Luiz Garcia - Vítimas do vácuo

O estudo da ONG Article 19 sobre a imprensa brasileira identifica corretamente as principais vítimas dos defeitos de nossa legislação sobre a liberdade de informar.

Não são os grandes veículos de comunicação, mas os pequenos. O que está longe de reduzir as dimensões do problema.

Com grande freqüência, juízes individuais tendem a dar ganho de causa a supostas vítimas de calúnia, difamação ou injúria. Na segunda instância, a tendência se inverte. Ocorre que a grande mídia das capitais tem recursos financeiros para ir à luta nos tribunais, na defesa da liberdade de ação de seus profissionais.

A pequena imprensa, espalhada pelo imenso interior do Brasil, não tem recursos para isso. Perde na primeira instância as ações movidas pelos poderosos locais — uma casta que quase sempre inclui tanto o prefeito quanto o grande fazendeiro, mais o juiz e o promotor – e lhe faltam recursos para continuar a briga nos tribunais.

O relatório da Article 19 registra que o Supremo Tribunal Federal manda arquivar 80% das ações contra jornalistas e empresas de comunicação que chegam até ele. Esse dado não torna menos grave o problema da liberdade de imprensa no Brasil. A Associação Nacional de Jornais, cujos dirigentes quase sempre representam a grande mídia, tem adequada consciência do problema, e com freqüência se manifesta a respeito, procurando defender a irmã pobre e indefesa. Mas o índice de sucesso é pequeno.

Uma parte considerável do problema se deve a uma arcaica legislação sobre a comunicação social.

É curioso: quando se restabeleceu a democracia no país, caiu por terra quase toda a legislação herdada do regime militar. Mas não se mexeu na Lei de Imprensa, que data do governo Costa e Silva, na década de 60.

É uma legislação perfeitamente adequada para uma ditadura. Pode-se argumentar que os sucessivos governos civis não recorreram a ela para domesticar a mídia nacional. Mas isso é pobre desculpa para a ausência de uma lei voltada para a preservação de uma imprensa tão livre quanto responsável.

Há décadas mora no Congresso um projeto de lei de imprensa adequada ao regime democrático.

Que já teve uma infinidade de redações. Todas, claro, a favor da liberdade de imprensa. Mas nenhuma realmente inovadora e eficaz. Por exemplo, ainda não se viu proposta inteligente para a preservação do direito de resposta que atenda aos direitos legítimos de todos os interessados.

O pior não são defeitos deste ou daquele projeto e, sim, o fato de que políticos e partidos homenageiam a liberdade de imprensa muito mais nos discursos do que na ação legislativa.

A Article 19 está certa quando denuncia a existência de um “vácuo legislativo” no Brasil no que se refere à comunicação social.