Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 14, 2007

Suely Caldas - Interesse da Petrobrás ou interesse nacional?




O Estado de S. Paulo
14/11/2007

Se a intenção do governo é favorecer a Petrobrás, entendendo ser essa a melhor forma de defender o interesse nacional, é bom o presidente Lula parar, refletir com cuidado e recuar da decisão de mudar as regras da Lei do Petróleo que valerão para a megadescoberta de óleo no litoral de Santos. Se insistir em mudar a lei, não conseguirá uma coisa nem outra. Mas, se aprender com experiências recentes, aqui e em outros países, Lula vai concluir que mudar a lei do petróleo não é uma boa idéia e pode resultar exatamente no oposto da intenção. Vejamos por quê:

1) Dez anos depois, o balanço da abertura do mercado de petróleo é extremamente positivo para o País. Vieram para o Brasil mais de 60 empresas que, com ou sem parceria com a Petrobrás, encontraram novas e ricas jazidas de petróleo e gás, a produção e comercialização de óleo e derivados multiplicou, foram gerados milhares de novos empregos, criados centenas de cursos para atender à rápida expansão da carência de mão-de-obra especializada, cidades sob influência da economia do petróleo se modernizaram. Enfim, o fim do monopólio só trouxe prosperidade. Voltar a criar reserva de mercado só para a Petrobrás é marchar na contramão da prosperidade futura.

2) O fim do monopólio fez bem também à Petrobrás, obrigada que foi a modernizar a sua gestão, definir um plano estratégico que a colocasse na disputa com as grandes petrolíferas estrangeiras, tornar-se uma empresa verdadeiramente pública, com mais de 500 mil acionistas no Brasil e no exterior, e mais do que quintuplicou seu valor patrimonial.

3) Por estar situada 6 mil metros abaixo do nível do mar, onde estão depositados de 5 a 8 bilhões de barris de petróleo, a área de Tupi, na Bacia de Santos, vai exigir investimentos sofisticados e de custo extremamente elevado. Os próprios técnicos da Petrobrás reconhecem que o investimento financeiro só é viável e terá retorno com o preço do petróleo acima de US$ 60 o barril. Ficar o País dependente de uma única empresa para realizar investimentos tão caros para extrair o petróleo implica atrasar e reduzir o início da produção. A Petrobrás não tem condições financeiras de arcar sozinha. Além de recursos limitados, ela tem outras prioridades onde aplicá-los. E o atraso na exploração represa riqueza, renda e empregos, é um desserviço aos interesses do País e da população.

4) Outros países que já experimentaram as mudanças anunciadas ontem pela Agência Nacional de Petróleo estão revendo as suas regras exatamente para atrair empresas estrangeiras, expandir a produção de óleo e aproveitar os preços que já beiram US$ 100 o barril. Segundo o especialista em petróleo Adriano Pires, Angola está mudando a cláusula de partilha da produção (entre empresa exploradora e governo) para a de concessão, que vigora no Brasil. E o México está reformando o sistema que limita as empresas à prestação de serviços, justamente porque não tem atraído o interesse de investimentos estrangeiros. A decisão do governo Lula de alterar a Lei do Petróleo coloca o Brasil mais próximo da Bolívia e da Venezuela e na contramão do resto do mundo que busca crescimento econômico, desenvolvimento e progresso para a sua população. O governo de Evo Morales aboliu o sistema de concessão e adotou o de prestação de serviço para as empresas que exploram gás na Bolívia. Exatamente o quer agora o Brasil. As empresas não tiveram alternativa: acataram as novas condições impostas por Morales para tentar salvar o dinheiro aplicado, mas não voltaram a realizar nenhum investimento.

A Bolívia agora depende da Venezuela e das contrapartidas políticas exigidas por Hugo Chaves. Das empresas presentes na Bolívia, só a Petrobrás vai investir mais recursos porque depende do gás boliviano para suprir a sua demanda. Manter o sistema de concessão que vigora na lei brasileira não implica entregar para sempre o petróleo à empresa que detém o direito de exploração. A lei acabou com o monopólio da Petrobrás, mas não o da União. O óleo é retirado pela empresa, mas, se essa deixa de cumprir alguma cláusula do contrato de concessão, perde o direito de exploração e as reservas, guardadas no subsolo brasileiro, continuam pertencendo soberanamente ao País. Mas o governo Lula parece desconhecer esse detalhe.


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