O Estado de S. Paulo |
29/11/2007 |
A turbulência voltou, nesta semana, ao mercado financeiro internacional. Não chegou ainda à economia real, mas provocou novos temores de recessão. As bolsas, inclusive no Brasil, oscilam fortemente. Tudo isso levou o vice-presidente do Fed (banco central americano), Don Kohn, a admitir que os ganhos anteriores de normalização dos mercados foram perdidos nas últimas semanas. Mas ele acalmou um pouco os ânimos ao afirmar que o Fed está atento e vai analisar isso na reunião de 11 de dezembro. Esse pronunciamento e a promessa do próprio Fed, há alguns dias, de que oferecerá tanta liquidez quanto for necessária para dar suporte ao sistema financeiro, levou o mercado a entender que ele baixará o juro nessa reunião. Era quase unânime, ontem, a impressão de que essa redução seria de 0,50 ponto porcentual. Seguramente, tal decisão, se ocorrer, trará mais tranqüilidade, embora as oscilações bruscas e as tensões tendam a perdurar ainda por muito tempo, mais de um ano, de acordo com o secretário do Tesouro americano, Henry Paulson. Será um processo longo de reajuste. UM FUNDO DE DÍVIDA Este é, para nós, um cenário atípico. O que está acontecendo lá fora ainda não chegou ao Brasil, como temos dito nesta coluna. Enquanto EUA, Europa e Ásia já foram atingidos e lutam para evitar o pior, aqui tudo parece tranqüilo. A não ser na Bolsa, que sobe e desce, tudo parece bem. A economia continua sustentando um crescimento de 4,7% e até um possível 5%, o aquecimento da demanda interna se intensifica e há no ar uma espécie de antecipada alegria natalina. Chega-se até a anunciar um fundo soberano (do governo) para financiar investimentos, mas alimentado por compras de dólar do Tesouro - não do Banco Central - com a receita de venda de títulos, gerando maior endividamento. Queremos imitar a China e os Emirados Árabes, entre outros, que estão investindo bilhões de dólares no Ocidente. Sem dúvida, uma ousadia perigosa e inoportuna, pois o cenário externo, vivendo um clima de instabilidade crescente e perigosa, não nos dá nenhuma segurança. Está tudo bem, aqui, mas não somos uma ilha de estabilidade num mar de incerteza. BRASIL PRECISA DE CAUTELA A correspondente do Estado em Nova York, Nalu Fernandes, registrou ontem declarações da diretora de rating da Standard & Poor’s, Lisa Schineller, alertando o Brasil para evitar complacência com as políticas fiscal e monetária. Essa seria a pior hora para mudar o que está dando certo, principalmente, porque são essas políticas que reconquistaram a confiança do investidor externo. Mas o que poderá acontecer se a política econômica mudar? Para Lisa, poderá haver uma aversão dos investidores externos até agora interessados no Brasil. Nuno Camara, do Dresdner Kleinwort, afirma que, pela primeira vez neste ano, o investidor está preocupado com o Brasil. A analista prevê que devemos passar de um superávit de US$ 9 bilhões em conta corrente, este ano, para um déficit de US$ 2,8 bilhões em 2008. A coluna se estendeu sobre o tema porque é importante mostrar que a turbulência financeira internacional está nos afetando, sim, quer pelo menor crescimento das exportações, redução de investimentos financeiros (não os diretos, menos afetados, que se contentam com a demanda interna); o significativo aumento das importações e a, no mínimo, delicada valorização do real. Está tudo turvo, inseguro, sombrio para bravatas e ousadia infundadas. CUSTA CARO CRESCER Nesse período de semiabundância, parece que empresários e, principalmente, governos não compreenderam que um crescimento auspicioso de 5% este ano e nos próximos anos tem custo elevado. Mesmo com alguns valores mais elevados, os investimentos privados e oficiais (esses quase nulos) ainda são escassos diante das exigências desse ciclo de crescimento. Ele precisa ser mantido para reduzir o grau de miséria, que não acaba só com o Bolsa-família. Não temos ainda uma política realista de educação, a maioria das universidades privadas é ineficiente; pouco se fez para disseminar os cursos profissionalizantes, de menor duração e menos caros, empurrando os estudantes para faculdades que não os preparam para o que o mercado de trabalho precisa. Só em infra-estrutura, incluindo usinas hidrelétricas, serão necessários R$ 100 bilhões. RANZINZICE? Muitíssimo pouco está sendo feito nessa área vital para continuarmos a crescer. Pessimismo ranzinza? Nem um pouco. Como vocês, leitores, eu também estou feliz com essa nova fase que o Brasil começa a viver; também reconheço os méritos do governo, este ano, que soube capitalizar a bonança externa e atrair investimentos; também estou feliz com mais trabalhadores com emprego, ganhando e consumindo mais. Mas sou realista. Também estou preocupado com a falta de sensibilidade ao não se ver a conturbação do cenário externo, que até agora tanto nos havia favorecido. Não poderemos mais muito contar com ele. E O QUE VEM POR AÍ? Na verdade, ninguém sabe a força da tempestade que se forma lá fora. Podemos perder mercados, investidores e enfrentar uma fuga de capitais. Isso já está acontecendo. Crescimento não se mede só por anos, mas por ciclos, e depende de fatores internos e externos. Qualquer mudança acende o alerta. E esse sinal já disparou no mercado financeiro internacional. Estamos felizes e por isso não vemos nada do que se passa lá fora. *E-mail: at@attglobal.net |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, novembro 29, 2007
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