Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 11, 2007

RUY CASTRO

O cerco e o circo
RIO DE JANEIRO - Num dos maiores filmes de Billy Wilder, "A Montanha dos Sete Abutres", de 1951, Kirk Douglas interpreta um repórter no desvio que descobre uma história capaz de fazê-lo voltar à grande imprensa.
Um homem é vítima de soterramento em uma mina no Novo México. Está vivo, mas precisa ser retirado depressa. Douglas começa a mandar matéria para seu ex-editor em Nova York e faz do caso um assunto nacional. Os outros jornais correm atrás, os cinejornais, rádios e TVs aderem e, de repente, arma-se em torno do soterrado um mafuá com roda gigante, turistas, camelôs, vendedores de souvenirs e bancas de cachorro-quente.
Douglas, que tem acesso exclusivo ao homem por um buraco na mina, quer mantê-lo soterrado -e vivo- pelo maior tempo possível. Mas calcula mal o timing e o homem morre: o circo vai embora. Jornalistas, ambulantes, turistas e oportunistas, some todo mundo.
Algo do gênero aconteceu no caso da inglesa Madeleine, de 4 anos, desaparecida num balneário de Portugal em maio último. Os repórteres, fotógrafos e câmeras britânicos chegaram logo no segundo dia, às centenas, e acamparam em frente à casa dos pais da menina, num cerco full-time. Por acaso, eu estava em Lisboa e acompanhei.
Foi um massacre. As TVs inglesas davam a história dia e noite. Até o papa entrou na roda. Uma repórter parecia a porta-voz oficial do casal, que, aliás, só falava com a imprensa britânica. Mas não havia notícias. O circo durou duas semanas, até Londres decidir que o caso esfriara e chamar seu pessoal de volta. Em minutos, a mídia inglesa evaporou-se da cena e ficou apenas a esnobada imprensa portuguesa.
Agora, graças a esta, surgiu uma notícia: Madeleine estaria morta desde o início. Voltam os ingleses e recomeçam o cerco e o circo.

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