Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 19, 2007

MENSALÃO

JULGAMENTO DO MENSALÃO

STF decide se "quadrilha" do mensalão vai a julgamento

Maratona de sessões a partir de quarta-feira analisa denúncia do procurador-geral

Prevalece entre os ministros entendimento de que, para instaurar o processo, basta que a denúncia aponte os indícios de prática de crime

SILVANA DE FREITAS
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em um julgamento histórico, o STF (Supremo Tribunal Federal) deverá abrir nesta semana a ação penal do mensalão, inclusive em relação ao ex-ministro da Casa Civil do governo Lula, José Dirceu, embora ele tenha mais chances que os outros 39 denunciados de capitanear votos a seu favor.
Segundo a Folha apurou, prevalece entre os ministros o entendimento de que, para instaurar o processo, basta que a denúncia criminal aponte os indícios de prática de crime contra cada pessoa e descreva os fatos de forma consistente e coerente. As provas cabais só são necessárias para a condenação, no julgamento final.
Na cúpula do governo, avalia-se que Dirceu pode ser absolvido. Autor da denúncia, oferecida ao STF em março de 2006, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, disse que os fatos já apurados são suficientes para que Dirceu e os outros denunciados se tornem réus.
Na denúncia, Antonio Fernando acusou a existência de uma "quadrilha" montada durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para "negociar apoio político [por meio do pagamento de mensalão], pagar dívidas pretéritas do PT e custear gastos de campanha".
Segundo o procurador-geral, Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro Delúbio Soares e o ex-secretário-geral Silvio Pereira atuavam no "núcleo principal da quadrilha". Ele definiu o publicitário Marcos Valério de Souza como "um verdadeiro profissional do crime".
A partir de quarta, os ministros realizarão pelo menos três sessões seguidas, durante todo o dia, para decidir se acolhem a denúncia, que representa o pedido de abertura do processo.
Se isso ocorrer, os denunciados passarão à condição de réus. O procurador-geral apresentará provas que diz ter em mãos, decorrentes de perícias, e indicará ao STF a produção de outras. O relator deverá ouvir os réus e as testemunhas de defesa e de acusação. O processo poderá demorar anos.
O mensalão foi denunciado pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), em entrevistas à Folha, em junho de 2005.
O caso do mensalão é comparado à ação penal instaurada contra o ex-presidente Fernando Collor, o empresário Paulo Cesar Farias e outras sete pessoas, particularmente pela repercussão política.
Fora do governo, em abril de 1993, Collor foi denunciado pelo ex-procurador-geral Aristides Junqueira por corrupção passiva. O STF abriu ação penal, mas, em dezembro de 1994, Collor foi absolvido.
Dos atuais ministros do STF, só Celso de Mello atuou no caso Collor. Marco Aurélio Mello não pôde participar, por ser primo do ex-presidente. E Sepúlveda Pertence aposentou-se na semana passada.
Seis dos dez ministros que irão decidir sobre a abertura do processo do mensalão foram nomeados por Lula, inclusive o relator, Joaquim Barbosa.
Ex-procurador da República, Barbosa já deu sinais de sua tendência em declarações nas quais ressaltava que acolhimento de denúncia não significa condenação prévia. Um levantamento divulgado nesta semana pelo STF mostrou que, de 1988 a 2001, só 3,85% das ações penais instauradas resultaram em condenação.
Quatro ministros não veriam provas suficientes na denúncia para justificar uma ação penal contra Dirceu. Seriam: Gilmar Mendes, Celso de Mello, Eros Grau e Cezar Peluso. Eles poderiam excluir outros acusados sob o mesmo argumento.
Outros quatro ministros do STF, de acordo com a cúpula do governo, teriam propensão a aceitar a denúncia: Ellen Gracie, Joaquim Barbosa, Carlos Brito e Marco Aurélio Mello. A maior incerteza é em relação aos votos de Cármen Lúcia Rocha e Ricardo Lewandowski.

