Esta campanha eleitoral terminou com um fato paradoxal.
A política econômica, cujos resultados vêm sendo apontados como um dos principais cabos eleitorais do presidente Lula, ficou de fora dos debates. Discutiram-se combate à corrupção, segurança pública, educação, impostos, excesso de burocracia e até gestão pública. Mas a política econômica propriamente dita compareceu apenas marginalmente nos debates. Até mesmo temas relacionados com a política econômica, como carga tributária, emprego e política energética, foram tratados superficialmente, na base do achismo, como se não fossem componente importante no desenho do futuro do brasileiro.
Trata-se de um paradoxo porque, ao longo desses quatro anos de administração Lula, a política econômica foi duramente questionada em grande número de fóruns. Qualquer que fosse a composição do Ministério Lula, pelo menos metade dos ministros sempre se pronunciou contra ela. Zé Dirceu, Berzoini, Ciro Gomes, Dilma Rousseff, Tarso Genro, Luiz Marinho, Luiz Furlan, Guido Mantega (antes de ir para a Fazenda) e tantos outros, sempre que puderam, tascaram suas críticas ao modelo adotado, à política de metas de inflação, à política cambial ou à política fiscal.
O vice-presidente da República, José Alencar, não parou de desancar o Banco Central e a equipe econômica que ele sempre considerou ortodoxa demais. O PT, principal partido da base do governo, não deu tréguas a essa política e exigiu mudanças radicais em documentos oficiais editados pela Executiva Nacional. A maior parte das lideranças empresariais não fez outra coisa. E um grupo de economistas está todos os dias fazendo os mesmos questionamentos.
Enfim, nenhum setor do governo foi mais duramente cobrado ao longo dos últimos quatro anos do que a política econômica. Portanto, certa ou errada, seria de se esperar que, ao longo da campanha eleitoral, fosse objeto de acirrada discussão. Mas isso não aconteceu. A única metralhadora giratória que despejou críticas veementes (quase nunca consistentes) partiram da candidata do PSOL, Heloísa Helena. Mas também ela não foi capaz de chamar o debate que, aparentemente, ninguém se dispôs a sustentar.
Três razões ajudam a explicar o paradoxo. A primeira é a de que o principal foco da política econômica é o desequilíbrio das contas públicas, especialmente da Previdência Social, cuja correção exige enormes sacrifícios. Do povo, os candidatos querem voto e conformismo. E a hora do voto não é boa para falar de sacrifício.
A segunda razão é a de que não há, a rigor, o que mudar nos pilares da política econômica. Mesmo aqueles que pedem, vagamente, mudanças no câmbio não apontam para o que deve ser feito. Simplesmente, querem a desvalorização do real, sem dizer se, para isso, o Banco Central deve continuar a comprar dólares, se é preciso incentivar as importações ou se bastaria derrubar os juros. Por falar em derrubada dos juros, como fazê-lo: a canetadas? Apressando a flexibilização monetária? Mantendo o atual ritmo do Banco Central?
Finalmente, se é verdade que a política econômica é um sucesso eleitoral a ponto de assegurar a fantástica vantagem do presidente Lula nas pesquisas, por que mudar e correr o risco da repulsa eleitoral mais adiante? O povão não está adorando o aumento do poder de compra proporcionado por essa inflação na lona? Ou não seria o povão apenas um detalhe?
celso.ming@grupoestado.com.br