos" da política nordestina

O PT e seus aliados de esquerda sempre amargaram um medíocre desempenho eleitoral no Nordeste. Em 2002, mesmo com Lula vencendo a eleição para presidente da República, o fiasco na região só não foi total graças à vitória de Wellington Dias para o governo do Piauí. Desde a proclamação da República, o poder na região é exercido pelos chamados coronéis – pessoas com dinheiro e influência que sempre conduziram o processo político de acordo com suas conveniências. Essa antiga máquina de produzir votos, que nas últimas três décadas esteve a serviço de partidos como PFL e PMDB, está mudando de cara. Dos cinco governadores nordestinos eleitos no primeiro turno, três são petistas: Jaques Wagner, da Bahia, Wellington Dias, do Piauí, e Marcelo Déda, de Sergipe. O governador eleito do Ceará, Cid Gomes, irmão do ex-ministro Ciro Gomes, é do PSB e tem um petista como vice. Em dois dos quatro estados onde haverá segundo turno, os candidatos apoiados pelo PT estão liderando as pesquisas: Eduardo Campos, em Pernambuco, e Wilma de Faria, no Rio Grande do Norte, ambos do PSB. Pela primeira vez na história, o PT e seus aliados tiveram mais votos no Nordeste do que os caciques tradicionais. Esses resultados poderiam ser comemorados como a correção de um vergonhoso defeito da democracia brasileira – o da compra de votos. Infelizmente, não é bem assim.

A ascensão dos petistas nordestinos ao poder, ao contrário do que se imagina, não representa o fim do caciquismo político ou do voto de cabresto. Saíram de cena os velhos coronéis de revólver na cintura para dar lugar a uma liderança na aparência mais moderna, mas nem por isso menos perniciosa. "A vitória dos aliados de Lula no Nordeste é a vitória do coronelismo da era digital. O cartão do Bolsa Família é a institucionalização da compra de votos", diz o deputado José Carlos Aleluia, do PFL baiano. O poder dos antigos coronéis era lastreado em uma relação de troca. Os eleitores lhes confiavam o voto e, em contrapartida, ganhavam algum benefício, numa relação que combinava favor e coerção. "O Bolsa Família e o Luz para Todos deram discurso aos aliados de Lula. Mostraram que o governo deles é melhor que o dos tucanos. Acabou o medo do PT no Nordeste. O medo agora é de ficar sem os benefícios do governo", afirma o deputado Geddel Vieira Lima, do PMDB baiano, ex-aliado dos tucanos e agora lulista de carteirinha. É desse medo que os velhos coronéis se nutriram durante décadas.

O cientista político Michel Zaidan, professor da Universidade Federal de Pernambuco, vê uma ligeira semelhança entre os métodos dos velhos coronéis e as táticas eleitorais dos petistas, mas, segundo ele, não se pode falar em simples substituição de papéis. "Há uma nova geração de políticos do Nordeste, que tem dado mostras de saber administrar bem, que vem substituindo a geração antiga. Essa geração tem uma mentalidade diferente, não é concentradora nem autoritária. Em colégios eleitorais grandes, principalmente nas capitais, esse perfil faz diferença", afirma. É uma visão bastante otimista. Em Pernambuco, o candidato Eduardo Campos, favorito absoluto nas pesquisas, é exemplo de quão tênue é essa separação entre o novo e o velho. Neto de Miguel Arraes, ele divide o palanque com o deputado Inocêncio Oliveira e o mensaleiro Severino Cavalcanti, entre outros expoentes do coronelismo.


Arquivo do blog