Com consultorias secretas, Dirceu mantém influência Ex-ministro, que viaja de 2 a 3 vezes por semana para atender empresas privadas, mantém sob sigilo nomes de seus clientes

Atual refúgio do petista é seu sobrado em Vinhedo, avaliado em R$ 500 mil; ex-ministro se recusa a mostrar contratos e nega fazer lobby

RUBENS VALENTE
ENVIADO A VINHEDO (SP)

Portugal, República Dominicana, Argentina, Peru, Chile, duas vezes nos Estados Unidos, México, Nicarágua e, por fim, uma semana de folga em Toronto, no Canadá - só de janeiro para cá. Duas a três viagens por semana pelo Brasil, palestras e consultorias remuneradas para empresas privadas.
Para descansar, um sobrado avaliado em R$ 500 mil, de 300 metros quadrados com três quartos, quatro banheiros e dois escritórios, em Vinhedo, a 76 km de São Paulo.
Aos 61 anos, o ex-líder estudantil, ex-aprendiz de guerrilheiro em Cuba, ex-vendedor de jeans, ex-ministro e ex-homem forte do governo Lula - acusado de ser o "chefe da quadrilha" do mensalão -, o advogado José Dirceu de Oliveira e Silva cumpre uma rotina tão agitada quanto reservada -ninguém fora de seu círculo sabe para quem ele trabalha e quem sustenta a maratona de hotéis e aeroportos. E ele não faz questão de esclarecer.
A Folha encaminhou à assessoria do ex-ministro lista de 17 possíveis clientes de Dirceu, citados pela imprensa. A resposta: "Os contratos de consultoria têm cláusulas de confidencialidade, o que é normal e rotineiro. Ele teria de pedir aos contratantes autorização para confirmar e não acha que deva fazer isso". A reportagem pediu então para ver as "cláusulas de confidencialidade", mas não houve retorno.
Sabem-se cacos dessa história. Uma escuta telefônica da PF neste ano captou, acidentalmente, a informação de que ele trabalharia para o frigorífico Minerva, de Barretos (SP) - o que Dirceu confirmou, indiretamente, numa entrevista à revista "Playboy".
No ano passado, Dirceu esteve na Bolívia a bordo de um jato contratado pelo empresário de siderurgia Eike Batista. Em abril, um jornal do Tocantins informou que Dirceu circulou durante três dias na região num jato Cessna Citation registrado em nome de uma empresa de táxi aéreo de Fortaleza. Segundo contas da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que pediu esclarecimentos, a viagem teria custado não menos que R$ 200 mil.
Na entrevista à "Playboy", Dirceu negou fazer lobby no governo: "No fundo, o que eu faço é isso: analiso a situação, aconselho. Se eu fizesse lobby, o presidente saberia no outro dia. Porque no governo, quando eu dou um telefonema, modéstia à parte, é um telefonema! As empresas que trabalham comigo estão satisfeitas. E eu procuro trabalhar mais com empresas privadas que com empresas que têm relação com o governo".
Dirceu toca duas empresas ao mesmo tempo, uma de consultoria e outra de advocacia, ambas na Vila Mariana, em São Paulo. Divide a segunda com a advogada Lilian Ribeiro. Passa pouco tempo nos escritórios.
O presidente do Irib (Instituto de Registro Imobiliário do Brasil), Helvécio Duia Castello, é dos poucos a divulgar na internet que manteve encontro com Dirceu. Disse que foram cerca de 20 minutos, no escritório da rua Sena Madureira. Castello, filiado ao PT do Espírito Santo, foi deputado federal entre 1991 e 1994.
O Irib retirou de sua página na internet a menção ao encontro. O instituto define-se como uma entidade sem fins lucrativos que tem como objetivo "o estudo e a pesquisa de procedimentos e normas jurídicas referentes ao registro de imóveis e o assessoramento de autoridades públicas e órgãos governamentais".
Não há relatos de que Dirceu passe muito tempo em Vinhedo - em novembro, o ex-ministro disse à Folha que ficava "a maior parte da semana" na cidade. A ausência é referida no boletim de ocorrência lavrado para apurar furto ocorrido em sua casa em novembro de 2005 - Dirceu deixara a Casa Civil em 23 de junho daquele ano, após as denúncias do mensalão feitas pelo ex-aliado e ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ).
A empregada da casa de Dirceu disse à Polícia Civil que os ladrões arrombaram uma janela e levaram uma TV com tela de plasma, charutos, medalhas, chocolates, um tapete vermelho", além de tentarem carregar um aparelho de som, que acabou abandonado no jardim da casa. O dado revelador é que tudo estava embalado na casa, intocado, havia mais de dois meses, junto com aparelho de microondas, sofá e cama.
Dirceu comprou o terreno em Vinhedo em dezembro de 2001, por R$ 50 mil. Escolheu um dos condomínios mais distantes e isolados, a cerca de 10 km do centro. Construiu a casa nos dois anos seguintes.

