Entrevista:O Estado inteligente

sábado, outubro 07, 2006

O plano econômico de Alckmin para o Brasil

Como seria a economia
sob Alckmin

Ele já tem um plano para destravar
investimentos, fortalecer agências
reguladoras e cortar gastos públicos


Giuliano Guandalini e Julia Duailibi

Tom Dib/Futura Press
A TESOURA DE ALCKMIN
O ex-governador e Yoshiaki Nakano: assessor é um exímio cortador de gastos

Há pouca dúvida de que a maioria absoluta dos empresários torce pelo tucano Geraldo Alckmin na disputa presidencial. Ele coordenou em São Paulo o programa de privatizações e uma das mais ousadas reformas administrativas do país. Apesar disso, os próprios empresários não sabem ao certo quem seriam afinal seus mentores econômicos e quais as suas idéias sobre questões federais que não fazem parte do cotidiano de um governador – como câmbio, abertura comercial e juros. Volta e meia essas incertezas se convertem em preocupações, quando Alckmin critica os "juros altos" do Banco Central e a valorização "excessiva do câmbio". O ex-governador entrou na disputa presidencial sem convicções claras sobre esses temas e, justamente para formá-las, manteve nos últimos meses encontros com economistas de várias tendências. VEJA apurou o que foi falado em parte desses encontros e entrevistou assessores responsáveis pelo programa econômico do candidato. Disso tudo surge a imagem de um político muito mais pragmático e menos voluntarista em questões cambiais e monetárias do que seus discursos eleitorais iniciais podem sugerir. Seu projeto de crescimento econômico não contempla intervenções em juros ou câmbio e se concentra hoje em duas medidas. A primeira é um choque regulatório emergencial para enterrar as aberrações ideológicas do PT de modo a dar segurança de longo prazo e atrair investimentos privados. A segunda é colocar em prática um programa para zerar o déficit público em quatro anos.

O plano tucano prevê maior participação da iniciativa privada na exploração de petróleo e gás, assim como na geração térmica. Com relação ao agronegócio, a idéia é liberar em definitivo o plantio de transgênicos e fortalecer o foco da agricultura em escala industrial. Esses são alguns dos planos de Alckmin para atrair investidores. Para sua equipe, causa surpresa que, apesar de sobrar dinheiro no mundo, os investimentos privados no Brasil não decolem com o ímpeto esperado. Parte da resposta está na desmoralização das agências e na diminuição de seu papel sob o governo Lula. Criadas nos anos 90 para ser órgãos de Estado com vida própria em qualquer que fosse o governo, as agências foram solapadas sob o lulismo. O papel delas é dar um horizonte de tempo mais amplo às regras do jogo em setores que requerem investimento pesado e retorno de longo prazo – caso do petróleo, da energia elétrica e dos transportes. Dessa forma, o risco de investir se torna menor e o negócio, mais atraente.

Além da incerteza jurídica e regulatória, a equipe de Alckmin aponta o desequilíbrio nas contas públicas federais como uma trava ao investimento. O governo funciona no vermelho, drena o crédito disponível, encarece o custo do dinheiro e eleva os juros, minando assim o potencial de crescimento do país. A meta seria zerar o déficit público, mas existe o entendimento de que botar as contas em dia não será fácil. Por essa razão o pacote regulatório seria anunciado antes mesmo da posse, para "colocar a roda de investimentos para girar até que a parte fiscal seja consertada", como resume um integrante da equipe. Com a melhora da gestão, os tucanos acreditam ser possível cortar gastos de até 3% do PIB (cerca de 60 bilhões de reais ao ano) ao longo do mandato, sem uma única reforma constitucional. Outra vertente importante no projeto é a política de comércio exterior. Os acordos comerciais seriam pautados pelo pragmatismo, de olho no retorno econômico, deixando de lado a politização ideológica de hoje.

Marcio Fernandes/AE
CHOQUE REGULATÓRIO
Mendonça de Barros: resgate da confiança do investidor enquanto o ajuste fiscal não chega


Essas são as idéias que guiam o plano econômico tucano. O programa teve a colaboração de diversos economistas, mas os seus dois principais formuladores foram Yoshiaki Nakano e José Roberto Mendonça de Barros. São eles que provavelmente estarão à frente da equipe econômica num eventual governo tucano. Nakano, professor da Fundação Getulio Vargas, foi secretário da Fazenda paulista no governo Covas e coordenou todo o processo de ajuste das contas estaduais. É um dos mais eficientes cortadores de despesas do setor público. Diz-se dele que prefere identificar e cortar gastos excessivos a discuti-los, como fazem vários economistas de renome. Apesar desse histórico, o nome de Nakano não é unanimidade entre os economistas. Ele é autor de inúmeros artigos com idéias heterodoxas, escritos em parceria com o também tucano Luiz Carlos Bresser-Pereira. Diz Paulo Leme, diretor do banco americano Goldman Sachs: "Não me preocupo com Nakano. Quem assume o comando da economia percebe logo a real dimensão dos desafios e evita os danos causados por idéias aventureiras". José Roberto Mendonça de Barros foi secretário de Política Econômica no governo FHC, mas desentendeu-se com o ministro Pedro Malan e deixou o cargo, em 1998, por discordar da política de real valorizado. É craque em econometria – portanto, sabe fazer contas –, além de ser especialista em infra-estrutura e agronegócio.

