Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, junho 17, 2005

PT: Encontro Nacional Extraordinário já! PLINIO ARRUDA SAMPAIO e IVAN VALENTE

folha de s paulo

Hoje é patente que as divergências internas quanto aos rumos do Partido dos Trabalhadores chegaram a um ponto extremo. Agravadas pela crise aguda envolvendo a governabilidade e questões éticas, essas divergências estão impedindo a unidade da ação partidária. Elas têm origem na ilegitimidade das posições assumidas pela maioria da direção do partido ao desrespeitar as resoluções do Encontro de Olinda, em 2001, e, mais que isso, ao desrespeitar toda a histÓria do PT.


A demissão de José Dirceu é o reconhecimento da crise da proposta capitaneada pela maioria no PT e no governo


Na verdade, as divergências agravaram-se muito após a posse de Lula na Presidência da República, em razão, especialmente, das políticas que ele adotou no plano econômico e no plano das alianças políticas.
Logo no inicio do governo, um grupo de amigos do presidente, perplexos com os rumos da administração, enviaram-lhe uma carta solicitando mudanças de rumo. Não foram sequer recebidos. Um pouco mais adiante, 300 economistas do partido lançaram um manifesto com críticas severas à condução da economia e propostas de mudança. Igualmente não foram recebidos. Não demoraram as demissões de auxiliares muito próximos do presidente, sempre muito discretas, mas nem por isso menos significativas. Finalmente, vieram as "insubordinações" e defecções de deputados, senadores e militantes -algo inédito em uma bancada caracterizada até então pela estrita disciplina.
Note-se que essas divergências são todas políticas e que precedem, de muito, os problemas que surgiram agora com as denúncias de corrupção.
As vacilações da direção partidária no enfrentamento dessas denúncias -ora recomendando aos parlamentares que impedissem a constituição de CPI para apurá-las, ora sugerindo que todos assinassem os pedidos de convocação- são sinais evidentes de perda de controle sobre os acontecimentos.
Por isso, estamos propondo, com base no estatuto, a convocação imediata de um Encontro Nacional Extraordinário, a fim de revisar a posição do partido em relação às duas políticas anteriormente mencionadas: a política econômica e a política de alianças.
Não cabe na cabeça dos petistas que, após dois anos e meio de governo, o modelo econômico de FHC não tenha sido alterado na essência e, em alguns casos, tenha sido mesmo agravado, como no caso do superávit primário, que economiza R$ 44 bilhões em quatro meses para "honrar" contratos com o capital financeiro e tranquilizá-lo, enquanto os contratos com o povo ficam sem recursos para a reforma agrária, a educação, a saúde, o saneamento e a infra-estrutura do país.
É inaceitável que se impeça o desenvolvimento do país, a geração de emprego e a distribuição de renda pagando a maior taxa de juros do mundo -para alegria dos rentistas-, enquanto somos campeões em concentração de renda, de terra e de riqueza.
Fica difícil, também, explicar uma política de alianças com forças políticas retrógradas, contrárias à mudança social, incrustadas no aparelho do Estado para permanentemente parasitá-lo pelo fisiologismo e pela corrupção. Em nome dessa governabilidade, que dispensa o movimento social organizado e a pressão popular legítima, o governo sofreu inúmeras derrotas no Congresso, inclusive a perda da presidência da Câmara de Deputados.
Governabilidade com partidos que não comungam nem irão concordar com as propostas do nosso projeto democrático e popular se afastariam, imediatamente, se assumíssemos, de frente, nosso projeto transformador. Daí a necessidade de rever a política de alianças.
Isso requer um esclarecimento preliminar: toda pessoa é inocente até que se prove o contrário, de modo que a proposta de revisão da política de alianças que estamos fazendo não implica a aceitação de que algum membro do PT haja atuado de modo inconveniente.
Trata-se de uma objeção política: o regime de governo é presidencialista e a Constituição confere ao presidente da República atribuições suficientes para governar mesmo sem dispor de maioria no Congresso. Ele dispõe do veto, da iniciativa das leis que envolvem gastos e, sobretudo, da faculdade de dirigir-se a qualquer momento à opinião pública.
A experiência histórica demonstra que o Congresso jamais deixou de aprovar um projeto que conseguiu obter apoio na opinião pública.
Portanto, o presidente Lula, eleito com 53 milhões de votos, tem tudo de que precisa para executar seu programa de governo, sem necessidade de constranger a si próprio e aos seus companheiros de partido com alianças que provocam escândalo em seus eleitores.
A demissão do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, é o reconhecimento da gravidade da hora e da crise da proposta capitaneada pela maioria no PT e no governo.
Daí a urgência de decisões coletivas e de mobilização da nossa militância.

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