no mínimo
13.06.2005 | Fosse possível fotografar um país, o Brasil teria nesta segunda-feira o péssimo retrato de uma nação parada à espera de tudo o que está cansada de conhecer. Em outros tempos, não foram poucas as vezes em que a expectativa nos imobilizou. Desde Getúlio, para não esticar demais o passado, volta e meia o país se pilhava olhos e ouvidos postos no desconhecido. Parou diante de um golpe de estado, da morte de Tancredo e até de um presidente que escolheu a rapina como forma de governo. Nunca, porém, como agora que aguarda o que dirá na terça-feira, 14, o deputado Roberto Jefferson, um político de elevada estatura e baixa extração.
Perseguidor de jornalistas, zagueiro truculento contra todos os ataques às falcatruas do governo Collor e, até poucos dias, amigo do peito do presidente da República, Jefferson reinou a semana passada de ponta a ponta. Teve o país na mão. Derrubou a bolsa, fez subir o dólar, o risco-país, os juros futuros e o que mais regule a jogatina do mercado financeiro. Na quarta-feira veio o alívio: a um colega deputado Jefferson revelou que não tinha mais gravações. Queria dizer o seguinte: não tinha havido arapongagem na conversa entre ele, José Dirceu e Aldo Rebelo. Ninguém sabe se isso é ou não verdade. Mas o Brasil soltou a respiração. A bolsa reagiu, o dólar voltou para o lugar das últimas semanas e o risco se acomodou.
Ou seja: o país inteiro tem consciência de que num encontro entre o deputado que um burocrata dos Correios chamou de bandido e dois ministros do governo o que sai não pode ser repetido perto das crianças. Mas, sem fitas, um dia o dito acaba ficando pelo não dito e segue o baile. Afinal, não é de hoje que Jefferson e dinheiro grosso andam juntos no noticiário. Aí está o caso Rodonal (aquele das tarifas de ônibus corrigidas sempre acima da inflação) do governo Collor em que Roberto Jefferson teria sido indenizado com um milhãozinho de cruzeiros reais (dinheirinho da época) para abrir mão do cargo no ministério da Fazenda que pretendia para um, digamos, afilhado seu. Foi um escândalo que deu em quê? Em nada. Como deu em nada a malinha de dinheirinho que o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, enviou a Goiás para comprar uma fazendinha. O mesmo destino está tendo a vampiragem de dinheiro no ministério da Saúde.
O pior de tudo, no entanto, é que o país credita ao bla-blá-blá que Roberto Jefferson promete para terça-feira a importância de um pronunciamento de chefe de Estado. Bobagem da grossa. Ele apenas tentará se afastar das falcatruas nos Correios e no Instituto de Resseguros do Brasil. Se tiver mais pólvora na pistola vai guardar para novos tiroteios ou para influenciar os rumos da CPI. Com o que já foi dito sobre Jefferson ou sobre a mesada que Delúbio pagaria a deputados da base do governo, o Congresso já pode investigar tudo e passar a vassoura na quadrilha. É só o PT parar de pensar que defender o governo é cavar a própria sepultura e permitir a apuração.
Se o governador de Goiás, Marconi Perillo, sabia da história do mensalão há quase um ano, se dois deputados goianos (um deles Raquel Teixeira) tinham sido assediados por esse trem pagador e se o deputado Miro Teixeira ouviu de Jefferson em dezembro o relato da mutreta alguém ainda tem dúvida de que ela existia? Agora só falta botar o guizo no gato. Para fazer o serviço completo, é oportuno perguntar ao presidente Lula por que, tendo recebido do deputado petebista a denúncia há um ano, mandado investigar e recebido a informação de que não havia nada, continuou considerando Jefferson confiável a ponto de entregar-lhe um hipotético cheque em branco. Como não se pode aceitar que o presidente, pelo tempo de estrada, seja ingênuo alguém deixou a porta aberta para que o país imagine o pior: ou seja, aí tem.
Entrevista:O Estado inteligente
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