Alckmin já tem um projeto econômico quase fechado. Seu problema parece ser o fogo amigo. Com as contas em dia e de olho no Planalto, ele previu a ampliação dos investimentos públicos em 2006. São várias as obras em andamento, como a nova linha do metrô, a calha do Tietê e o novo trecho do Rodoanel. O fechamento equilibrado das finanças dependia da venda de 20% das ações da Nossa Caixa, prevista desde o ano passado. Cláudio Lembo, que era vice de Alckmin e assumiu o governo, decidiu adiar a operação, pressionado pelo também tucano José Serra, governador eleito. Serra não esconde de ninguém que é contra a venda de patrimônio estatal para fechar buracos orçamentários. Sua interferência para impedir o prosseguimento da venda das ações vai produzir uma rachadura na imagem de gestor eficiente de Geraldo Alckmin. O leilão das ações ficou para 2007. Se Serra decidir, então, reativar o leilão das ações da Nossa Caixa, Geraldo Alckmin terá o direito de concluir que foi vítima de fogo amigo às vésperas do duro duelo com Lula pelo segundo turno das eleições presidenciais.

UM GUIA PARA O DEBATE PRESIDENCIAL

Candidatos à reeleição tendem a enaltecer conquistas administrativas que nem sempre passam pelo crivo da realidade. Já os desafiantes costumam subestimar os feitos administrativos de seus adversários. Abaixo estão alguns dos tópicos que deverão ser abordados pelo candidato Lula ao comentar a administração do presidente Lula. Veja quais fatos são verdadeiros ou não

1 - MISÉRIA
"8,4 milhões de pessoas saíram da miséria entre 2003 e 2005"

MENTIRA
Os dados oficiais mostram que cerca de 5 milhões de pessoas saíram da linha de pobreza devido ao crescimento do emprego formal e ao controle da inflação. Elas passaram a ganhar mais de 2 dólares por dia. O PT divulga um número bem maior, de 8,4 milhões de pessoas, porque adiciona os beneficiários do Bolsa Família. É um truque político dizer que, pelo fato de receberem uma assistência dessas, milhões de pessoas ultrapassaram a linha de pobreza. É justamente o contrário. O Bolsa Família é um atestado de pobreza

2 - ENERGIA
"O governo levou energia elétrica a 3,7 milhões de pessoas em todo o país. A Petrobras alcançou a auto-suficiência"

E OS PROBLEMAS?
A destruição das agências reguladoras e o discurso estatizante secaram os investimentos em geração de energia. No governo Lula não foi iniciado nenhum projeto de geração, e especialistas já temem um novo apagão. A Petrobras bateu recorde de produção, mas o país só atingiu a auto-suficiência porque a economia cresceu pouco

3 - MACROECONOMIA
"O Brasil nunca viveu um momento com uma combinação de fatores positivos como o atual"

VERDADE
Pela primeira vez em sua história econômica recente a economia brasileira tem, ao mesmo tempo, superávit comercial, crescimento do consumo interno e inflação em queda

4 - JUROS
"A taxa de juros do governo Lula é menor que a de FHC"

MEIA VERDADE
A Selic (taxa básica) realmente recuou no governo Lula, mas a taxa real (aquela que, por descontar a inflação, é a que pesa no bolso do tomador de empréstimos) chegou a ser menor no segundo mandato de FHC do que durante o governo Lula

5 - IMPOSTOS
"Não houve aumento de impostos"

MENTIRA
O Estado brasileiro nunca arrecadou tantos impostos. No ano passado, o contribuinte pagou 364 bilhões de reais só em tributos federais. Além disso, com Lula as importações começaram a pagar PIS e Cofins – antes eram isentas desses tributos. Na prática, o governo reduziu impostos no varejo e aumentou a arrecadação no atacado

6 - INFLAÇÃO
"Em 2002, a inflação ficou em 12,5%, e neste ano fechará bem abaixo da meta de 4,5%"

VERDADE
Lula chegará ao fim do mandato com o governo de menor inflação da história do país, o que elevou o poder de compra dos mais pobres. Isso só foi possível por causa da autonomia operacional do Banco Central – algo que o Partido dos Trabalhadores vê com péssimos olhos e nem o presidente engole muito

7 - EMPREGO
"O governo criou 7,5 milhões de empregos. Desses, 5,5 milhões foram empregos formais"

MEIA VERDADE
Os empregos realmente cresceram no governo Lula. Mas o governo mistura dados de fontes diferentes e cria confusão. Usa, primeiro, números da Pnad para chegar a 3,8 milhões de empregos em 2003 e 2004. Para 2005, utiliza os números do Caged. Depois, faz uma estimativa inflada para 2006

8 - REFORMA AGRÁRIA
"260 000 famílias foram assentadas. O orçamento para reforma agrária recebeu um aumento de 255%"

EM TERMOS
O governo assentou oficialmente 260 000 famílias, mas os números são superestimados, pois contabilizam projetos antigos e famílias que já ocupavam a terra havia anos. Além disso, a dinheirama é desviada para o MST e entidades afins

9 - AGRICULTURA FAMILIAR
"No último ano de FHC o Pronaf recebeu 2,4 bilhões de reais, enquanto no seu governo foram investidos 7,5 bilhões de reais na última safra"

SIM, MAS CADÊ O DINHEIRO?
Para obter as verbas do Pronaf, o trabalhador rural tem de seguir algumas regras, entre as quais ser sindicalizado. Leia-se: ligado à companheirada da CUT. Sob o pretexto de realizar o Pronaf, o governo também aparelha ideologicamente a Embrapa

10- SALÁRIO MÍNIMO
"Teve o maior aumento real dos últimos doze anos"

VERDADE PREOCUPANTE
Nos quatro anos de governo Lula, o aumento do salário mínimo correspondeu a 1,5 vez a inflação acumulada, um recorde no período. Só que as despesas do INSS explodiram porque os vencimentos previdenciários estão ligados ao mínimo. Sem aumentar o mínimo acima da inflação, o rombo do INSS teria ficado em 12 bilhões de reais no ano passado, em vez de 38 bilhões de reais

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