O ex-banqueiro Salvatore Cacciola é
extraditado e pode esclarecer escândalo
Ronaldo Soares
Eduardo Naddar/Agif/Folha Imagem |
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Na quinta-feira da semana passada, o ex-banqueiro Salvatore Cacciola desembarcou no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, após vinte horas de uma viagem iniciada no principado de Mônaco, com escalas em Nice e Paris. Era o fim de uma batalha judicial pela extradição do ex-banqueiro que se arrastou por dez meses. Nesse período, ele ficou preso em Mônaco. No Rio, seu destino foi o complexo penitenciário de Gericinó, na Zona Oeste. Pivô do mais grave escândalo financeiro da farta crônica do gênero no Brasil, Cacciola ficou foragido por oito anos, beneficiado pela cidadania italiana. Ele foi detido no Rio Grande do Sul em 2000, mas passou pouco mais de um mês atrás das grades. Ao fim desse período obteve um habeas corpus. Quando a Justiça mandou prendê-lo de novo, descobriu que ele havia fugido para a Itália, onde sua cidadania o livrava da extradição. A vida boa acabou quando, certo da impunidade, resolveu passear em Mônaco. Acabou preso pela Interpol.
Ed Ferreira/AE |
Francisco Lopes, ex-presidente do BC: condenado |
O escândalo protagonizado por Cacciola não se destaca apenas pelas cifras envolvidas. Trata-se de um caso único pela circunstância e pelas suspeitas de vazamento de informações no Banco Central. No caso Marka/FonteCindam, como o episódio se notabilizou, a autoridade monetária ficou sob fogo. Uma operação de socorro a dois bancos pequenos custou 1,6 bilhão de reais aos cofres públicos e foi feita com a justificativa discutível de que se tentava prevenir com isso uma "crise sistêmica". Na turbulência de 1999, que resultou na desvalorização do real, os bancos Marka, de Cacciola, e FonteCindam, de Luiz Antônio Gonçalves, haviam apostado na manutenção da política de câmbio. Só não quebraram porque o Banco Central os socorreu, alegando ter sido alertado numa carta da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) para o risco que o fechamento das duas instituições representaria para o sistema financeiro. Descobriu-se, depois, que se tratava de uma farsa, já que o documento havia sido encomendado pelo próprio BC, a posteriori, para justificar a ajuda. Além de Cacciola, foram denunciadas dez pessoas, sete das quais condenadas: o ex-presidente do Banco Central Francisco Lopes e outros três ex-diretores do órgão – Tereza Grossi, Cláudio Mauch e Demosthenes Madureira de Pinho Neto –, Luiz Antônio Gonçalves, Luiz Augusto Bragança, consultor do Marka, e Roberto Steinfeld, do FonteCindam.
Cacciola sempre ameaçou contar detalhes do episódio e revelar o nome de outros envolvidos no esquema. Chegou a chantagear o governo, conforme VEJA revelou em 2001. O ex-banqueiro havia feito grampos ilegais para provar a existência de um esquema de vazamento de informações no BC – do qual ele próprio foi cliente. Depois usou as gravações para tentar salvar sua pele. Se ele tem realmente algo a dizer, terá agora a oportunidade de fazê-lo, já que deverá ser novamente interrogado na Justiça. Ao desembarcar no Rio, Cacciola estava bem à vontade. Deu até entrevista coletiva. Ele reclamou que os outros réus no processo que o condenou estavam respondendo em liberdade. Nenhuma menção a uma diferença essencial em relação aos demais envolvidos: ele foi o único que fugiu.