Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 08, 2007

Merval Pereira - Cabo eleitoral



O Globo
8/8/2007

A pergunta que não quer calar e domina a conversa de 11 a cada dez políticos logo após a divulgação da pesquisa de opinião do DataFolha que reafirmou a alta popularidade de Lula é se ele terá condições de transferir esse apoio popular na eleição de 2010, partindo-se do pressuposto de que continuará popular e que servirá de cimento para a manutenção dessa improvável união política que é sua base parlamentar, manobrando o sucesso de uma política econômica que pode estar entrando em um círculo virtuoso de crescimento, se não for atropelada por uma crise da economia internacional. Na última reunião do Conselho Político, Lula disse que, se se mantiverem unidos, vencerão a eleição presidencial. Em outras ocasiões, tem desdenhado do favoritismo que se atribui aos candidatos do PSDB, os governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas, Aécio Neves.

O presidente Lula não tem perdido oportunidade para estimular a unidade de sua base política, e tem prometido se empenhar para eleger um representante dela, sem dar prioridade ao PT, o que faz com que todos se sintam em condições de ser o escolhido. Disse que será "um palanqueiro" durante a campanha presidencial, e é considerado o melhor cabo eleitoral.

Mas recentemente, em improviso público, deixou escapar que não tem vontade de parar de fazer política, o que pode indicar que pretende ficar na ativa para voltar a disputar a Presidência em 2014, como garantiu José Dirceu em recente entrevista à "Playboy", ou também que pode aceitar disputar um terceiro mandato se a Constituição for mudada.

Ele não tem herdeiro político, mas também não tem adversário populista que possa se defrontar com ele nos palanques pela oposição. Em 1989, enfrentou dois candidatos fortes nesse quesito, Fernando Collor pela direita e Leonel Brizola pela esquerda, e perdeu. Nas duas eleições seguintes, perdeu para um símbolo maior que ele, o Plano Real.

A tese de constituinte exclusiva para a reforma política, que está sendo abraçada pela OAB e pelo PT, parece ser uma saída para a efetivação de uma reforma que, de outra forma, jamais sairá de um Congresso em que o consenso é impossível para atender a todos os interesses instalados.

Mas há quem suspeite que, no bojo dessa constituinte, a base aliada do governo tentará aprovar não apenas a possibilidade de um terceiro mandato, mas também o reforço do poder do Executivo, como aconteceu na Venezuela de Chávez e na Bolívia de Evo Morales.

O advogado e cientista político Nelson Paes Leme, que defende a tese, acha que "a questão que se coloca não é de governos, mas da estrutura do Estado brasileiro que precisa de reformas urgentíssimas". Para ele, não há saída, pois "o poder de reformar a Constituição pelo próprio Congresso (o chamado poder constituinte derivado) não pode mexer em cláusulas pétreas".

Para evitar eventuais golpes parlamentares na constituinte, Paes Leme propõe "espécie de Pacto de La Moncloa político que preceda a essa convocação". Algumas medidas como o "recall, as restrições a essa indecorosa imunidade parlamentar, mecanismos indispensáveis de aproximação, da fiscalização e da punibilidade do eleito pelo eleitor, por exemplo, só passariam numa Constituinte exclusiva e originária".

Como parece impossível um acordo político amplo em torno do assunto, resta saber se Lula terá força para transferir sua popularidade para um sucessor, ou condições de manter coesa sua base. Sem ele na disputa, há sempre a possibilidade de racha que levaria para um lado o PSB, PDT e PCdoB, para outro o PT, que dificilmente aceitará não ter cabeça de chapa, o que deixará o PMDB entregue à sua divisão permanente.

A idéia de unir PMDB e PT, com Aécio Neves para presidente, esbarra primeiro na dificuldade que o governador de Minas teria para deixar o PSDB, e depois na resistência do PT de aceitar a vice nessa chapa. E também na insegurança que sempre surge nos acordos políticos com o PMDB.

Em política, há casos raros de transferência de votos - Cesar Maia elegeu Luiz Paulo Conde no Rio, e Paulo Maluf, Pitta em São Paulo -, e Lula tem experiências contraditórias recentes: ao mesmo tempo que seus candidatos a governador não tiveram sucesso, ele foi praticamente o responsável pela vitória de Jacques Wagner na Bahia. Empenhou-se pessoalmente em derrotar o grupo do então senador Antonio Carlos Magalhães e foi vitorioso.

Assim como não tem adversário de peso no seu tipo de liderança neopopulista, Lula não tem ninguém nas suas hostes que o substitua nessa relação direta com o povo. O mais provável é que tenha mais de um candidato, na expectativa de que dois deles vão ao segundo turno, derrotando tucanos e democratas, ou, a exemplo do que aconteceu em 2006 em Pernambuco, um candidato da coalizão conte com o apoio dos demais partidos num segundo turno contra a oposição.

A decisão de devolver a Cuba os dois pugilistas que haviam abandonado a delegação no Pan é um ato pusilânime do governo brasileiro, que transforma a Polícia Federal em braço político da ditadura de Fidel Castro. Ainda mais quando se sabe que Fidel reclamou formalmente com o governo das deserções ocorridas durante o Pan, e mandou retirar a delegação um dia antes, para abortar uma fuga em massa.

Não resiste ao bom senso a informação oficial de que os pugilistas estavam dispostos a regressara a Cuba. A imagem de independência do país estará vulnerável ao protesto de diversos organismos internacionais de Direitos Humanos.

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