Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, outubro 05, 2006

Celso Ming - A inflação fraqueja

Celso Ming - A inflação fraqueja


O Estado de S. Paulo
5/10/2006

O Banco Central está sendo surpreendido por uma inflação muito mais baixa do que a esperada, mas não está sozinho nessa. Ao longo deste ano, o mercado inteiro cravou uma inflação bem mais alta do que a prevista.
Em todo o caso, esperam-se duas conseqüências dessa perda de força dos preços: a intensificação das reclamações de que o Banco Central errou na dose e maior queda dos juros.
Ontem, a Fipe registrou para a cidade de São Paulo uma evolução do custo de vida, em setembro, de 0,25%. As projeções para este ano são de uma acumulada de apenas 1,6% (veja gráfico), conforme anunciou ontem o coordenador da Fipe, Paulo Picchetti - caso a Petrobrás desista dos reajustes (para cima) dos preços dos combustíveis no mercado interno, o que é cada vez mais provável. Aliás, fala-se agora em queda de preços.
Sexta-feira, será conhecida a inflação de setembro, medida pelo IPCA, que serve de critério para definição dos juros. Se vier algo abaixo de 0,25%, será nova surpresa. E a probabilidade de que a inflação deste ano fique mais perto dos 2,5% do que dos 3,0% aumentará bastante.
Esses 2,5% são o piso mínimo admitido pela política adotada.
A meta de inflação para este ano é de 4,5%, tolerado o desvio de 2 pontos porcentuais, tanto para cima como para baixo. Em seis anos de sistema de metas, esta é a primeira vez que acontecerá um desvio para baixo.
Na semana passada, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Afonso Bevilaqua, admitiu que havia, então, 25% de probabilidade de que a inflação acumulada ao longo deste ano fique aquém dos 2,5%.
Não há dúvida de que o Banco Central foi surpreendido. O Relatório de Inflação divulgado há duas semanas, com base nas estatísticas disponíveis no final de agosto, admitia para este ano uma inflação de 3,4%, número hoje considerado alto demais.
Também na última semana de agosto, o mercado financeiro auscultado pelo Banco Central por meio da Pesquisa Focus, projetava para todo o ano inflação de 3,63%. Mas, na semana passada, já trabalhava com 2,98%.
Agora que se pressente a nova trajetória dos preços, fica mais fácil encontrar as explicações para esse desempenho substancialmente melhor do que o esperado. O primeiro deles é o de que os juros afinal mostraram serviço, ponto reconhecido pelos analistas que acusam o Banco Central de ter ido longe demais. Se houve erro de dose, é porque a droga produz efeito.
Segundo, os preços dos produtos importados ajudaram a achatar os preços internos. É o que poderia ser chamado de "fator China", ou seja, a derrubada dos preços internos (e não só dos externos) em conseqüência do despejo de produtos asiáticos substancialmente mais baratos em todos os mercados do mundo. No dia 30, esta coluna reclamou de que o Banco Central não registra esse efeito. Na verdade, registra sim, embora com baixa ênfase. No Relatório de Inflação, na página 108, destaca "o comportamento favorável dos preços dos bens não-comercializáveis", mas não credita a façanha aos baixos preços dos produtos procedentes da Ásia que têm influência crescente no mercado doméstico.
Em terceiro lugar, o crescimento econômico relativamente baixo impediu que a inflação de demanda tomasse corpo.
Terça-feira, o economistachefe da Confederação Nacional da Indústria, Flávio Castelo Branco, reclamou do que entendeu por excesso de conservadorismo do Banco Central. À medida que o mercado tomar conhecimento das proporções do recuo da inflação, reclamações como as de Castelo Branco tenderão a se multiplicar.
Independentemente do que disserem os críticos, se for confirmada neste ano uma inflação próxima dos 2,5%, o Banco Central não terá outra saída senão intensificar o afrouxamento monetário. Para as duas próximas reuniões do Copom (18 de outubro e 29 de novembro) estão previstos mais dois cortes.
Se a dose ministrada nas quatro últimas reuniões (corte de meio ponto porcentual) se repetir nessas duas, o ano fechará com juros básicos (Selic) de 13,25% ao ano ou juros reais (descontada a inflação) acima de 11%, número alto demais.
Esse dado sugere que, contra seus planos até aqui, o Banco Central poderá reforçar ainda mais os cortes.

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