Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Míriam Leitão - Visões do trabalho




O Globo
1/2/2006

O mercado de trabalho será determinante para se saber para onde a economia vai este ano. Até agora, os dados são bons e mostram que está havendo recuperação de massa de salário real, emprego formal e pessoal ocupado. Isso ocorreu em 2005 e continuará a acontecer este ano. Mas há sinais preocupantes quando os dados são desagregados ou quando a avaliação é feita dentro das empresas.

O Departamento de Estudos e Pesquisas do Bradesco divulgou uma avaliação apostando que o mercado de trabalho vai repetir em 2006 o crescimento e as boas notícias de 2005. “Comparado com dezembro de 2004, o rendimento real cresceu 5,4%, o que se trata da maior taxa de crescimento na comparação anual desta nova pesquisa. Além disso, melhorou a qualidade do emprego com o maior crescimento do emprego formal”, diz o relatório.

O economista José Roberto Mendonça de Barros tem uma avaliação menos positiva:

— As empresas estão acelerando o turn over , dispensando os que estão há três ou quatro anos na companhia e contratando pessoas com a mesma qualificação, mas com salários 20% a 25% mais baixos.

Um dado que mostra isso é que, na Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, o rendimento real dos trabalhadores com carteira cresceu só 0,7%, dos sem carteira, 13% e, dos por conta própria, 11%.

José Roberto diz que as empresas, até setembro do ano passado, achavam que o câmbio estava temporariamente neste nível baixo, mas agora passaram a considerar, em seus planejamentos estratégicos, este nível como permanente. Diante disso, estão tomando decisões que podem afetar o mercado de trabalho:

— Aumentou muito o percentual importado nos produtos feitos pelo Brasil. Isso não é ruim necessariamente, mas muito do que está chegando vem da China, com um preço baixíssimo. É melhor para a empresa importar a esse preço e a esse câmbio, reduzir a produção local de componentes e fazer um turn over de funcionários para reduzir o custo de mão-de-obra, reequilibrando a relação câmbio/salário — avalia.

A análise feita pelo Departamento Econômico do Itaú também é que o ano passado foi bom para o mercado de trabalho, mas, segundo ele, já há sinais de desaceleração da criação de empregos nos últimos meses de 2005. “A desaceleração econômica costuma atuar com defasagens mais longas no mercado de trabalho do que nos níveis de produção. E os indicadores mais recentes de emprego na indústria do IBGE e da CNI mostram um quadro de estagnação das contratações, sendo um possível reflexo da desaceleração do crescimento do PIB em 2005”, registrou o Banco Itaú.

O aumento do salário-mínimo vai elevar a massa salarial no ano, em 2006, em 5,3%, no cálculo do economista José Roberto Mendonça de Barros, e isso vai produzir um impacto positivo no consumo, mas o que preocupa o economista é que os investimentos estão minguando, mostrando que não há possibilidade de ocorrer, a curto prazo, uma retomada do crescimento do mercado de trabalho de forma sustentável.

Já o Bradesco espera em 2006 “mais um ano favorável para o emprego e a renda”. As estimativas são de aumento de 3% do emprego; 2% no rendimento real e 5% na massa real de salários e nova queda na taxa anual de desemprego, mesmo que haja um aumento da taxa agora no começo do ano.

— Quando os dados são desagregados, os números são bem menos simpáticos. Onde aumentou o rendimento foi nos serviços ligados ao setor público, e isso tem um lado preocupante porque pode representar aumento do gasto público — alerta José Roberto.

Mesmo quem está mais pessimista acredita que haverá melhora no mercado de trabalho, mas ninguém está entusiasmado. O que os dados mostram é que a economia começou o ano num ritmo baixo, com queda de investimento e previsão de crescimento modesto. Mesmo crescendo mais do que no ano passado, não será vantagem porque 2005 foi decepcionante. É difícil acreditar num mercado de trabalho se expandindo de forma relevante num ano que começa morno.

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