Taxar exportações
A Argentina quer que o Mercosul adote o Imposto de Exportações de produtos agrícolas - como informa o jornal Valor, de ontem. É uma velha bandeira que segmentos da Fiesp e alguns economistas defendem, por motivos diferentes.
Esta coluna já tratou desse tema. Hoje, aponta os objetivos desse imposto, sempre diferentes, e mostra algumas conseqüências.
Antes do regime militar, lembra o ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, o Imposto de Exportação, mais conhecido como confisco, era cobrado pelos Estados. Seu objetivo era arrecadar. Com a reforma tributária de 1965, passou para a União. Sua função deixou de ser arrecadatória para ser regulatória: ajustar o comércio e o abastecimento.
Às vezes era importante taxar exportações de café para que o brasileiro não derrubasse os preços internacionais: quando as cotações saltavam, muito produtor ficava tentado a aceitar preços mais baixos e a taxação desestimulava esse jogo. Em ocasiões de forte alta no mercado internacional, as exportações de açúcar, de carne ou de café eram taxadas para que o produtor destinasse a mercadoria a preços mais baixos para o mercado interno.
Nos anos 80, o governo recorria a confiscos temporários quando das maxidesvalorizações da moeda nacional. Era ação destinada a reduzir receitas exageradas dos exportadores e, ao mesmo tempo, evitar parte do repasse da alta ao mercado interno.
Na Argentina, o Imposto de Exportações, mais conhecido como retención, tem dupla finalidade. Serve para garantir arrecadação (pesa 9,4% no total) e para inibir aumento de preços dos alimentos (especialmente da carne e do pão) no mercado interno.
É também um jeito de garantir câmbio alto (peso desvalorizado): o banco central compra dólares para puxar a cotação do dólar a 3,14 pesos e, ao mesmo tempo, confisca parte dos ganhos dos exportadores. Estes se conformam porque acabam lucrando mais com esse arranjo do que com o mergulho do dólar no câmbio interno, como acontece no Brasil.
Quem quer esse imposto no Brasil tem por objetivo evitar a valorização do real. A idéia é reter parte das receitas ainda em dólares e aplicá-las lá fora. Os argentinos impõem esse imposto em todas as exportações, mas, aparentemente, sugerem que no Mercosul alcancem só os produtos agrícolas, talvez porque estejam perdendo mercado para o Brasil, onde não há essa coisa.
Por aqui, vem sendo defendida como incentivo à agregação de valor: em vez de exportar matéria-prima, exportar produto transformado. Mas isso não faz sentido. Quem quer alimentar galinhas, quer milho e não farinha. Quem quer alimentar altos-fornos, quer minério de ferro e não tarugos.
E o minério de ferro é mais uma questão. Se é para taxar exportações de produtos primários, ficaria difícil deixar de fora minérios e petróleo, especialmente quando alguns setores do governo acreditaram na conversa de que o Brasil se tornará membro da Opep.
Essa gente pode estar pensando em novo aumento de arrecadação. E aí a conversa seria outra. Seria criar novo confisco não para regular o comércio, mas para atender à velha e insaciável voracidade fiscal.
Confira
Reforço de dose - Dia 7, o governo argentino aumentou as alíquotas do Imposto de Exportação dos produtos agrícolas entre 5 e 10 pontos porcentuais. O consultor Dante Sica avalia a receita adicional em US$ 1,4 bilhão por ano ou 0,5% do PIB.
Tem mais - No dia 15, foi a vez do petróleo e derivados. As alíquotas crescem de acordo com os preços. Devem dar arrecadação extra de US$ 1 bilhão ou 0,3% do PIB.
Brinde - É o presente de Néstor Kirchner para a esposa, presidente Cristina Kirchner, que toma posse em março.