Entrevista:O Estado inteligente

domingo, setembro 24, 2006

Como caiu o potencial de crescimento do Brasil

Mailson da Nóbrega

A economia brasileira começou a perder dinamismo nos anos 70 por conta da exaustão do nacional-desenvolvimentismo, processo agravado com os dois choques do petróleo (1973 e 1979), a elevação dos juros nos EUA (1980) e a crise da dívida externa detonada com a moratória mexicana (1982).

O vendaval viria com a Constituição de 1988, o maior desastre fiscal da história do Brasil. Suas conseqüências mais graves - a elevação da carga tributária e a redução do investimento - minaram o crescimento.

Nenhum dos países em desenvolvimento de melhor desempenho - Coréia do Sul, China, Índia, Rússia, Chile e México - experimentou algo tão devastador.

Os três piores efeitos fiscais foram a criação do Regime Jurídico Único dos servidores públicos, a ampliação dos benefícios previdenciários e sociais sem base na arrecadação e a maior vinculação de recursos em favor da educação. O quadro piorou com a transformação do salário mínimo em piso previdenciário. O Orçamento se enrijeceu. As despesas primárias explodiram.

As despesas obrigatórias se expandiram nos anos 1990 com a implementação dos benefícios para os idosos, a criação da vinculação para a saúde e os aumentos substanciais do salário mínimo. Hoje, incluindo os juros, essas despesas superam 33% do PIB. Mais de 90% das receitas da União passaram a ter destinação obrigatória. No princípio, a elevação das despesas foi financiada pela inflação.

Com a estabilidade, a saída foi o endividamento (daí os juros altos), a elevação da carga tributária e a compressão de gastos como os investimentos (daí a deterioração da infra-estrutura). Tome ineficiência.

A carga tributária teve salto sem paralelo, de 24,3% para 37,7% do PIB entre 1987 e 2005, mas nosso nível de renda não permite arrecadar tanto de forma racional, o que gerou tributos distorcivos e danosos ao potencial de crescimento.

O nível crescente e perverso da carga tributária provocou mais sonegação e informalidade. A reação foi tributar mais quem não podia sonegar. A União onerou o sistema financeiro, elevando o spread bancário e os juros. Os Estados tributaram mais as telecomunicações, a energia e os transportes, agravando segmentos fundamentais para o crescimento. Mais ineficiência.

A carga tributária acarretou mais dois efeitos negativos: (1) a elevação da burocracia e, assim, dos custos de transação; (2) o aumento da regressividade do sistema.

Esses e outros desastres foram evidenciados no excelente estudo coordenado pela professora Maria Helena Zockun, do qual participaram ela e outros pesquisadores da Fipe (Simplificando o Brasil: Propostas de Reformas na Relação Econômica do Governo com o Setor Privado, patrocinado pela Fecomércio).

Nas famílias que ganham até dois salários mínimos por mês, a carga tributária sobre a renda total piorou, alcançando 48,8% em 2004. Nas de mais de 30 mínimos, a carga é de 26,3%. Os números são eloqüentes.

Como diz o estudo, “cargas tributárias muito elevadas e regressivas em relação à renda do contribuinte resultam em menor tamanho do mercado interno e menor potencial de crescimento”.

A situação é pior do que aponta o estudo. De fato, enquanto nos países desenvolvidos a regressividade tributária pode ser compensada por transferências de programas sociais, no Brasil ela é agravada. Os gastos com aposentadorias, educação e saúde beneficiam relativamente mais os estratos de renda mais alta.

A Constituição de 1988 contribuiu também para reduzir o potencial de crescimento ao piorar a legislação trabalhista. Houve ampliação dos encargos sobre a folha de salários, dos custos de demitir e da já excessiva regulação do mercado de trabalho.

Não fossem a abertura da economia e a estabilidade macroeconômica dos últimos anos, que contribuíram para reverter a queda na produtividade total dos fatores de produção (mas não para restaurar níveis anteriores aos ano 80), a economia brasileira estaria amargando níveis mais medíocres de crescimento.

Reformas para mudar esse quadro são complexas e demoradas, o que permite qualificar de sonho as idéias de que o Brasil pode voltar a crescerde 5% a 6% ao ano de forma rápida e sustentada. Pior é a insistência dos que acham que tudo se resolve com “ousadia” na política monetária, via ação voluntarista sobre os juros e o câmbio.

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