A Operação Satiagraha pode surpreender pelo nome, ou melhor, pela estranha predileção da Polícia Federal (PF) por termos exóticos para batizar as suas investigações de grande ressonância - este, do sânscrito, significando "firmeza na verdade", era um dos conceitos costumeiros das pregações do Mahatma Gandhi. Mas é de duvidar que alguém, ao menos entre os brasileiros habituados a ler jornal, tenha se surpreendido com os nomes dos três principais alvos da operação, dos 24 cuja prisão foi decretada por um juiz criminal de São Paulo, Fausto de Sanctis. Afinal, não é de hoje que, por uma penca de motivos, o banqueiro Daniel Dantas, o especulador Naji Nahas e o ex-prefeito paulistano Celso Pitta freqüentam a crônica policial, e todos têm "fichas sujas". Tampouco surpreende a promiscuidade do dinheiro fraudulento com a política, ou vice-versa, para a qual a contribuição do trio não pode ser subestimada, variando apenas as peculiaridades dos delitos identificados pelos federais.
Ora cada um por si, como líderes de duas "organizações criminosas", ora mantendo "negócios pontuais conjuntos", apurou a PF, Dantas, o voraz wheeler-dealer do Banco Opportunity e das teles, e o ladino Nahas, que certa vez conseguiu quebrar a Bolsa do Rio, respondem por um dos maiores esquemas de evasão de divisas e lavagem de dinheiro já flagrado no País, acusados de movimentar somas monumentais de origem ilícita. Só pelo Opportunity Fund, teoricamente vedado a brasileiros, passaram quase US$ 2 bilhões em 10 anos. E o escolado Pitta - "pé-de-chinelo" em comparação com os outros dois - recorria a Nahas para expatriar ou repatriar recursos clandestinos. Além de tráfico de valores e branqueamento de dinheiro manchado, as acusações falam em corrupção ativa, formação de quadrilha, crime contra o sistema financeiro, operação ilegal de instituição financeira, gestão fraudulenta, concessão de empréstimos vedados e uso indevido de informação privilegiada.
A grande surpresa é que o desvendamento dessas falcatruas remonta a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), desmentindo as expectativas de que tais investigações acabam em pizza. Em abril de 2006, o deputado paranaense Osmar Serraglio, relator da CPI dos Correios, propôs o indiciamento de Daniel Dantas, a partir da descoberta de que duas empresas controladas por ele pagaram R$ 152,4 milhões a Marcos Valério Fernandes, o operador do mensalão. Ajudando a financiar a compra de congressistas para votarem com o Planalto, Dantas imaginou que os seus negócios seriam recompensados pelo governo petista. "Quase logrou êxito em sua empreitada", anotou Serraglio, "não fosse a brusca guinada política, provocada pela revelação do esquema." Pouco depois, com o desdobramento do inquérito do mensalão, a Polícia Federal, acionada pela Procuradoria-Geral da República, tratou de puxar os outros fios da meada - um trabalho de primeira, como se vê.
Mas, para variar, os federais tinham de meter os pés pelas mãos. O convite à Rede Globo para registrar o momento da prisão de um estremunhado Celso Pitta, pouco antes do amanhecer da terça-feira, revela que a PF continua a cultivar a "espetacularização", como diz o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. A responsabilidade do diretor-geral do órgão, Luiz Fernando Corrêa, e do delegado Protógenes Queiroz, condutor da Operação Satiagraha, são inegáveis. Outro abuso foi o pedido de prisão da jornalista que em abril último revelou a investigação em curso. A PF queria também fazer uma busca e apreensão na sua casa. Não obteve nada. "Ainda bem que o juiz negou, se tivesse aceito seria um absurdo", reagiu o titular do STF. "Prender uma jornalista por revelar uma informação faz inveja ao regime soviético." A alegação de quebra de sigilo é simplesmente primária.
A repórter teria fornecido a advogados de Dantas o número da investigação a seu respeito. Se o fez, não cometeu crime algum. Diferentemente de processos que correm sob sigilo de Justiça, cujos autos são de conhecimento apenas dos envolvidos, uma vez revelada a existência de um inquérito - no caso, em razão de um vazamento da própria polícia -, a autoridade encarregada não pode esconder dos advogados do inquirido que ele está sob investigação por tais ou quais motivos. A PF que identifique o seu boquirroto e deixe de ser inquisitorial.
Ora cada um por si, como líderes de duas "organizações criminosas", ora mantendo "negócios pontuais conjuntos", apurou a PF, Dantas, o voraz wheeler-dealer do Banco Opportunity e das teles, e o ladino Nahas, que certa vez conseguiu quebrar a Bolsa do Rio, respondem por um dos maiores esquemas de evasão de divisas e lavagem de dinheiro já flagrado no País, acusados de movimentar somas monumentais de origem ilícita. Só pelo Opportunity Fund, teoricamente vedado a brasileiros, passaram quase US$ 2 bilhões em 10 anos. E o escolado Pitta - "pé-de-chinelo" em comparação com os outros dois - recorria a Nahas para expatriar ou repatriar recursos clandestinos. Além de tráfico de valores e branqueamento de dinheiro manchado, as acusações falam em corrupção ativa, formação de quadrilha, crime contra o sistema financeiro, operação ilegal de instituição financeira, gestão fraudulenta, concessão de empréstimos vedados e uso indevido de informação privilegiada.
A grande surpresa é que o desvendamento dessas falcatruas remonta a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), desmentindo as expectativas de que tais investigações acabam em pizza. Em abril de 2006, o deputado paranaense Osmar Serraglio, relator da CPI dos Correios, propôs o indiciamento de Daniel Dantas, a partir da descoberta de que duas empresas controladas por ele pagaram R$ 152,4 milhões a Marcos Valério Fernandes, o operador do mensalão. Ajudando a financiar a compra de congressistas para votarem com o Planalto, Dantas imaginou que os seus negócios seriam recompensados pelo governo petista. "Quase logrou êxito em sua empreitada", anotou Serraglio, "não fosse a brusca guinada política, provocada pela revelação do esquema." Pouco depois, com o desdobramento do inquérito do mensalão, a Polícia Federal, acionada pela Procuradoria-Geral da República, tratou de puxar os outros fios da meada - um trabalho de primeira, como se vê.
Mas, para variar, os federais tinham de meter os pés pelas mãos. O convite à Rede Globo para registrar o momento da prisão de um estremunhado Celso Pitta, pouco antes do amanhecer da terça-feira, revela que a PF continua a cultivar a "espetacularização", como diz o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. A responsabilidade do diretor-geral do órgão, Luiz Fernando Corrêa, e do delegado Protógenes Queiroz, condutor da Operação Satiagraha, são inegáveis. Outro abuso foi o pedido de prisão da jornalista que em abril último revelou a investigação em curso. A PF queria também fazer uma busca e apreensão na sua casa. Não obteve nada. "Ainda bem que o juiz negou, se tivesse aceito seria um absurdo", reagiu o titular do STF. "Prender uma jornalista por revelar uma informação faz inveja ao regime soviético." A alegação de quebra de sigilo é simplesmente primária.
A repórter teria fornecido a advogados de Dantas o número da investigação a seu respeito. Se o fez, não cometeu crime algum. Diferentemente de processos que correm sob sigilo de Justiça, cujos autos são de conhecimento apenas dos envolvidos, uma vez revelada a existência de um inquérito - no caso, em razão de um vazamento da própria polícia -, a autoridade encarregada não pode esconder dos advogados do inquirido que ele está sob investigação por tais ou quais motivos. A PF que identifique o seu boquirroto e deixe de ser inquisitorial.