Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 31, 2008

O calvário dos pandas

O calvário dos pandas

Terremoto na China destruiu alguns dos maiores centros de
preservação desses ursinhos simpáticos em risco de extinção


Roberta de Abreu Lima

AP

O resgate de um dos pandas que escaparam das jaulas destruídas pelo abalo sísmico: o animal não ataca o homem, mas tem temperamento irascível


Boa parte do esforço internacional para salvar da extinção os ursos pandas quase se perdeu no início de maio. O terremoto que devastou a província de Sichuan, no sudoeste da China, também foi sentido com força nas reservas florestais onde vivem 720 pandas – praticamente a metade de toda a população mundial desses ursos gigantes e graciosos. O epicentro do abalo ocorreu a apenas 30 quilômetros do Centro de Estudos e Conservação do Panda Gigante de Wolong. Mantida pela World Wild Foundation (WWF) e pelo governo chinês, a instituição é o maior centro de reprodução da espécie. A infra-estrutura de Wolong foi destruída, dois pandas ficaram feridos e seis fugiram – um deles continuava desaparecido na semana passada. Ainda não se sabe a extensão dos danos nas outras florestas da região. "O tremor provocou impactos severos em pelo menos vinte reservas, o que é bastante preocupante", disse a VEJA o alemão Stefan Ziegler, gerente do programa de conservação de espécies da WWF.

Desde o terremoto, o governo chinês transferiu catorze pandas do centro de pesquisas de Wolong devido à destruição das jaulas e à falta de alimento. Seis foram enviados de caminhão a uma base menos afetada pelo tremor, na província de Ya’an. Os outros oito foram de avião para Pequim, onde ficarão até a Olimpíada. Com o apoio financeiro de instituições e zoológicos de vários países, o governo da China está enviando carregamentos de bambu às reservas afetadas pelo terremoto. Especialistas acreditam que a maior parte dos animais conseguiu escapar do tremor, mas eles podem ter dificuldade para encontrar comida. De qualquer modo, ainda que os estragos do abalo sejam remediados, a situação dos pandas na China continuará alarmante. A cadeia de montanhas onde vivem esses animais fica próxima a uma das principais bacias hidrográficas do país, uma região habitada por 500 milhões de pessoas. Essas florestas vêm sendo continuamente devastadas para dar lugar à agricultura e à construção de estradas e de usinas hidrelétricas. "O crescimento da economia chinesa ameaça muito mais a sobrevivência dessa espécie do que um terremoto", disse a VEJA o cientista Donald Lindburg, que dirigiu o setor de pandas do Zoológico de San Diego por dez anos e esteve doze vezes em Wolong.


Teh Eng Koon/AFP
Pandas no Zoológico de Pequim: transferidos da reserva de Wolong, destruída pelo tremor

Toda a população de pandas selvagens remanescente soma apenas 1.600 animais. A redução de seu habitat não é o único obstáculo enfrentado por eles. O urso gigante é um animal solitário e com pouca disposição para o acasalamento. O período fértil da fêmea ocorre apenas uma vez por ano e dura de um a três dias. A gravidez resulta em, no máximo, dois filhotes. O animalzinho recém-nascido mede 10 centímetros e pesa somente 100 gramas, o que torna sua sobrevivência uma loteria. A taxa de mortalidade nas primeiras semanas é de 40%. A mãe raramente consegue cuidar de mais de um filhote até os 18 meses, quando ele já consegue se alimentar sozinho.

Para complicar, esse urso tem o sistema digestivo de um carnívoro, mas adaptou-se a uma dieta vegetariana, basicamente composta de bambu. Como conseqüência de sua ineficiência em digerir a planta, ele precisa consumir grandes quantidades de comida – de 12 a 38 quilos de bambu por dia. Como os bambuzais morrem periodicamente e podem levar vinte anos para se regenerar, os pandas precisam migrar para áreas onde ainda há abundância do vegetal. Com o desmatamento das florestas que eles habitam, encontrar alimento torna-se cada vez mais difícil. A alimentação é um dos fatores mais relevantes no custo de um panda em cativeiro. Para criá-lo fora da China, porém, a maior despesa é a taxa que deve ser paga ao governo desse país em nome da conservação. "Os zoológicos americanos pagam anualmente ao governo chinês 1,1 milhão de dólares por cada casal de ursos", disse a VEJA Rebecca Snyder, diretora do Zoológico de Atlanta, nos Estados Unidos, que mantém três pandas. Uma despesa que vale a pena pela ajuda que dá à preservação dessa espécie cativante.

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