Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Villas-Bôas Corrêa Jobim atiça a crise entre a toga e o Congresso

The image

Candidato, nas dores da véspera da definição, costuma cometer os pecados veniais da pressa nos surtos de angústia. Mas, o companheiro ministro Nelson Jobim saltou a cerca dos limites para o ineditismo do gesto típico de candidato em campanha, em pronunciamento de comício, na tribuna de presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).

Nada faltou ao ato memorável. As imagens nos noticiários das TVs, as fotos nos jornais, o flagrante histórico dos cochichos entre os companheiros da cúpula do Executivo e do Judiciário completam o texto das matérias. Na sessão solene de abertura dos trabalhos do Judiciário, o companheiro candidato à reeleição em campanha ostensiva em tempo integral, derrete-se em sussurros ao pé do ouvido do companheiro Jobim, aspirante à vaga aberta de candidato à vice-presidência.

Certamente que não faltam as explicações óbvias de que a foto registra uma banal troca de impressões, o que é evidente.

Mas, fotos têm o seu simbolismo. A do enlevado colóquio entre parceiros de uma sólida aliança provada em momentos críticos é o documento que dispensa legenda.

Ilustra e ilumina o insólito pronunciamento do companheiro Nelson Jobim, da encenada indignação do desabafo contra as críticas da imprensa à confirmação de que antecipará por três meses a despedida da toga até fim de março (por coincidência, a tempo renovar o alistamento no PMDB e de ser candidato nas eleições de 1º de outubro), o que se ajustaria, como luva em mão que pede voto, na mudança para o palanque do companheiro Lula.

A irritação trai a impaciência com as cobranças que chovem em temporal a inundar o pedaço. O advogado Ivan Nunes Ferreira protocolou no STF a interpelação ao ministro Nelson Jobim - em seu nome e de 36 ilustres signatários, entre os quais o jurista Goffredo da Silva Teles, o arcebispo de Mariana, Dom Luciano Mendes de Almeida, o presidente da Associação Brasileira de Imprensa, Maurício Azedo – para que ele declare se é ou não candidato a cargo político nas eleições deste ano. No caso afirmativo, deve renunciar imediatamente à presidência do STF e a função de ministro, sob pena de ser denunciado por crime de responsabilidade.

Um desagradável enguiço no esquema montado com cuidado e antecedência. Desde a jogada de mestre, em meados do ano passado, quando logrou a proeza, com a preciosa ajuda do então presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti (que renunciou ao mandato, enrascado no escândalo do recebimento de propina do dono do restaurante que funcionava na Câmara) da aprovação fulminante, nas duas Casas do Congresso, do aumento dos salários dos ministros do STF em dose dupla: de R$ 19 mil para R$ 21.500, em 2005, retroativo a 1º de janeiro, com direito à bolada dos atrasados e, em novo salto olímpico para R$ 24.500 neste ano.

No caso, tacada com repique na tabela: o previdente articulador do reajuste para os ministros da mais alta Corte da Justiça, garantiu a aposentadoria confortável, no teto próximo da lua; afagou os seus colegas e a toda a corporação, regada pela generosidade da solicita viúva.

Antes de despir a toga, como companheiro fiel agora e em prováveis futura jornadas, o ministro Nelson Jobim prestou um serviço inestimável ao candidato Lula.

Com duas pancadas na moleira tonteou a temida CPI dos Bingos que vinha infernizando a paciência do governo e do presidente com a teimosia em apurar denúncias que arranham a porta do seu gabinete no Palácio do Planalto.

Com a concessão de duas liminares, numa impediu que a CPI quebre os sigilos bancários, fiscais e telefônico do presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, o prestimoso amigo mão-aberta de Lula, que jura que pagou do seu bolso, espontaneamente, sem o conhecimento de beneficiário, a dívida de R$ 29.400, contraída com o partido da desbotada bandeira vermelha e, noutra, dispensa o empresário Roberto Carlos Kurzweil de ser importunado com suspeitas impertinentes, como a de ter intermediado a doação da bagatela de R$ 1 milhão de empresários de bingos para a campanha do PT e ainda de alugar o carro para o transporte dos dólares em caixas de uísque, da doação de Cuba para o caixa dois petista.

Ninharias. Uma crise entre o Judiciário e o Legislativo, que envolva e respingue no governo e no candidato à reeleição é a última das trapalhadas que pode tumultuar o trecho final do primeiro mandato de Lula e elevar a temperatura da campanha à fervura da insanidade.

Há tempo para o apelo ao bom senso e ao comedimento dos agitados pela ambição. Prazo curto, antes que o bate-boca descambe para a baixaria das acusações cruzadas.

O que não falta é munição no paiol.


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