folha de s paulo
Não escapa ao analista mais cuidadoso uma característica importante dos dias turbulentos que estamos vivendo: os preços dos principais ativos brasileiros, apesar de um aumento importante na volatilidade, não refletiram ainda a crise do governo Lula. Um exemplo claro desse comportamento é a cotação do dólar em relação ao real: R$ 2,37, em 30 de maio e R$ 2,406 ontem.
A primeira lição desse comportamento inusitado é que a participação crescente de agentes financeiros internacionais nos negócios com ativos brasileiros explica de forma importante essa mudança. Isso já era conhecido dos que vivem o dia-a-dia dos mercados, mas, agora, temos uma prova inconteste dessa nova realidade.
A internacionalização de nossa economia aumentou muito nos últimos anos, tanto pelo canal do comércio internacional como pelo financeiro. Nossas exportações, somadas às importações, já representam mais de 25% do PIB. Embora ainda longe de outras economias, esses números são significativamente maiores do que no período anterior ao Plano Real, quando chegavam a menos de 15%.
A maior participação de fundos de investimento internacionais nos negócios financeiros no Brasil é um fenômeno ainda pouco conhecido por nós. Há algum tempo, recebi a visita de um executivo-sênior de um dos grandes bancos internacionais, que me trouxe a mensagem de que os mercados têm, hoje, uma visão muito positiva da economia brasileira. Mais de uma década de política macroeconômica responsável e de respostas eficientes por parte do tecido econômico brasileiro mudaram a opinião sobre o Brasil. Essa foi a notícia boa.
Ele tinha, também, uma informação não tão boa para me dar. Esse maior respeito pela nossa economia faria com que os negócios com nossos ativos aumentassem, com a participação de agentes importantes, como os grandes fundos de investimento. Portanto passaríamos a sofrer a influência dos movimentos bruscos que ocorrem, de tempos em tempos, no incrivelmente grande mercado financeiro global. Como ele mesmo disse, para o bem e para o mal.
Depois de sua visita, já tive oportunidade de vivenciar pelo menos dois momentos em que suas previsões, do lado ruim, ocorreram. O primeiro, em abril do ano passado, por ocasião da mudança da política monetária do Fed. O segundo, em março deste ano, com o colapso dos títulos de crédito da General Motors e da Ford. Estamos, agora, vivendo um período no qual a influência dos agentes internacionais sobre nossos mercados tem sido benéfica para o equilíbrio econômico. O que mostra que nossa internacionalização tem mesmo essas duas faces.
A crise política criada pelas denúncias de corrupção no governo Lula está ocorrendo em um momento muito tranqüilo nos mercados internacionais. Isso tem favorecido os títulos dos países emergentes, na medida em que reduz os receios com uma nova rodada de redução de riscos por parte dos investidores. Nesse cenário, a busca por rendimentos maiores aumenta a demanda por investimentos em países como o Brasil. Como os juros, em nosso mercado, são muito superiores aos de nossos concorrentes, acabamos por receber um fluxo ainda maior.
Outro fator importante no posicionamento dos investidores estrangeiros, em relação à crise atual, tem sido sua atitude mais fria perante as denúncias. Isso se dá por várias razões. A primeira é a leitura de que a crise aumenta o poder político do ministro Palocci, fiador da política econômica atual. Uma eventual saída do ministro José Dirceu será vista, assim, como um fortalecimento de sua posição e um reforço na blindagem da política econômica. A segunda leitura que encontramos entre os investidores estrangeiros é a de que, no limite, será o PSDB o grande caudatário de um abandono por parte do eleitor do presidente Lula. Sendo isso verdade, faz com que a volta dos tucanos ao poder represente uma continuidade na política econômica que vem sendo praticada desde 1995.
Entrevista:O Estado inteligente
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