Delúbio Soares leva vida de celebridade em sua terra natal Ex-tesoureiro do PT recebeu governador de Goiás na semana passada; em evento, vereadores e prefeitos pediram fotos

Ao pedido de entrevista, afirmou que não falaria "nadinha'; sobre resultado no Supremo, respondeu "vou esperar, deixar julgar"

HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BURITI ALEGRE (GO)

O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares desfila como celebridade em sua terra natal, Buriti Alegre (GO). Delúbio mantém o cargo de professor do Estado, mesmo condenado por receber sem trabalhar. Na tarde de quarta-feira passada, ele recebeu o governador Alcides Rodrigues Filho (PP) no aeroporto de Buriti Alegre e participou da inauguração de um frigorífico, subindo no palco onde estava Rodrigues.
O governador negou relação pessoal ou de governo com Delúbio. "Ele é goiano, é de Buriti Alegre e está prestigiando aqui a inauguração da empresa", afirmou. Delúbio foi e voltou do aeroporto num Vectra prata -registrado em nome do irmão, o vereador de Goiânia Carlos Soares (PT). Um Astra com dois homens o escoltava.
O promotor Fernando Aurvealle Krebs abriu inquérito em 31 de maio "para investigar retardamento ou omissão" da Procuradoria Geral do Estado, órgão do governo, na demissão de Delúbio do cargo de professor. "Ele pretende ser candidato a deputado federal, representando a classe dos professores. Ficaria muito ruim para ele ser exonerado à bem do serviço público", diz Krebs.
Por ter recebido salário sem trabalhar (de setembro de 1994 a janeiro de 1998 e de fevereiro de 2001 a janeiro de 2005), Delúbio foi alvo de processo administrativo do governo, aberto em junho de 2005, que pode levar à demissão. Em maio passado, a Justiça o condenou a devolver R$ 164.695,51 ao Estado.
O procurador-geral do Estado, Norival Castro Santomé, em viagem, não falou com a reportagem. Seu antecessor, João Furtado de Mendonça Neto, em ofício enviado ao promotor em junho, diz que a Procuradoria "não faz julgamento político" e que o processo de demissão voltou ao órgão porque o ex-tesoureiro do PT alegou cerceamento de defesa.
Delúbio disse à Folha que não falaria "nadinha, nadinha, nadinha". "A última vez em que um cara [jornalista] pôs foi uma frase muito ruim, foi aquele negócio de piada de salão. Eu não falei aquilo", disse, em referência a reportagem de "O Estado de S.Paulo" publicada em outubro de 2005, segundo a qual Delúbio afirmara que as denúncias "serão esclarecidas, esquecidas e acabarão virando piada de salão".
Na festa de inauguração do frigorífico Goiaves, ainda na quarta passada, o repórter insistiu duas vezes para obter uma entrevista, mas recebeu apenas abraços do ex-tesoureiro. Perguntado sobre o julgamento do Supremo Tribunal Federal, Delúbio disse: "Vou esperar. Deixar julgar". Ele é acusado de organizar, com Marcos Valério, esquema de repasse de dinheiro a políticos da base aliada do governo.
Vestindo uma camisa da seleção brasileira, era chamado por vereadores, prefeitos e convidados da festa para tirar fotos. O empresário Gal Lachovitz, um dos sócios do frigorífico Goiaves, disse que Delúbio "talvez tenha ajudado, acelerando um licenciamento, ou algo assim". Jorge Jonas Zabrockis, outro sócio, afirmou que convidou o ex-tesoureiro para a festa. No começo do governo Lula, disse Zabrockis, Delúbio ajudou no contato do frigorífico, ainda em obras, com empresas fornecedoras de equipamentos. O empresário nega ajuda política.

Em BH, Valério responde à 1ª ação penal fora do Supremo PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

