Entrevista:O Estado inteligente

domingo, maio 25, 2008

Celso Ming Cinco anos na Casa Rosada

O casal Kirchner completa hoje meia década de controle do poder na Argentina. No entanto, apenas cinco meses depois de empossada na Presidência do país, Cristina Kirchner vai amargando rápida deterioração dos níveis de aprovação popular a seu governo. Assumiu com 45% dos votos e agora não tem mais de 26% de aprovação.

Por trás desses sinais de fragilidade política estão dois fatos econômicos desestabilizadores: a cavalgada da inflação que, nos cálculos do economista Dante Sica, da consultoria Abeceb, está ao redor dos 19% no período de 12 meses terminados em abril e a forte carga tributária que está sendo descarregada sobre os produtores agrícolas.

Os números oficiais continuam apontando avanço dos preços ao redor dos 9% ao ano. São obtidos a fórceps para produzir efeito psicológico de uma inflação abaixo dos dois dígitos. Os preços só não foram além porque estão sendo sustentados pelo congelamento e por exibições de truculência por parte do secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, que, entre outros feitos, mantém um revólver carregado sobre a mesa de seu gabinete para forçar acordos com os empresários. Mas truques do gênero não têm bastado para derrubar a inflação. As estatísticas continuam sendo notoriamente maquiadas.

Essa manipulação não gera apenas deformações estatísticas. Produz distorções nos preços, na renda e nos investimentos. Ao impingir goela abaixo uma inflação substancialmente mais baixa, o próprio consumidor tende a exagerar suas percepções. Para ele, a inflação alcança hoje algo entre 30% e 35% ao ano.

De todo modo, graças às manipulações, o governo argentino empurra reajustes insatisfatórios nos salários, nas aposentadorias e nos preços administrados. Cerca de metade dos bônus que lastreiam a dívida argentina paga remuneração baixa demais porque são reajustáveis pelo índice oficial de inflação.

Além de desequilibrar os preços relativos, essas práticas desestimulam os investimentos na medida em que impedem o setor produtivo de trabalhar com reajustes adequados de preços ao nível da inflação. A falta de investimentos, por sua vez, tende a atirar a economia à estagnação.

Por enquanto, a trajetória do Produto Interno Bruto (PIB) argentino não ficou substancialmente deformada porque o principal deflator utilizado nos cálculos tem forte peso do índice de preços no atacado não alcançado pela maquiagem, pondera Sica.

Os conflitos com os produtores rurais se agravaram depois que o Ministério da Economia aumentou o confisco (retenciones) nas exportações. Mas parece improvável que daí saia mudança que seja capaz de dar maior racionalidade à política econômica.

O inverno está chegando e pode esquentar ainda mais o jogo político. Como já aconteceu no ano passado, pode faltar gás e energia elétrica para calefação e isso pode custar caro aos Kirchners.

Há alguns meses ainda se encontravam comentaristas brasileiros que morriam de inveja ante a exibição de saúde produtiva da Argentina, e pregavam a adoção da mesma política pelo governo brasileiro. Hoje, já não se vê sequer um deles defendendo anomalias assim.

Confira

Efeito da manipulação -
O gráfico dá uma idéia do que aconteceu com o índice de inflação da Argentina depois que o governo começou a maquiar as estatísticas. As estimativas são do economista Dante Sica, da consultoria Abeceb.

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