Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 14, 2007

A caminho da reestatização



Editorial
O Estado de S. Paulo
14/8/2007

O presidente Lula, dizem seus auxiliares, não pretende reestatizar a economia. Quer apenas destravar os investimentos. Talvez ele não queira, mas seu governo age, desde o início do segundo mandato, como se a reestatização de setores considerados estratégicos fosse um de seus objetivos centrais. Empresários ligaram o sinal de alarme, na semana passada, quando a Petrobrás comprou a Suzano Petroquímica por R$ 2,7 bilhões. Com essa operação, foi rompido um padrão de comportamento, observou o presidente da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Carlos Mariani Bittencourt: em seu retorno gradual ao setor petroquímico, a estatal vinha adquirindo participações, mas não controle de empresas. Na operação anterior, a Petrobrás havia comprado os ativos petroquímicos da Ipiranga em parceria com a Braskem. O presidente da Braskem, José Carlos Grubisish, mostrou-se inquieto diante do novo lance da estatal: “Queremos uma posição clara e objetiva. Não entendemos claramente a posição da Petrobrás até o momento.” O avanço na petroquímica é apenas um dos indícios de uma nova política estatizante.

Também nos setores elétrico e de telecomunicações o governo age como se pretendesse retomar a liderança dos investimentos e o controle das principais decisões. Segundo portaria do Ministério de Minas e Energia, construtores e fornecedores poderão ter no máximo 20% do capital da sociedade concessionária da Usina de Santo Antônio, a primeira das duas hidrelétricas planejadas para o Rio Madeira. Representantes das construtoras mostraram preocupação ao conhecer o texto da portaria, divulgado na sexta-feira e publicado nesta segunda-feira no Diário Oficial da União. O objetivo do governo, de acordo com a primeira interpretação, só pode ser o controle dos grandes empreendimentos programados para o setor elétrico. O Grupo Eletrobrás começou em 2003 a comprar participação nos projetos hidrelétricos leiloados pelo governo e essa tendência parece agora intensificar-se. Reportagem publicada no Estado de domingo mostrou as principais iniciativas do Grupo Eletrobrás nos últimos quatro anos e sublinhou a atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em apoio à política da estatal.

No caso das telecomunicações, os sinais de reorientação surgiram no começo do primeiro mandato petista. Inicialmente o Ministério das Comunicações tentou atropelar a agência reguladora, a Anatel, para assumir o controle da política de tarifas. Recentemente, o ministro Hélio Costa defendeu a criação de uma grande operadora nacional, por meio da fusão de duas empresas, ficando o Estado com uma golden share, isto é, com o poder de interferir nas principais decisões da nova companhia.

Todas essas iniciativas são explicáveis, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, por motivações diferentes. A compra da Suzano pela Petrobrás, disse o ministro, é “um negócio como outro qualquer”. A fusão de duas telefônicas é um negócio privado e o governo apenas manifestou interesse na criação de uma empresa sob controle nacional. Quanto à participação de Furnas nos investimentos no Rio Madeira, acrescentou, é algo desejado pelos investidores particulares. De fato, cada caso pode comportar uma explicação, mas a direção é uma só: a restauração do controle estatal em setores de infra-estrutura considerados vitais para a economia brasileira.

Mas há outros sinais, igualmente ostensivos, de uma tendência à reestatização de grandes setores e à centralização de importantes decisões econômicas. A demora na regulação das Parcerias Público-Privadas (PPPs) é explicável principalmente pela resistência do governo, ou de algumas das suas figuras mais influentes, a uma participação maior do setor privado em grandes investimentos no setor de serviços públicos.

A permanente campanha contra a autonomia operacional das agências reguladoras também denuncia a intenção de sujeitar ao Executivo toda a produção de normas para serviços de infra-estrutura. Neste caso não se trata só de estatizar, mas de politizar uma área vital da administração. Se o presidente da República apenas pretende, como disse um de seus auxiliares, destravar os investimentos, o caminho escolhido é o menos adequado. Queira ou não, o governo não pode simplesmente dispensar o capital privado - e a reestatização tende a espantá-lo.

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