No próximo dia 22 completará dois meses a instauração do primeiro processo penal pós escândalo do mensalão em tramitação fora do STF (Supremo Tribunal Federal) contra o empresário Marcos Valério de Souza e seus ex-sócios nas extintas agências DNA e SMPB. Eles vão depor pela primeira vez à Justiça Federal nesse processo nos dias 3 e 4 de outubro.
Na ação, que tramita na 9ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, a denúncia do Ministério Público Federal fala em sonegação fiscal (R$ 50 milhões), uso de documento falso e formação de quadrilha.
Valério responde ainda por "destruir, suprimir ou ocultar, em benefício próprio, ou de outrem ou em prejuízo alheio, documento verdadeiro, de que não podia dispor".
Esses fatos referem-se a documentos fiscais da DNA entre 1999 e 2002, mas o caso avançou para o período de apuração do mensalão quando, em junho de 2005, notas fiscais que estavam desaparecidas foram apreendidas na casa do contador de Valério e em um terreno próximo, sendo queimadas. O processo tem sete réus.
Em Minas, existem mais sete ações instauradas contra eles após a crise do mensalão. Essa é a única na área penal.
Uma ação sobre dívidas com o INSS tramita na Justiça Federal. Outras seis, na Justiça estadual. São execuções dos bancos BMG e Rural contra as empresas deles por causa dos supostos empréstimos ao PT.
Apesar de tantos processos, Valério e seus ex-sócios tentam manter uma rotina. Com as agências SMPB e DNA fechadas, os "ex-sócios publicitários" continuaram no mercado. Cristiano Paz abriu a Filadélfia. Francisco Castilho e Margareth Queiroz, a Bárbara.
Valério não fala sobre sua vida e seus negócios. Não responde sobre como paga as suas contas, os advogados e como mantém a casa no bairro Castelo, já que todos os bens estão bloqueados. Ele voltou a morar na casa em abril do ano passado, quando terminou a reforma do imóvel. Mora lá com os filhos e a mulher, Renilda, também denunciada.
O mais recente negócio de Valério foi o arrendamento de uma fazenda a 120 km de Belo Horizonte, cuja sede, de luxo, tem 700 m2. Mas nega rumores de que compra e vende gado.
O proprietário da fazenda, o empresário Benito Porcaro, confirmou em nota que arrendou a fazenda, mas não o gado que está na propriedade.
É na fazenda que estão os 11 cavalos de Valério, incluídos entre os bens bloqueados. Segundo sua assessoria, Valério saiu da sociedade que tinha em um centro hípico e por isso os animais precisaram de abrigo.
Valério costuma dizer ser consultor de empresas, negócio que exerce em sociedade com o advogado Rogério Tolentino. Ele vai quase todos os dias ao escritório, na zona sul de Belo Horizonte.
Além da fazenda, a mais recente novidade na sua vida são os cabelos implantados na parte superior da cabeça, neste ano. No ano passado, ele parou de raspar e deixou os cabelos crescerem nas laterais e na parte posterior da cabeça.

Outro lado
O advogado de Valério, Marcelo Leonardo, disse que, sobre a denúncia de queima de notas fiscais, seu cliente "não autorizou, não mandou ninguém fazer e nunca concordou" com isso. Negou também sonegação fiscal e uso de notas frias. "Vai ser possível fazer provas. Teve, sim, recolhimento dos tributos. Não houve sonegação, pois houve o recolhimento mediante desconto antecipado na fatura da própria DNA."

Silvio Pereira tem carro novo e administra empresa

Ex-secretário-geral do PT, que ganhou Land Rover da empreiteira GDK, comprou uma Toyota e conta com ajuda de sócio de Dirceu

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Longe da política partidária desde julho de 2005, quando ficou famoso por ter recebido de presente um jipe Land Rover de R$ 79 mil, Sílvio Pereira se dedica hoje a administrar uma empresa de eventos, que recebeu verba da Petrobras, e a construir uma pousada em Ilhabela, litoral norte paulista.
O ex-secretário do PT, parte do núcleo político-partidário denunciado no escândalo do mensalão, mantém seu gosto por carrões. Comprou recentemente uma Toyota Fielder, prata, ano de fabricação 2007, avaliada em cerca de R$ 65 mil.
Grande parte do apoio que Sílvio recebe vem do sócio do ex-ministro e deputado cassado José Dirceu (PT), Júlio César dos Santos.
Dono da Central de Eventos e da TGS Consultoria, Santos emprestou duas salas do prédio em que trabalhava, na Vila Olímpia, para a DNP Eventos, que está em nome de Sílvio, da mulher dele, Deborah Neistein, e do irmão Ademir Pereira.
No início deste ano, depois de conseguir o patrocínio da Petrobras para um projeto de cinema na praia de Camburi, em Vitória (ES), Santos subcontratou a empresa de Sílvio para "coordenação e produção" da mostra por R$ 55 mil.
Quatro petistas afirmaram que Dirceu, por meio de Santos e de outros amigos, procura ajudar Sílvio, que foi seu braço direito no PT durante anos.
Após a divulgação do subcontrato da DNP, em julho, pela revista "Veja", Sílvio e Santos fecharam o prédio na Vila Olímpia. Segundo amigos do ex-petista, Sílvio transferiu a empresa para o apartamento em que vive com a mulher e filha, no bairro Bela Vista, em São Paulo, avaliado em R$ 300 mil.
Porteiros e vizinhos afirmam que o ex-secretário do PT recebe hoje poucos amigos. Dirceu, dizem, foi duas ou três vezes. Já o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares é o mais visto. Aos funcionários do prédio, Sílvio transmitiu a ordem de dizer que nunca está.

