Panorama Econômico |
O Globo |
21/5/2008 |
Nossa inimiga está à espreita. Sempre esteve. Nunca haverá vitória completa sobre a inflação, apesar de terem se passado 14 anos desde os primeiros passos do Real. O IGP-M deste mês pode chegar a 1,80%; um número assustador. O acumulado em 12 meses vai para 12%, e vai ser assim até agosto, segundo previsão do professor Luiz Roberto Cunha. Exigente, a inflação cobra o custo de cada contradição da política econômica, não aceita ungüentos curativos e soma cada anomalia. Isso aprendemos com a geração dos economistas que nos ajudaram a vencer a hiperinflação. Esta semana, por iniciativa da vereadora Andrea Gouvêa Vieira, o núcleo do Plano Real foi homenageado. Os índices estão subindo para lembrar que morta ela nunca está. O professor Luiz Roberto Cunha avisa que não se deve comparar cada decêndio do mês anterior. Acha que é preciso ver a evolução ao longo do mês em toda a família dos IGPs. Se for comparado o número de ontem do IGP-M com o mesmo período do mês anterior, a inflação quadruplicou. Se a comparação for feita quando o número estiver completo, será possível constatar que ela "apenas" dobrou. O IGP-M de abril ficou em 0,89%. E fechará este mês em 1,80%. - Não há dúvida de que é inflação pra burro! - admite Luiz Roberto Cunha. Uma atenuante é que os analistas estão mais calmos com os preços dos alimentos. Acham que, no segundo semestre, eles podem subir menos do que se temia. - Claro, sempre haverá o efeito da entressafra, mas há estimativas de que os preços não continuarão disparando. As previsões internacionais estão melhores, mas não se pode dizer que o pior passou - comenta o professor. A inflação não é só comida. Preços industriais estão subindo também, pelos reajustes de minério de ferro, produtos siderúrgicos, petroquímica e diesel. No IGP-M, a alta do diesel vai entrar parcialmente e só estará completamente contabilizada no IGP-DI, que mede a inflação do dia 1º ao dia 30. - A preocupação era que o índice pudesse chegar a 2%, mas o IGP-DI, que vai pegar todo o impacto do aumento do diesel, já estará captando também a redução da pressão em alguns preços agrícolas. Ele pode até ficar abaixo do IGP-M. Outra atenuante é que os índices da Fundação Getulio Vargas, os IGPs, já foram mais impactantes quando indexavam tarifas. - Hoje, eles já não indexam energia nem telefonia. Essas tarifas estão seguindo um misto de cálculos próprios de aumentos de custos e o IPCA. Mas os IGPs são ainda importantes indexadores de contratos industriais, contratos de serviço, de limpeza. O que preocupa neles é que parte desses aumentos de preços no atacado vai para o varejo, principalmente numa economia aquecida - explica Cunha. Os índices da FGV que têm em sua composição os preços de atacado e varejo devem fechar o ano em torno de 9% se repetirem a média dos índices mensais do segundo semestre de 2006. No ano passado, a inflação acelerou muito, e o professor acha que tecnicamente não se deve fazer a conta como se aquele cenário fosse se repetir. Os IPCs, entre eles o IPCA, índice que é olhado para o cumprimento da meta de inflação, devem ficar em torno de 5,5%, na avaliação do especialista. Acima, portanto, do centro da meta. O que está pressionando a inflação? Muita coisa além do "feijãozinho". Matérias-primas subiram muito e elevaram os custos industriais. É o efeito indireto de notícia boa, como o reajuste do minério de ferro, que chegou a 70%, aumentando as exportações brasileiras; e de notícia ruim, como a disparada do petróleo no mercado internacional. Os preços dos alimentos subiram muito, e a única boa nova é que eles podem deixar de disparar no segundo semestre. Esses choques de oferta estão provocando elevação da inflação no mundo inteiro. O Brasil tem que estar mais atento que inúmeros outros países porque aqui a inflação ficou descontrolada por tempo demais, chegando aos extremos que vimos no começo dos anos 90. Num contexto de choque de oferta, a elevação de gastos públicos é o pior ingrediente. O governo Lula, animado com a arrecadação e com o grau de investimento, tem aumentado gastos com concessões como a da política industrial. Os empresários estão investindo muito, e isso é ótimo por vários motivos, mas, neste momento, ajuda a pressionar os preços. A Fazenda confia que esses investimentos aumentarão a oferta e reduzirão os preços mais adiante; o Banco Central está de olho apenas na demanda agregada. Os poucos sinais de desaceleração do consumo não são ainda uma tendência. Coisa que já aprendemos a duras penas é que combate à inflação tem que ser amplo, mobilizar todo o governo, unir a política econômica numa mesma direção. A Fazenda acredita em redução de impostos como forma de impedir a alta dos preços, como aconteceu com a gasolina. Essa não é uma boa política antiinflacionária e ajuda a acumular distorções. O Banco Central tem trabalhado sozinho. Política monetária como única arma de combate à inflação custa muito caro para a sociedade. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, maio 21, 2008
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