Jornal do Brasil |
31/10/2007 |
Em meio à confusão intencional, com a abundância de declarações, entrevistas, desmentidos e a confirmação malandra dos anúncios de articulação de emenda constitucional por deputados que sempre se esconderam na modéstia do anonimato, coube ao senador Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado, a autoria do pronunciamento sensato, objetivo e direto, que coloca uma pedra em cima do jogo de dissimulação sobre a ameaça do terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sem o puxa-e-encolhe da arte do toureiro no manejo da capa, o senador tucano vai direto e firme na estocada: "Não abrimos mão de um desmentido cabal de Lula sobre o terceiro mandato". Embala, acelerando: "Não vi repulsa do presidente à idéia. Queremos ter a certeza de que não é aquela coisa de depois, docemente constrangido, aceitar a pressão do partido. Isso prejudica a negociação da CPMF. Isso não pode ser tratado como brincadeira. Isso é blasfêmia e golpe ao mesmo tempo". A cobrança tucana nítida e clara cruza no ar com mais um das dezenas de declarações presidenciais que se presta às interpretações ao gosto do freguês. Como batendo na tecla gasta do óbvio: "A Constituição estabelece um mandato de quatro anos com reeleição". E o repique na ferradura: "Se o Congresso quiser, que faça a reforma política". Ora, vamos falar sério para não perder mais tempo com a conversa de cerca-lourenço das malandragens que ajudaram a arrastar o Congresso, os partidos e os parlamentares ao desgaste infamante de recordistas da impopularidade e desprezo da sociedade. Não convém gastar tempo, espaço e indignação em comentários sobre a iniciativa dos deputados Carlos William (PTC-MG) e Devanir Ribeiro (PT-SP) dos quais nunca ouvira falar - de coletar assinaturas para a emenda constitucional que permitiria a reeleição para o terceiro mandato do presidente e governadores, com o glacê azedo dos futuros mandatos de cinco anos, sem reeleição. Ou se trata de sermão encomendado ou de servilismo de bajulador. Não é por aí o atalho da desconfiança. Mas na montagem do quebra-cabeça que promete sobreviver nos três anos e dois meses do segundo mandato do presidente - que sempre foi contra a reeleição com a mesma firmeza com que se opôs, como presidente do PT, à criação do abominável imposto do cheque, a CPMF dos seus cuidados de convertido. É cansativo batucar na mesma tecla, abusando da paciência do eventual leitor atento. Mas não posso fugir do tema que ronda a presa com a gana da hiena diante da carniça. Do lado do governo, como se confessa e proclama com suspeita franqueza, não há um único projeto de candidato puro sangue da desbotada bandeira do PT com a mais remota viabilidade de enfrentar a oposição e reverter a frustração dos quase 60 milhões de eleitores da consagradora reeleição de Lula. Ao presidente resta a alternativa de articular uma candidatura pescada na sua base de apoio, como é o mais insistente exemplo o deputado cearense Ciro Gomes. Um jogo de risco. E a derrota colocaria no Palácio do Planalto um adversário espicaçado pela campanha, com gana e a raiva para remexer nas contas, denúncias e omissões de um governo que só agora anunciou o seu Plano de Aceleração do Crescimento, o PAC encalhado no Congresso. Obstruindo o caminho da oposição, a montanha da inabalável popularidade de Lula, com milhões de votos cativos do Bolsa Família e do pacote de projetos sociais e o carisma da sua biografia. Daqui até 2010, na arrancada para a decisão, tudo ou nada pode acontecer. Mas, até lá, o terceiro mandato para Lula continuará agitando os pesadelos da oposição e o sono das ambições de um enrustido com a fralda da camisa à mostra. Quem resiste ao ímã do poder? E é tão fácil ceder ao apelo popular. Basta uma frase. "Levai-me convosco", proclamou Getúlio, em 1950, ao deixar o exílio voluntário de cinco anos na solidão dos pampas, para a volta triunfal nos braços do povo. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, outubro 31, 2007
Villas-Bôas Corrêa : Uma pedra em cima, por enquanto
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