Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 14, 2007

Celso Ming - O bico do corvo




O Estado de S. Paulo
14/8/2007

Os mercados atuaram ontem com mais calma porque os bancos centrais mantiveram abertas e disponíveis as tubulações de oxigênio. E também porque não apareceu problema novo.

Sem tanto treme-treme, é possível ter mais objetividade. As condições de visibilidade continuam ruins. Mas já se sabe alguma coisa mais. Ou melhor, já se sabe mais o que essa turbulência não é e um pouco do que é.

Não é, por exemplo, uma corrida aos depósitos bancários que pudesse quebrar em série instituições financeiras. Ela surgiu nos segmentos do mercado de capitais em que os empréstimos permanecem pouco tempo na carteira dos bancos, porque logo são vendidos para fundos de investimento ou pessoas físicas.

Não há repentina falta de dinheiro nos mercados. Os bancos estão inundados de liquidez. Eles só não querem reabrir o crédito porque, agora, não conseguem avaliar riscos e definir garantias. Até onde se sabe, não há nenhuma grande vítima.

Também não é doença contagiosa atacando os países emergentes, como nos anos 90. Ao contrário, a economia dos emergentes parece mais saudável do que a dos países ricos. Ontem, por exemplo, artigo divulgado pela Bloomberg afirmava que “os mercados emergentes são tão estáveis como o dos países ricos e merecem um prêmio porque crescem três vezes mais depressa”.

Também não há depressão, nem recessão, nem aumento do desemprego. O que se teme não é um crash dos mercados provocado por uma crise do sistema, como no passado, mas uma brecada na produção causada pela deterioração da noção de risco.

A principal razão do pânico parece vir do fato de que não se sabe quais são as proporções da encrenca. Há 20 anos, os grandes credores eram os bancos. Um calote poderia levar duas ou três instituições à breca. E o drama apareceria imediatamente. Hoje, o risco está pulverizado por uma miríade de fundos e carteiras. Não é que falte transparência; é que não se tem noção do todo. Por isso as pessoas perguntam: que banco está no bico do corvo? De todo modo, como ontem observou aqui em São Paulo o ex-presidente do Federal Reserve de Richmond William Handorf, “só 20% do crédito imobiliário distribuído nos Estados Unidos é de alto risco (subprime)”. Mas esta não é uma noção disseminada.

Quem condena os bancos centrais por bombear dinheiro vivo para o mercado parece não ter entendido o que se passa. Não é verdade que os bancos centrais estejam garantindo a farra das cigarras e, assim, agenciando o risco moral (moral hazard). Os bancos centrais estão apenas restabelecendo o nível de dinheiro no mercado, tal como definido pela política monetária.

Ou seja, como o crédito estancou, um importante canal de transmissão da política de juros entupiu. Ou, como dizem alguns, a liquidez empoçou. O bancos centrais estão apenas implantando pontes de safena para restabelecer o nível de dinheiro da economia de tal modo que os juros primários sejam observados.


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