Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, setembro 28, 2006

A vez do "Fora imprensa!"


Artigo - Fernando Canzian
Folha de S. Paulo
28/9/2006

EVENTUAIS suspeitos de crimes ou trambiques não são, necessariamente, incompetentes. Muitas vezes, ao contrário. Não é à toa que o presidente Lula pode se reeleger no primeiro turno no domingo, apesar de quase todos os seus homens de confiança terem sido abatidos por escândalos.
No leito da popularidade de Lula correm hoje razoáveis fundamentos econômicos obtidos nos últimos três anos. Nada extraordinário, já que o Brasil surfou no melhor contexto econômico mundial dos últimos 30 anos. Mas o governo poderia ter perdido essa chance.
Desde 2003, o país faz forte ajuste nas contas externas e tem hoje saldo positivo nas transações com o mundo. As reservas devem fechar o ano em US$ 80 bilhões, e o país terá uma dívida pública interna menor e desdolarizada. Já a dívida externa pública foi zerada.
Para o chamado povão, esse "economês" se traduz, basicamente, em inflação baixa e mais comida na mesa. Com a ampliação dos programas sociais e os aumentos dos benefícios da Previdência, os pobres viram dobrar nos últimos três anos o poder de compra em relação à cesta básica. Com mais 5,7 milhões de empregos formais, isso tudo desembocou na tão falada criação da "renda chinesa" em 2006.
Mas economia é uma coisa; corrupção e política, outra. Lula e o PT agora querem misturar água e vinho, como se uma boa sangria gelada pudesse embotar as suspeitas que derrubaram tanta gente.
Lula ataca o "partidarismo da imprensa" e exige uma "cobertura republicana". Os petistas falam em "golpismo" da mídia. Principalmente depois que a gasolina do dossiê ateou fogo à campanha. O que o PT e Lula esperavam?
Que a mídia perdoasse o mensalão e o dossiê? Que não expusesse a turma de quinta que ronda o Planalto? Que aceitasse o Lula traído em nome do neo "rouba mas faz"?
É bom lembrar que o presidente "vítima" da imprensa é o mesmo que pedia o nada republicano "Fora FHC!". É o mesmo que se nega, mês após mês, a dar uma entrevista longa e decente para os grandes jornais. O mesmo que não vai a debates e que se recusa a enfrentar sabatinas. O que quer Lula agora?
O "Fora imprensa!"?
Antes de falar mal da mídia, o presidente deveria dispor-se a falar "para a mídia". Mesmo um presidente acossado pelo caos no Iraque como George W. Bush se submete quase quinzenalmente a entrevistas coletivas desconfortáveis, mas respeitosas. Lula simplesmente não fala, não encara, não se expõe.
Pior, não se explica. Só faz isso em discursos inflamados dirigidos "aos seus" ou em raríssimas e rápidas entrevistas na TV. Na reta final, criticar a mídia virou saída fácil de quem tem medo das próprias respostas -e não exatamente do calibre das perguntas.

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