Turismo
De sofá em sofá
Um site conecta gente que quer viajar a gente que quer
hospedar – ainda que as acomodações não sejam lá essas coisas
Kalleo Coura
Roberto Setton |
SEMPRE CABE MAIS UM Azevedo (de amarelo) e seus atuais cinco hóspedes: da esq. para a dir., um casal francês, um indiano e um casal carioca |
Como a maioria das boas idéias, essa surgiu de uma combinação do acaso com a necessidade. O acaso se deu quando o programador de computadores americano Casey Fenton, navegando pela internet, deparou com uma passagem para a Islândia que era uma pechincha – e decidiu aproveitar o fim de semana para visitar o país. Como não conhecia ninguém lá, resolveu enviar 1 500 e-mails para estudantes de uma universidade da capital, Reykjavik, contando quem era e perguntando se não poderiam hospedá-lo. Em menos de 24 horas, recebeu mais de cinqüenta ofertas e embarcou naquela que diz ter sido uma das melhores viagens de sua vida (ainda que nem de longe a mais confortável, já que seu quarto era a garagem da anfitriã). Assim nasceu o CouchSurfing, uma rede baseada na internet e destinada a conectar gente que quer viajar a pessoas dispostas a recebê-las (o endereço é www.couchsurfing.com). A expressão, que em tradução literal significa "surfe no sofá", é uma gíria usada por estudantes americanos para se referir ao costume de hospedar-se, de forma improvisada, na casa de alguém. Criada por Casey e amigos em 2004, ela já atinge 231 países e tem perto de 800 000 usuários, mais de 17 000 deles brasileiros.
O assistente de direção Alberto Azevedo, de 25 anos, já dormiu em dezoito sofás de cinco países e hospedou mais de oitenta pessoas em seu apartamento em São Paulo. É do tipo que gosta de guiar o visitante pela mão. "Faço questão de levar os estrangeiros a restaurantes típicos e apresentar a eles feijoada, caipirinha e guaraná." Azevedo diz manter contato com pelo menos metade de seus ex-hóspedes – e é justamente essa uma das idéias da rede. "Ela não existe só para ajudar viajantes a encontrar um lugar de graça para dormir", afirma um de seus co-fundadores, o também americano Daniel Hoffer. "A proposta é dar condições para que pessoas de culturas diferentes se conheçam e façam novas amizades." A estudante de economia Luciana van Tol, de 23 anos, viajou por meio do CouchSurfing por dezessete países da Europa em quatro meses. "O único lugar em que fiquei em albergue foi Istambul", conta. "Visitei os principais pontos turísticos, mas não me sentei à mesa nem conversei com uma família turca. Por causa disso, sinto que só passei por lá – não conheci a Turquia tão profundamente como os países em que me hospedei na casa de alguém", diz.
O CouchSurfing não se responsabiliza pela segurança dos usuários, mas oferece alguns instrumentos pa-ra ajudar a aumentá-la, além dos comentários que os próprios viajantes deixam no site a respeito de suas experiências com outros usuários. Por 13 dólares, por exemplo, o candidato a hóspede ou anfitrião pode ganhar um atestado emitido pelo site garantindo que seu nome e endereço são verdadeiros. Essa espécie de "selo de autenticidade" aumenta sua credibilidade e, conseqüentemente, sua chance de receber ou de ser recebido. De 2004 para cá, mais de 700 000 hospedagens ocorreram por meio da rede. Em alguns casos, o entendimento entre hóspede e anfitrião supera tanto as expectativas que um acaba se mudando em caráter permanente para a casa do outro. No ano passado, a agente de turismo Cláudia Pedroso, 36 anos, foi recebida pelo italiano Gianluca Iorio, de 35, em Florença, para uma estada de quatros dias. A visita virou casamento. "Nas conversas pela internet, já havia percebido que tínhamos muito em comum", afirma Iorio. Neste mês, o casamento completa um ano e as fotos do casal só não ilustram esta reportagem porque Iorio, que se mudou para o Brasil, levou Cláudia à Itália para visitar seus pais. Eles voltam nesta semana para o apartamento de Cláudia, no Rio. E já colocaram o seu sofá à disposição dos viajantes do mundo.
Foto Otavio Dias de Oliveira