Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 07, 2007

Dora Kramer - Quanto pior, tanto melhor




O Estado de S. Paulo
7/8/2007

O PT andava encolhido, sem argumentos de defesa - por avaliar nas internas que o governo errava feio na demora em solucionar a crise aérea - e sem disposição para o ataque, dada sua condição de partido oficial, cuja tarefa primeira é a de sustentar politicamente o presidente Luiz Inácio da Silva, a quem deve sua sobrevivência.

Logo após o acidente com o Airbus da TAM, o partido segurou a respiração: queria aguardar os resultados das primeiras pesquisas para ver se a popularidade do presidente Luiz Inácio da Silva seria ou não abalada.

Deu alguns passos para fora da toca a fim de tomar as dores de Marco Aurélio Garcia; depois para desqualificar os movimentos de protesto e vaias como “coisa de ricos enfadados” e, enquanto ganhava tempo até a divulgação da primeira pesquisa, mais uma vez arrumava briga com a imprensa.

Mesmo assim, foram manifestações pontuais, da Executiva, de um dirigente ou outro, um parlamentar aqui, outro ali. A representação no Congresso e o partido como um todo aguardavam a direção para onde os ventos soprariam. Estavam, na expressão de um deputado petista, “mascando chicletes” - falando por falar, mexendo a boca sem dizer nada de objetivo em termos de ação.

Com a pesquisa de domingo dando conta da manutenção dos índices de popularidade de Lula entre os mais pobres, o PT animou-se.

Voltou a achar que pode mesmo cumprir a promessa feita outro dia por Lula em um de seus discursos e “dar uma surra” na oposição nas eleições de 2008 e 2010 e retomou o projeto de abrir espaço a mudanças constitucionais que permitam um terceiro mandato subseqüente ao atual para Lula por meio da proposta de convocação de uma Assembléia Constituinte exclusiva para tratar de reforma política.

Reforma esta que, quando tratou de assuntos como voto em lista, fidelidade e financiamento de campanhas, o PT ajudou os outros partidos a enterrar recentemente na Câmara. Reforma esta que, quando se trata de cumprir a interpretação do Tribunal Superior Eleitoral da perda de mandato aos trânsfugas partidários, recebe do PT e de quase todos os outros a mais absoluta indiferença.

Não é mera coincidência a recuperação do tema junto com a pesquisa, da mesma forma como não foi por acaso a referência feita por Lula outro dia em Cuiabá à sua capacidade de pôr gente na rua em resposta à mobilização dos insatisfeitos por ora atuante sob o guarda-chuva do movimento “Cansei”.

O PT tinha uma avaliação de que não precisava dar grande atenção aos efeitos eleitorais da crise aérea porque vivia a sensação de que “o grosso” da população achava que o caos nos aeroportos era problema “de rico”.

E os pobres, mesmo vendo pela televisão os efeitos da inação do governo, não davam muita importância a isso porque estão perfeitamente acostumados com o descaso do poder público.

Confusão, maus tratos e incompetência não são novidade para quem está acostumado a passar quatro horas por dia espremido nos ônibus, a esperar meses por uma consulta no sistema único de saúde, a viver em condições subumanas nas periferias, a cursar - quando cursa - escolas desmanteladas (física e pedagogicamente falando), a freqüentar rodoviárias imundas e desorganizadas, a transitar por estradas esburacadas, a conviver com a bandidagem, a droga e a violência policial praticamente dentro de casa.

Isso, numa visão corrente dentro do PT, explicaria a manutenção dos índices de aceitação de Lula. Havia, no entanto, o receio de que o acidente de 17 de julho pudesse ter introduzido um fator de comoção na avaliação popular e a aceitação despencar.

Digamos que seja esta uma lógica conservadora e, para usar os parâmetros do próprio PT, “de direita”, pois considera que, se tudo é ruim para a maioria, quando fica péssimo para a minoria a situação não se altera porque todos se tornam companheiros na desgraça. É, em termos de expectativa de bem-estar do cidadão, uma adaptação cruel e eleitoralmente auto-referida, do velho lema: quanto pior, tanto melhor.

Cuba (libre?)

O Brasil, sempre tão hospitaleiro com estrangeiros interessados em buscar abrigo por aqui e condescendente com criminosos que vivem anos a fio entre nós ao arrepio das leis de seus países, não resta dúvida, agiu com eficiente suspeita ao prender e repatriar os pugilistas cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara.

Se os esportistas, como se alegou, foram embora por livre e espontânea vontade, por que prendê-los, por que isolá-los do acesso à imprensa, por que não deixar que explicassem suas razões?

Se estavam ansiosos para voltar, por que se separaram da delegação cubana do Pan-Americano?

A história deles está, no mínimo, mal contada. Terão validade zero quaisquer declarações que os dois venham a fazer quando já sob a jurisdição de Fidel Castro. Uma vez lá, dificilmente se poderá saber de fato qual terá sido o destino de ambos.


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