Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 18, 2007

FERNANDO GABEIRA

A crise depois da outra

ESTA CRISE QUE explode agora no sistema financeiro me fez lembrar uma reunião em Nova York, sobre a qual li no passado. Era uma reunião sobre o aquecimento global. Os representantes das empresas de seguro disseram, claramente, que tinham boas reservas, mas não agüentariam muitos desastres. Alguém pediu a palavra e disse: mas, se o setor de seguros cair, vai contaminar todo o sistema.
Desta vez, a crise foi nas hipotecas do setor imobiliário americano.
Expandiu-se, rapidamente, e acabou contaminando o sistema financeiro, num nível e numa extensão que ainda não podemos prever.
O que podemos apenas é desejar que seja rápida e superficial.
O Brasil se diz bem, com todas as suas divisas guardadas, com as contas com o FMI pagas antecipadamente, com os bancos lucrando o dobro dos norte-americanos. Enquanto aqui lucram pouco mais de US$ 14 por US$ 100, os americanos ganham pouco mais de US$ 7 por US$ 100.
O governo sente-se seguro com a crise área, porque atingiu apenas a classe média. Enquanto o drama aéreo se desenrolava, vi, angustiado, os contornos do que pode ser um grande problema. Eram as imagens de hospitais de Pernambuco, com os doentes jogados no chão como se estivessem numa enfermaria de guerra.
Com gasto diário de R$ 1,30 por habitante, estamos construindo, lentamente, a crise de amanhã. O que aconteceu em Pernambuco foi um alerta para todo o país. O problema já se estendeu para outros Estados do Nordeste e coloca em xeque, de novo, a nossa capacidade de previsão e, em última análise, a nossa capacidade de alterar a realidade.
Tudo isso acontece num momento em que se vota a CPMF. A primeira vez que a aprovamos foi a pedido do ministro Adib Jatene. Havia um semi-apagão na saúde.
Depois de tantos anos de CPMF, constata-se que nada adiantou para o setor. Era apenas mais dinheiro para o governo. Num mundo em que se discute, antecipadamente, os efeitos do aquecimento global no sistema financeiro, a frieza com que a mídia viu, nesta semana, a manifestação pela saúde indica que em matéria de previsão estamos todos acomodados.
Sou mestre em enganos, mas a crise aérea já a sentia antes do desastre do Gol. Assim como desejo que a crise financeira seja rápida e rasteira, resta esperar que a da saúde seja apenas uma ilusão. As imagens das enfermarias de Pernambuco foram mostradas em tempo de muita concentração no desastre aéreo. Eram comoventes, e acho que vale a pena nos batermos para que não mais aconteçam.


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