Milhares de processos já tramitam nas diferentes instâncias do Judiciário e o número deve crescer muito até o início do próximo ano. Isto porque o caso já foi julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e tanto esta Corte quanto as instâncias inferiores da Justiça Federal e da Justiça estadual tomaram decisões contrárias às instituições financeiras, firmando jurisprudência que as obriga a pagar a correção reivindicada pelos poupadores.
O problema começou quando o Plano Verão mudou o índice de correção das cadernetas. Antes dele, vigorava o Índice de Preços ao Consumidor (IPC/IBGE), que aumentou 42,72% em janeiro de 1989. A medida provisória que instituiu o Plano, mais tarde convertida na Lei nº 7.730, determinou que, nesse mês, o saldo das cadernetas deveria ser corrigido pela Letra Financeira do Tesouro Nacional (LFT), cuja variação foi de 22,35%. É essa diferença de correção no saldo das cadernetas, mais juros e a correção dos últimos 20 anos, que os poupadores reivindicam.
Em sua defesa, os bancos alegam que apenas cumpriram o que determinava a legislação baixada na época pela equipe econômica do governo do então presidente José Sarney. Mas, como as instâncias inferiores da Justiça não aceitaram esse argumento, reconhecendo o direito adquirido dos poupadores à correção pelo IPC/IBGE, as instituições financeiras agora estão lutando em duas esferas. A primeira delas é política. Os bancos querem que a Advocacia-Geral da União (AGU) entre no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Esse recurso suspende todas as ações em andamento nas instâncias inferiores até que a Corte tome uma decisão de mérito, encerrando o caso.
Os advogados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) alegam que, como seis ministros já teriam votado em favor da tese de que o Estado tem a prerrogativa de regular o "regime monetário", dispondo de competência para alterar índices de correção de investimentos, a tese do "direito adquirido" dos poupadores poderia ser derrubada e o caso poderia ser encerrado em caráter definitivo com vitória das instituições financeiras. Além disso, como diz o ex-ministro Delfim Netto, em sua coluna no jornal Valor, o pagamento das ações perdidas pelos bancos poderá afetar seu patrimônio e sua higidez, fragilizando-os num momento de crise econômica mundial.
O chefe da AGU, José Antonio Toffoli, já manifestou a disposição de ajuizar o recurso pedido pela Febraban. Mas, como a iniciativa pode levar a sociedade a entender que o governo estaria favorecendo os banqueiros, em detrimento dos poupadores, há no Palácio do Planalto quem defenda a tese de que o Poder Executivo não deveria interferir nesse litígio.
Para pressionar o governo, a Febraban lembra que 45% das ações do Plano Verão são contra a Caixa Econômica Federal. A entidade afirma que, se os bancos forem derrotados no Supremo, eles acionarão a União para cobrar os R$ 100 bilhões.
A outra frente de luta da entidade é no campo judicial. Se a AGU não impetrar a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental que reivindicam, os bancos pretendem entrar com um pedido de liminar no Supremo, o que lhes permitiria adiar a decisão do litígio para um futuro distante, como aconteceu com o Plano Real, cujas ações estão suspensas desde 2006. O problema é que mais dia menos dia o STF terá de julgar a questão e, aí, o valor da causa estará muito acima dos atuais R$ 100 bilhões.
O litígio sobre os prejuízos causados aos poupadores pelo Plano Verão é mais um "esqueleto" deixado pelos antigos pacotes econômicos. Ao manipular índices de correção monetária, impor "tablitas" e intervir em atos juridicamente perfeitos, eles tiveram a violência jurídica como denominador comum. E a conta dos equívocos legais cometidos no passado tem de ser paga agora.