Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, setembro 26, 2006

Golpe fantasioso



EDITORIAL
O Globo
26/9/2006

Desde que o escândalo do mensalão trincou a imagem do PT, militantes do partido - com o então ministro José Dirceu à frente - lançaram a tese do golpismo como maneira de defender a legenda e suas biografias das acusações de corrupção e falta de ética. Assim que o clamor cresceu, com a descoberta da "sofisticada organização criminosa" criada para bombear dinheiro ilícito no caixa dois do PT e aliados, o ainda ministro, o mais atingido pelas denúncias de Roberto Jefferson, lapidou a tese do "golpe das elites".

A idéia era risível, e a manobra, primária. Mesmo assim, a tese ressurge entre petistas, agora com o próprio presidente-candidato Luiz Inácio Lula da Silva a puxar o discurso. E, sintomaticamente, quando, mais uma vez, o partido é apanhado numa ilegalidade. O fantasma conveniente do golpe é ressuscitado devido à descoberta, pela PF, da rocambolesca Operação Tabajara, nome adequadamente dado à montagem do suposto dossiê contra as candidaturas de José Serra e Geraldo Alckmin.

Mesmo sendo o golpe inverossímil por todas as evidências, a manipulação desse fantasma não ajuda à democracia e ao processo eleitoral. Feita numa tentativa vã de encobrir mais um show de malfeitorias criminosas de militantes petistas, a denúncia do hipotético golpe pode contaminar as eleições de tensões indesejadas.

Não existe qualquer risco no ar de se impedir a reeleição do presidente Lula - a não ser pelo voto, como em qualquer democracia. Se golpismo existisse, ele seria do próprio grupo de petistas que, na conspirata para desestabilizar as candidaturas tucanas, empreenderam uma operação-pastelão, cujo resultado prático foi uma das mais eficientes manobras de auto-sabotagem de que se tem lembrança na vida política brasileira.

A lamentar, também, os comentários inadequados do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Marco Aurélio de Mello, sobre semelhanças entre o escândalo e Watergate. Na condição de magistrado, o ministro deve se pronunciar por meio dos autos. E, nem assim, seriam aceitáveis tais comentários, mais adequados a políticos de oposição.

Ao delírio da denúncia de golpe não se pode somar qualquer outro fator de perturbação. Muito menos partindo da Justiça Eleitoral.

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