Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 05, 2008

Partidos Temporão fecha o cofre e irrita o PMDB

Pelos motivos errados

PMDB quer que o presidente Lula demita o
ministro da Saúde, porque ele atrapalha o fisiologismo


Otávio Cabral

Wilton Junior/AE
Temporão: defensor de medidas polêmicas, o ministro sofre processo de fritura dos próprios aliados

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, foi informado de que seu emprego está ameaçado. Ele criou zonas de desconforto ao defender a restrição da propaganda de bebidas alcoólicas e de comidas gordurosas. Temporão também é a favor da legalização do aborto e da volta da CPMF, o imposto do cheque. Em sua gestão, explodiram os casos de dengue no Brasil e a febre amarela, que parecia controlada, voltou a assustar. Se o presidente Lula decidisse demitir o ministro, não faltariam, portanto, justificativas mais do que razoáveis para isso. O problema é que Temporão está na linha de tiro pelos motivos errados. O PMDB, seu partido e principal cozinheiro no processo de fritura, quer a sua saída por razões bem mais palpáveis – ou polpudas, melhor dizendo. Desde que assumiu o ministério, em março de 2007, Temporão se recusa a nomear apadrinhados para cargos técnicos e dificulta a liberação de emendas de parlamentares aliados. O comportamento do ministro chega ao ponto de nem mesmo receber os deputados e senadores que lhe solicitam audiência. A cúpula do PMDB já foi ao Palácio do Planalto avisar que Temporão não é mais considerado da cota do partido. Em Brasília, isso normalmente funciona como uma espécie de aviso prévio.

As desavenças do PMDB com o ministro já foram tornadas públicas pelos próprios integrantes do partido. "É impossível algum político ser atendido pelo senhor ou por seus assessores. Nem pelo telefone conseguimos falar", reclamou o deputado Eliseu Padilha, em um café-da-manhã promovido pelos peemedebistas e com a presença de Temporão. "As emendas não são liberadas e as nomeações combinadas não são cumpridas", acrescentou o parlamentar, um especialista em fisiologismo. Logo que o ministro assumiu o cargo, o PMDB levou uma lista com três nomes para ocupar a secretaria executiva, o segundo posto mais importante do ministério. Os nomes foram indicados pelas lideranças do partido na Câmara, no Senado e pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, amigo de Temporão. O ministro, no entanto, desconsiderou as indicações e nomeou Márcia Bassit, uma auditora do Tribunal de Contas da União, com a orientação de examinar com lupa todos os contratos, convênios e indicações do ministério, alvos constantes de denúncias de irregularidade. Por causa desse cuidado, peemedebistas indicados para diretorias da Fundação Nacional de Saúde, um conhecido ninho de corrupção, foram vetados. As queixas foram levadas ao presidente Lula pelo presidente do PMDB, Michel Temer.

Orlando Brito
Michel Temer, do PMDB: ele já expressou a insatisfação com o ministro

A turma do fisiologismo político já conseguiu conquistar adesões em outros partidos da base aliada. A principal delas é o atual presidente da Câmara, o petista Arlindo Chinaglia, que anda descontente com Temporão pelo fato de ele ter decidido substituir o presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Dirceu Raposo, indicado pelo petista. Para obter o apoio do PT como um todo, os peemedebistas disseram ao governo que aceitariam até entregar o ministério a um petista, como o próprio Chinaglia, desde que ele se comprometesse a reservar um quinhão da pasta ao PMDB. Em meio a essas articulações, o presidente da Câmara, um médico especializado em saúde pública, telefonou a Temporão, negando seu envolvimento na conspiração para derrubá-lo. Afirmou que, se preciso, faria uma manifestação pública de apoio ao ministro. "Não tenho nenhum interesse em assumir a Saúde", garantiu Chinaglia, que deixa a presidência da Câmara apenas em fevereiro de 2009.

Antonio Scorza/AFP
Tenda improvisada para vítimas da dengue: esse, sim, seria um motivo para demitir Temporão

No café-da-manhã em que foi emparedado pelos peemedebistas, Temporão, ameaçado, prometeu azeitar a relação com os políticos. Disse ainda que, no caso das nomeações, agia com o aval do presidente Lula. "O ministro é qualificado e não tem medo de apresentar idéias polêmicas. Mas sua equipe é muito técnica, não tem sensibilidade política, não recebe nada que venha do partido ou do Congresso. Ele já sabe que precisa melhorar nisso", diz o deputado Henrique Eduardo Alves, líder do PMDB na Câmara. Temporão se comprometeu a priorizar a liberação de emendas para a construção de hospitais e postos de saúde, uma das principais queixas dos parlamentares. O Ministério da Saúde reservou 3,3 bilhões de reais para investimentos neste ano, mas liberou até agora apenas 1%. Quanto aos pedidos de caráter eminentemente político, deixou claro que continuaria intransigente. Ele teria recebido essa orientação diretamente de Lula, a fim de evitar um novo envolvimento do ministério em escândalos como o dos sanguessugas e o dos vampiros, que tragaram seus dois antecessores. O presidente Lula gosta do estilo de Temporão, mas gosta muito mais de ter o PMDB quieto, satisfeito, sem criar problemas para o governo no Congresso. Por isso, não há motivo para o ministro acreditar que esteja seguro no posto.

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