Bar e pousada
Na época do mensalão, Sílvio disse a amigos e a jornalistas que iria tomar conta do bar da família, em Osasco, e abrir uma pousada em Ilhabela, onde tem uma casa em um condomínio.
No modesto bar AJP, no centro de Osasco, Sílvio dificilmente aparece, afirma a cunhada Nilcéa Messias Pereira. Já as viagens a Ilhabela se transformaram numa rotina. A casa na praia, avaliada em cerca de R$ 600 mil, vem sendo construída há anos pelo ex-petista. O terreno foi comprado em 1996.
Os vizinhos de praia o descrevem como calmo e simpático, mas não têm relações próximas com ele. Uma das atrações, dizem, é saber como ele estará: com barba, barbicha, boné ou com cabelos mais compridos.
Aliás, a ilha toda parece conhecer Sílvio. Nos Correios, quando a reportagem pediu informação sobre o endereço, um homem perguntou: "O Silvinho Land Rover? Ele mora no condomínio Siriuba 2", diz. O mesmo ocorreu no trajeto, quando moradores da ilha indicavam a direção da "casa do Silvinho".
Uma mulher que disse trabalhar na casa de Sílvio afirmou que ele está construindo uma pousada no sul da ilha, em parceria com um empresário -a Secretaria de Obras de Ilhabela informou que não há nenhuma obra em nome do ex-petista.
Segundo uma vizinha, a mulher de Sílvio também comenta sobre a pousada. Amigos do petista confirmam a construção, mas não revelam a localização.
O Toyota Fielder é o terceiro carro da família. Eles têm ainda um Palio, que custa cerca de R$ 13 mil, e um Palio Adventure Flex, estimado em R$ 40 mil.
Um mês antes de vir à tona que o Land Rover havia sido presente da empreiteira GDK, que tem contratos com a Petrobras, Sílvio colocou o jipe à venda por R$ 79 mil. Pressionado, devolveu o carro. No mesmo dia, pediu desfiliação do PT.
Quando conversa com amigos sobre a denúncia que será avaliada pelo STF, diz não existirem provas contra ele. Argumenta que indicar pessoas para determinados cargos para o governo [o que era sua função no PT] não é crime. O ex-petista enfatiza ainda que a história do jipe não será avaliada nesse momento -o caso corre em inquérito paralelo.

Duda diz aos amigos que deveria ter se calado na CPI

JULGAMENTO DO MENSALÃO Em agosto de 2005, publicitário admitiu ter recebido R$ 10,5 milhões do empresário Marcos Valério no exterior, por meio de caixa dois

Afirmação a parlamentares agravou a crise do governo e do PT; Lula considera aquele um dos momentos mais duros de seu 1º mandato

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O publicitário Duda Mendonça se arrepende do depoimento que deu em 11 de agosto de 2005 à CPI dos Correios, quando admitiu ter recebido R$ 10,5 milhões de Marcos Valério no exterior. Em desabafo a amigos diz que errou e que deveria ter ficado calado. Sem combinar estratégia com o governo, Duda disse que recebera o dinheiro, via caixa dois, em pagamento de campanhas para o PT em 2002. Pensou que na CPI, na qual havia antigos clientes seus, poderia encontrar apoio se falasse a verdade. Sentia-se chantageado por Valério, que vazara a informação do pagamento.
Hoje, a defesa de Duda alega que ele "declarou espontaneamente a propriedade da Dusseldorf Company Ltd. [offshore] e recolheu todos os impostos", extinguindo-se a punibilidade de eventuais crimes contra a ordem tributária. "Extinta a punibilidade do crime-fim, o mesmo deve ocorrer com relação ao crime-meio [depósito não-declarado no exterior]". O depoimento na CPI agravou a crise do governo. O presidente Lula considera aquele um dos momentos mais duros, no qual temeu até a possibilidade processo de impeachment.
Nesse período de crise, Duda manteve as contas da Petrobras e do Ministério da Saúde. Até hoje o governo teme que ele faça revelações. Adversários vêem na manutenção das contas uma forma de mantê-lo longe dos holofotes. Responsável pela vitoriosa campanha que levou Lula à Presidência em 2002, Duda foi um dos mais influentes conselheiros até a explosão do mensalão. Hoje, tem uma vida relativamente discreta. Sua agência, a Duda Mendonça e Associados, perdeu clientes importantes no setor privado (Guaraná Antarctica, por exemplo) e reduziu o tamanho de seus escritórios. No mercado paulista, cuida da conta da FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas).
Recentemente, fez a campanha do Jogos Pan-Americanos. Aos 63 anos, Duda dá expediente durante a semana na agência em Salvador. Nas folgas, vai para a casa de praia no litoral sul baiano e para duas fazendas, no interior do Estado e no Pará (esta com 5 mil cabeças de gado). Em 2006, entrou em depressão e teve implantadas quatro pontes de safena. Atualmente, sua empresa de marketing político (CEP) não está na ativa. Por ora, não tem planos de voltar às campanhas políticas. (KENNEDY ALENCAR)


