"É um jogo de ganha-ganha", disse na quinta-feira o governador de Minas Gerais, Aécio Neves. Sem saber da conversa do mineiro, o senador Aloizio Mercadante repetiu a frase no dia seguinte, palavra por palavra.
A oposição tucana acha que ganha no discurso, na imagem e na imposição de melhoria dos gastos públicos ao governo; e a situação petista também contabiliza vitória no discurso, na imagem de negociador à margem do fisiologismo, mas acredita que ganha principalmente na autonomia em relação à base aliada, sempre ávida por benesses específicas.
Em termos conceituais, ambos avaliam que o ganho mais poderoso poderá ser na qualidade da interlocução política que, a despeito de excluir a luta eleitoral - nesta os dois disputam o mesmo espaço, o poder -, numa hipótese otimista poderia acabar influenciando positivamente os termos do embate, nesta hipótese despido das picuinhas de um enfrentamento bruto e referido nas questões de interesse do público.
Tudo muito bonito e civilizado, mas, por enquanto, válido apenas no campo das boas intenções. Seria exagerado qualificá-las de ingênuas, porque estão cercadas de cálculo político por todos os lados. Por isso mesmo são denominadas de "ganha-ganha".
Mas há o risco de fracassarem e se tornar um legítimo "perde-perde". O governo perdendo os R$ 40 bilhões da CPMF e o PSDB perdendo a chance de dizer à população que conseguiu arrancar do governo mais verbas para a saúde, redução de carga tributária e compromisso com a contenção dos gastos oficiais. Neste caso, perderia também o Planalto a oportunidade de se mostrar magnânimo ao ceder em questões de mérito e dar uma meia-trava nos fisiologistas.
E qual o grau de risco de fracasso de tão republicano projeto? Tanto Aécio Neves quanto Aloizio Mercadante acham que é grande.
Simplesmente porque suas pretensões não têm unanimidade nas respectivas bases. Nem a totalidade dos tucanos - muito menos da oposição, onde milita o intransigente Democratas - acha a menor graça nesse acerto nem a maioria absoluta do PT vê com bons olhos essa, digamos, cessão de direitos aos adversários.
De parte a parte há quem prefira o combate. O problema é que nesta briga o governo está em desvantagem. Aécio mesmo avisa que, se o Planalto não for inteligente, "se não quiser ceder e salvar R$ 32 bilhões da CPMF, vai ficar sem os R$ 40 bilhões porque a proposta não passa".
Para que a ala dos tucanos mais disposta à negociação ponha força em movimento para conter seus radicais será preciso que o governo contenha também os seus e firme compromisso com aval "de quem manda" (vale dizer, o presidente Luiz Inácio da Silva), no mínimo, sobre o aumento da cota da CMPF para a saúde e redução de outros impostos para o setor formal da economia privada e para empresas estatais de saneamento.
Sobre as exigências de contenção de gastos públicos e reforma tributária, o governador de Minas admite que a oposição não tem como obrigar Lula a cumprir essas promessas, caso sejam oficializadas.
Mas, nessa hipótese, "a oposição pode mais na frente fazer a cobrança". Seria, na definição dele, o "componente político" do acordo, enquanto as outras propostas feitas pelo PSDB Aécio chama de "componentes de gestão".
"Nosso objetivo na questão dos gastos é aproveitar a chance para trazer à luz esse debate. Não temos a ilusão de que o governo federal vá, de fato, gastar menos, já que a CPMF se tornou imprescindível exatamente em função da gastança que anulou até o aumento da arrecadação."
Já Aloizio Mercadante, que também aponta o perigo de o governo radicalizar e não negociar nos termos postos pela oposição ou recuar e resolver jogar apenas com a base aliada, acha que o bom caminho seria o presidente Lula aceitar a evidência da necessidade de reduzir as despesas de custeio.
"Tive uma longa conversa com o presidente Lula sobre isso. No primeiro governo tivemos mesmo a necessidade de recompor o salário do funcionalismo e aumentar os recursos para a área social, mas agora é preciso conter esses gastos, porque o momento é de investir em infra-estrutura e reduzir a carga tributária, a fim de não desperdiçarmos nem o momento político nem o momento econômico."
E o presidente aceitou? "Ouviu."
Mercadante saúda o espaço de negociação, rende todas as homenagens à "responsabilidade" dos governadores e senadores do PSDB, mas adverte que as expectativas em relação aos termos do acordo precisam caber dentro das circunstâncias do governo.
"Não dá para ter tudo, é preciso chegar a um ponto de equilíbrio entre o tamanho da ampliação dos recursos para a saúde e a redução da carga tributária. O grau de aumento numa ponta determinará o nível de redução na outra."