Países de todo o mundo soltam mais pacotões a fim de evitar glaciação econômica; aqui, BC vive epidemia de bom senso |
MESMO DEPOIS de trilhões de socorro a bancos e empresas, governos do mundo inteiro continuam a raspar o fundo do tacho a fim de evitar mais desastre.
Queimam a casa no inverno a fim de colocar lenha na fogueira, pois o risco é de hipotermia econômica. Além do problema do congelamento de crédito, agora o rumor geral é sobre o risco de deflação, coisa bastante feia, que decorre do congelamento de gastos, mas que, porém, pode acabar aumentando o peso de dívidas, realimentando as crises de agora.
A taxa de juros nos EUA pode ir a zero. Ontem, a meta da taxa "básica" dos EUA foi a 1%. A taxa básica de fato está abaixo disso faz tempo, e a taxa real caiu abaixo de zero há meses.
Ontem, o FMI criou um cheque especial para países bem comportados e que estejam "enfrentando problemas temporários de liquidez". O Fed, o BC dos EUA, abriu ontem o cofre até para países mais periféricos, mas bem comportados, como Brasil, México, Cingapura e Coréia.
A China cortou os juros pela terceira vez em seis semanas. O Japão deve cortar sua taxa quase inexistente para 0,25% amanhã. O BC europeu e o da Inglaterra devem talhar as suas na semana que vem.
O Congresso dos EUA discute um novo pacote fiscal para novembro. O morto vivo governo Bush elabora um pacote para salvar os americanos que estão para perder as casas. O governo "soi disant" liberal da França (liberal-mercantilista) vai adotar políticas dos socialistas para estimular a economia e até para criar empregos (vai subsidiá-los!).
O de fato liberal governo do Reino Unido (dito trabalhista) pretende rever a lei de responsabilidade fiscal lá deles e vai estourar limites de endividamento a fim de estimular a economia. Etc., etc., etc.
Em meio ao desespero geral, viu-se outro exemplo de que uma epidemia de bom senso assola o Banco Central do Brasil faz uns dois anos.
O BC deixou os juros onde estavam.
Não quer dizer que não vejam risco de inflação ou que queiram "estimular a economia". O problema é que não se enxerga nada adiante, dados o fog do inverno econômico e as tormentas da volatilidade.
Parar para pensar era a melhor atitude. O BC, recorde-se, já não havia dado sinais de histeria com o risco de aumento de inflação em 2007.
Esperou sinais mais concretos para agir. Pouco? Lembrem-se do início do governo Lula, quando o BC elevou os juros de 26% para 26,5%, gorjeta e salamaleque para o mercado, medida na prática irrelevante e, no fim das contas, uma das mais ridículas da história do "central banking".
E daí? Bem, está difícil de dar sentido ao jorro de medidas. Para ficar no nosso quintal, as últimas notícias mudam bastante o que vinha se dizendo sobre câmbio (inclusive nesta coluna). O Fed ofertou US$ 30 bilhões ao BC brasileiro. As novas linhas de crédito para outros emergentes aliviam muitas tensões e riscos de quebras. Isso pode mudar o panorama da crise das moedas, no curto prazo. Mas a liquidação de dívidas, a desalavancagem, a seca de crédito, o aumento do risco dos emergentes, a redução do comércio mundial e a provável redução do investimento externo no Brasil devem manter a pressão sobre o câmbio e devem cortar o crescimento pela metade em 2009. O resto é nuvem.