Colaborou FREDERICO VASCONCELOS, da Reportagem Local

Ex-homem-bomba, Jefferson defende um acusado de homicídio

Deputado cassado que revelou à Folha o esquema do mensalão é hoje advogado criminalista com apenas um único cliente no Rio

Presidente do PTB, que recebe aposentadoria do Congresso, mantém um blog e aulas de canto lírico quatro vezes por semana

Leopoldo Silva - 7.fev.2007/Folha Imagem
Roberto Jefferson canta na inauguração do apartamento do deputado Frank Aguiar (PTB-SP)


RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO

Homem-bomba que detonou o mensalão, o deputado federal cassado Roberto Jefferson, 54, é hoje um advogado criminalista de poucos clientes, em gozo da aposentadoria do Congresso, blogueiro atuante e cantor lírico diletante.
Mesmo sem cargo eletivo, continua na presidência nacional do PTB, e divide a semana entre o Rio e Brasília, cidades onde mantém escritório.
Na advocacia, não se mostra tão ativo ou influente como era no Congresso Nacional. Pesquisa no site do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, mostra que o hoje advogado Roberto Jefferson só tem um cliente no seu Estado de origem e onde passa metade da semana.
É um processo por homicídio, em que defende o réu Renato Demétrio de Souza. O crime foi registrado em Três Rios, antiga base eleitoral de Roberto Jefferson.
Sua assessoria informa que ele atua também em um caso no Tribunal do Júri do Distrito Federal, no qual teve êxito como assistente de acusação do Ministério Público. Jefferson não quis falar à Folha.
O ex-deputado fracassou no retorno aos tribunais como advogado após 15 anos, em novembro de 2005. Trabalhou gratuitamente, também como assistente de acusação, em caso ocorrido em Veras (MT), mas não convenceu o júri da culpa do acusado. Perdeu por 4 a 3.

Blog
O blog do Jefferson, página pessoal do "ex-deputado, advogado, aprendiz de cantor" -como se define- já conta 644.821 acessos desde sua criação, há dois anos.
O projeto ocupa suas manhãs, a tomar pelo horário das mensagens, normalmente enviadas até as 14h. Na semana passada, a média é de sete textos por dia, em geral comentários políticos, freqüentemente críticos ao governo Lula.
A última nota escrita anteontem, às 12h26, por exemplo é intitulada "Oportunismo" e começa com a frase "Lula joga o tempo todo na exacerbação da divisão de classes". Termina com "Ninguém engana e manipula todo o tempo. Um dia, a casa cai".
Na semana passada, os comentários de leitores a seus sete textos -em média-, variaram de 121 a dois, um ou até mesmo nenhum (em um caso).
Além de responder às acusações de corrupção ativa e lavagem de dinheiro do mensalão, Roberto Jefferson ainda enfrenta atualmente outro problema, esse com o fisco. Consulta à página da Receita Federal na internet mostra que ele está irregular no órgão do Ministério da Fazenda.
"As informações disponíveis na Secretaria da Receita Federal do Brasil e na Procuradoria Geral da fazenda nacional são insuficientes para a emissão de certidão por meio da internet", diz o texto, quando digitado o CPF do ex-deputado.

Canto é hobby
O principal hobby de Jefferson hoje é o canto lírico. Toma lições quatro vezes por semana, tanto no Rio como em Brasília, com os professores Léo Páscoa e Denise Pimentel. Este ano, ganhou um lugar em palco de destaque. A convite do organizador do concurso Miss Brasil, Danilo D'Ávila, seu amigo, o ex-deputado cantou três músicas de seu repertório.

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