Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, setembro 26, 2006

Celso Ming - Abaixo dos 3%




O Estado de S. Paulo
26/9/2006

É cada vez mais provável que a inflação deste ano inteiro se escreva com 2 e não mais com 3, como se pensava há poucas semanas, ou com 4, como projetava o Banco Central.
Há 20 dias, os analistas se surpreenderam quando tomaram conhecimento da inflação de agosto, de apenas 0,05%. E revisaram a inflação deste ano para um número mais próximo dos 3% do que dos 4%. Agora, já se sabe o suficiente para dizer que a inflação de setembro provavelmente não passará dos 0,2%. Isso derruba ainda mais as projeções para uma inflação cuja meta oficial era de 4,5%.
Como faz todas as segundasfeiras, ontem o Banco Central divulgou as expectativas do mercado para os principais indicadores da economia brasileira, entre os quais está a inflação. Essas opiniões são colhidas entre 100 empresas, instituições financeiras e consultorias e reunidas no Relatório de Mercado. O que se viu foi que a média das expectativas, que há um mês foi de inflação de 3,78%, caiu para 3,03%.
Não será surpresa se a próxima pesquisa trouxer uma inflação na casa dos 2%. (O primeiro gráfico mostra como está caindo a inflação medida em 12 meses pelo IPCA; o segundo aponta a evolução da expectativa do mercado para a inflação deste ano.) Se uma inflação abaixo dos 3% se confirmar, o Brasil terá inflação de primeiro mundo. As projeções da Economist Intelligence Unit são de que, em 2006, os Estados Unidos terão inflação de 3,5% e a Espanha, de 3,7%.
Embora não o reconheçam oficialmente, em nenhum momento as novas projeções estiveram entre as favas a serem colhidas pelos diretores do Banco Central. Um vagão de críticos dirá que essa é prova cabal de erro de dose. Mas esses críticos não têm por que fazer tal cobrança.
Quem argumentava que no Brasil os juros não funcionam para baixar a inflação não pode agora alegar que o efeito de juros altos demais foi exagerado.
Os analistas ainda levarão algum tempo para entender a intensidade dessa queda, tão forte a ponto de escapar a muitos prognósticos. O argumento de que o câmbio colaborou não ajuda porque o câmbio é um dos canais pelos quais a política de juros se transmite aos preços.
Talvez se possa dizer que uma melhor sintonia entre o Banco Central e o mercado tenha aumentado a eficácia do gerenciamento das expectativas, o que, por sua vez, otimizou a política monetária. Ben Bernanke, o presidente do Federal Reserve (Fed), compara esse efeito ao que se obtém num barco a remo com patrão. Quando o patrão canta o ritmo das remadas, o barco não perde o rumo e chega mais eficazmente a seu objetivo.
A ata da última reunião do Copom adverte os interessados de que, apesar do melhor desempenho dos preços, é preciso contar com a inflação adicional que seria produzida pelo reajuste das cotações dos combustíveis, especialmente o da gasolina e o do gás de cozinha. Em menos de 20 dias, os preços internacionais do petróleo caíram mais de 10%, a níveis que agora dispensam novos reajustes dos combustíveis, uma vez que os preços da gasolina no mercado interno já estão mais altos do que seu equivalente no mercado internacional.
O impacto de uma inflação bem mais baixa do que a projetada não termina no dia 31 de dezembro, com a troca de calendário e o espocar dos fogos de vista.
Ele levará para 2007 um arrasto inflacionário igualmente mais baixo e tenderá a facilitar o cumprimento da meta do ano que vem, também de 4,5%.
Enfim, este fator novo obrigará o Banco Central a pospor a precocemente anunciada temporada de "parcimônia" na poda dos juros. Dificilmente, as próximas reuniões do Copom elevarão a dose do corte, atualmente de 0,5 ponto porcentual. Isso sugere que o afrouxamento monetário seguirá 2007 adentro.

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