Entrevista:O Estado inteligente

sábado, setembro 23, 2006

VEJA Ciência A menina que subia em árvores

Fóssil de criança ajuda a entender
a transição entre o símio e o homem



Leoleli Camargo

Jballay/AP



O crânio e o provável rosto de Selam: pernas de gente, mãos de chimpanzé

Uma equipe de arqueólogos anunciou na semana passada a descoberta de um fóssil que joga luz sobre um período ainda pouco conhecido da evolução: aquele em que os ancestrais do homem perdiam os últimos traços herdados dos macacos. Os ossos, encontrados numa região desértica da Etiópia, são de uma menina que viveu há mais de 3 milhões de anos. Pertencem à espécie Australopithecus afarensis, a mesma de Lucy, o fóssil descoberto em 1974 que se supõe seja um ancestral direto do homem moderno. Os arqueólogos acreditam que a menina – batizada de Selam, que significa paz no idioma etíope – viveu até os 3 anos e, pelo bom estado de conservação dos ossos, provavelmente morreu numa enxurrada e foi soterrada por areia e pedras. A estrutura do fêmur de Selam indica que ela já andava ereta. Em contrapartida, os ombros e os braços são semelhantes aos dos gorilas, e o único dedo da mão completo encontrado na escavação é grande e curvado, como os dos chimpanzés. "Isso nos leva a concluir que a espécie era bípede, mas também subia em árvores quando necessário", disse a VEJA o paleontólogo etíope Zeresenay Alemseged, do Instituto Max Planck da Alemanha, chefe da equipe que descobriu Selam.

Os cientistas levaram cinco anos para remover o fóssil da menina do bloco de arenito que o envolvia, usando instrumentos semelhantes a brocas de dentista. Ao final, tinham o crânio praticamente inteiro, a espinha dorsal, os ossos do tronco, dos braços, das pernas e do pé esquerdo. Selam é também o mais antigo e o mais completo fóssil de criança já achado. Uma reconstituição artística de sua aparência, feita pela National Geographic Society, mostra uma Selam parte humana, parte símia. Ao encontrar o fóssil, os paleontólogos comemoraram ainda o excelente estado de conservação do osso hióide, situado na base da língua, que não costuma preservar-se no processo de fossilização. O osso hióide de Selam fornecerá informações sobre que tipo de sons a espécie produzia e ajudará os cientistas a entender melhor a origem da linguagem humana.

Zeresenay Alemseged/Reuters




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