O professor de política da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, e diretor do programa de estudos de liderança da Woodrow Wilson School, Fred I. Greenstein, escreveu um estudo intitulado “As qualidades dos presidentes eficientes” onde analisa a atuação de 11 presidentes americanos, de Franklin Roosevelt a Bill Clinton. Ele definiu seis características que determinariam se um presidente é ou não eficaz em seu cargo: comunicação com o público; capacidade organizacional; habilidade política; visão programática, estilo cognitivo e inteligência emocional. Segundo ele, a natureza altamente personalizada do que é chamada de “moderna presidência” americana — que teria tido início no governo de Franklin D. Roosevelt, a partir de 1933 — faz com que os pontos fracos e fortes do eleito ganhem relevância especial.
Aqui no Brasil também o papel do presidente da República é crucial e, juntamente com o cientista político Octavio Amorim Neto, da Fundação Getulio Vargas do Rio, vou analisar hoje e amanhã os atributos do presidente Lula para ser um “presidente eficaz”, de acordo com as características identificadas pelo estudioso americano.
A primeira delas, a comuni cação com o público, é de longe a grande capacitação de Lula. Octavio Amorim Neto conta esse como “um dos pontos fortes de Lula”, cotandoo como “excelente” no quesito. O professor Fred Greenstein diz que, nesse ponto, existem poucos presidentes americanos que conseguiram se aproveitar da exposição tão especial que o “púlpito presidencial” dos Estados Unidos oferece. Ele cita Roosevelt, Kennedy e Reagan como as “brilhantes exceções”, e coloca Clinton na lista, mas somente quando ele estava “no seu melhor”.
Quanto à capacidade organizacional, Lula “é um desastre”, classifica Octavio Amorim Neto: “Ele delega muito, e até aí tudo bem, o Reagan delegou muito. Mas você tem que acompanhar e, sobretudo, cobrar. O estilo dele de organizar a agenda não favorece a boa organização. Ele passa o tempo todo viajando, fora de Brasília, em campanha permanente”.
O que poderia ser identificado como um “estilo sindicalista” de governar leva a constantes embates das diversas facções dentro do governo, o que dificulta a unidade da equipe presidencial e retarda as decisões. Na definição de Greenstein, a capacidade de um presidente como organizador “inclui sua habilidade de formar um time e tirar o máximo possível do grupo, minimizando a tendência dos subordinados de dizerem ao chefe o que eles acham que o chefe quer ouvir”.
Pelos relatos, Lula prefere os assessores que concordam com ele. Talvez sua presença carismática impeça uma relação mais honesta com os assessores, da mesma forma que acontecia com Lyndon Johnson, texano de personalidade forte que tinha um efeito paralisante em seus assessores.
O professor Fred Greenstein conta que o membro do Conselho de Segurança Nacional Chester Cooper tinha fantasias recorrentes de encarar o presidente durante discussões sobre a Guerra do Vietnã e dizer “Eu definitivamente não concordo”, mas quando chegava a hora e Johnson lhe perguntava: “O senhor concorda?”, ele se via respondendo: “Concordo, senhor presidente”.
Embora seja conhecido como um comandante que não gosta de ouvir críticas, o que prejudica sua capacidade de decidir, o presidente Lula tem curiosamente uma maneira de tomar decisões semelhante à de Eisenhower, que o professor americano considera o presidente da era moderna com a maior experiência de organização de governo.
Segundo Eisenhower, o único meio de estar seguro de ter tomado uma decisão correta “é colocar todos os responsáveis com diferentes pontos de vista em frente a você e deixálos debater. Você tem que ter homens corajosos com fortes pontos de vista e deixá-los debater entre si”.
É sabido que o presidente Lula prefere, para tomar uma decisão, ouvir as exposições de seus ministros a ler extensos relatórios.
Quanto à habilidade política, a capacidade de sedução de Lula é reconhecida por todos, e ele foi capaz de fazer alianças políticas que ampliaram sua penetração no eleitorado para vencer em 2002.
O professor Octavio Amorim Neto comenta que Lula, embora seja “um político nato”, tem um problema de falta de disciplina: “Ele exerce a habilidade quando quer, se desinteressa das questões e aí não decide, delega demais, não acompanha. Ele tem boa habilidade política, mas, como é desorganizado e indisciplinado, não aplica isso sempre”, analisa o professor.
Eu lembro que, nos acordos políticos, sempre delegou muito, especialmente ao ex-ministro José Dirceu, porque não tem paciência para essas conversas políticas.
Foi um bom negociador sindical, mas não gosta de política parlamentar.
O professor Amorim Neto admite que, “com uma coalizão tão ampla como se tem hoje, com dez, 11 partidos, tendo que conciliar esse saco de gatos, se você tiver uma visão muito clara até atrapalha”.
Ele cita um estudo da consultoria Archo-Advice mostrando que, nominalmente, Lula tem o apoio de mais de 70% do Congresso, mas, em 27 votações de interesse do governo, o apoio médio do Executivo é de 52%.
“Esse é um governo que no primeiro mandato foi minoritário e no atual é quase minoritário. Faz um esforço muito grande para ficar um pouco acima da linha d’água. Existe um problema de Lula com o Congresso, e volta a questão sobre se ele é um político com habilidades”.
No estudo do professor americano Fred Greenstein, um exemplo da necessidade de os presidentes serem operadores políticos habilidosos é a capacidade que o presidente Jimmy Carter teve para chegar à Casa Branca, mas, quando chegou lá, mostrou-se inapto. (C o nt i nua amanhã)
Entrevista:O Estado inteligente
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