O Brasil está se afogando num copo d’água. Entrou nesta crise com vários pontos fortes, mas ontem estava na absurda situação de ser o mercado mais afetado por todos os indicadores. Alguns reflexos, como na bolsa, aconteceriam, mas os impactos estão sendo maiores pela desastrada condução da crise.
Risco Brasil na altura dos 700 pontos. Pior: as pessoas começam a se perguntar pela saúde dos bancos.
O primeiro erro foi acreditar que as reservas altas e o fato de ser credor líquido nos tornavam uma fortaleza inexpugnável. A Coréia também é credora líquida e está com problemas. Nos momentos de pessimismo, o mercado cobra a conta de todos os erros e desequilíbrios macroeconômicos, aos quais, antes, não prestava atenção. Passa ao comportamento oposto: exagera a preocupação com cada detalhe.
Há também o efeito da economia globalizada. Administradores de carteira do mundo inteiro analisam os vários países como se fossem apenas peças de uma mesma engrenagem. E assim distribuem seus investimentos, tomando decisões rápidas e aleatórias.
É por isso que uma medida intempestiva como a de quarta-feira, em que o governo brasileiro baixou uma medida provisória permitindo a bancos públicos comprar bancos privados e uma financiadora pública do mercado imobiliário comprar construtoras, deu a impressão de que havia alguma informação sonegada do país. Analistas do mercado financeiro, daqui e de fora, perguntaram-se se não estariam desconhecendo algum grande problema que só o governo sabia. Essa insegurança é o que detona as ordens de compra.
O Brasil, ao fim da quartafeira, tinha visto seu risco disparar, os juros futuros pularem a 190 pontos de momentos de crise, e um novo circuit breaker na bolsa.
Se o mundo está instável, visitando freqüentemente o pânico, o melhor é não fazer marola — aqui, sim, a palavra se aplica.
O Banco Central tomou várias decisões certas nesta crise, ao ampliar o compulsório, vender reservas, vender linhas de financiamento externo, fazer leilão de reservas com destinação definida para as empresas exportadoras. A lista de acertos é longa. Mas, sobre os bancos pequenos e médios com problemas de liquidez, o melhor seria prover liquidez, e não levantar a idéia de que tenham de ser comprados.
Como as autoridades do Ministério da Fazenda sabem, ou deveriam saber, confiança é tudo no mundo das finanças. E confiança é algo que se quebra com extraordinária facilidade. Depois de quebrada, como nos cristais, é difícil ser recomposta. O excesso de idéias criativas pode passar a errônea impressão de que existe uma crise profunda no setor bancário brasileiro.
Se o problema é que o dinheiro do compulsório não está chegando aos bancos menores, é preciso fazer funcionar o interbancário.
Dando garantias, por exemplo. Mas se não há problema de solvência, por que dar a impressão de que bancos públicos precisam resgatálos? Ministros da Fazenda não pronunciam a expressão “bancos quebrando” nem mesmo na negativa.
A frase pode ser entendida pelo seu oposto.
Medidas anunciadas pelo governo tarde da noite, ou em bases diárias, não dão a impressão de governo atento.
Passam a idéia de que está acudindo emergências.
A economia brasileira tem vários problemas. Aqui nesta coluna temos falado deles há tempos. Neste momento, o mais agudo é o dos prejuízos das grandes empresas com derivativos cambiais. É urgente que o governo tenha um diagnóstico preciso da dimensão do problema. Não deveria ficar esperando os balanços para saber, porque eles não dirão tudo. Até porque, quanto mais o dólar subir, mais grave é o problema. As empresas fizeram opções que vencem a cada virada de mês. O que significa que, na entrada de novembro, poderá haver mais empresas com problemas.
Mesmo as não expostas em derivativo cambial têm problemas a enfrentar. As conversas que Alvaro Gribel, do blog, Leonardo Zanelli, da coluna, e eu estamos tendo com os diversos setores estão mostrando várias dificuldades.
O setor petroquímico, por exemplo, teme o que possa vir a acontecer com a mistura de recessão mundial e alta do dólar. Eles produziram matéria-prima para insumos agrícolas num cenário de boom da produção de alimentos.
Agora, a agricultura planta num cenário de recessão.
Eles estão construindo armazéns infláveis para estocar uréia.
A Abinee não consegue definir preço de produtos eletroeletrônicos, porque o dólar está oscilando há 40 dias. Qualquer erro pode deixar o produtor com prejuízo ou produção encalhada.
Já a Eletros, outra associação do setor, diz que, para alguns produtos, já houve reajustes de até 10%.
E que há uma queda de 10% nas expectativas de vendas em outubro.
Entrevistei ontem o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que me deu notícias boas. A empresa fez seu planejamento de geração de caixa com um petróleo a US$ 35. E garante que não fez aplicação em derivativos cambiais.
Cada decisão das autoridades econômicas deve ser bem pensada neste momento.
O tempo não comporta erros.
Entrevista:O Estado inteligente
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