Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, junho 07, 2005

Omissão criminosa JB EDITORIAL

A gravíssima denúncia publicada há oito meses pelo Jornal do Brasil foi confirmada ontem pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-SP), numa perturbadora entrevista à Folha de S.Paulo. Agora, só os muito cínicos ousarão contestar a infiltração, no código de práticas semiclandestinas forjado nos porões do poder, do odioso ''mensalão''. Assim se batizou a propina distribuída entre integrantes da ''base aliada'' para garantir a aprovação no Congresso do que interessa ao Palácio do Planalto.

Escancarada pelo presidente do PTB, essa excrescência se afigura ainda mais inquietante por atingir diretamente o coração do PT e, sobretudo, a alma do governo. Antes que o presidente Lula da Silva soubesse da existência do tumor, relatada pelo próprio Jefferson no começo deste ano, o chefe do PTB garante ter tratado do problema em escalas nos gabinetes dos ministros José Dirceu (Casa Civil), Antonio Palocci (Fazenda), Walfrido Mares Guia (Turismo) e Ciro Gomes (Integração Nacional).

Ou por duvidarem de tamanha maroteira, ou por preferirem passar ao largo de temas muito explosivos, nenhum deles agiu, nenhum nem sequer tocou no assunto com o presidente. O único a reagir foi o então ex-ministro Miro Teixeira: há oito meses, ele revelou a existência do balcão de compra e venda de votos.

Internamente, o discurso de Miro não fez sucesso. Ele entendeu que o mais sensato seria deixar o governo antes de ser contagiado pelo epidêmico menosprezo a valores morais. Segundo Jefferson, também o presidente da República parece não ter renunciado por completo ao respeito a códigos éticos e legais: ao saber da história, Lula chorou. Enxugadas as lágrimas, mandou ''meter o pé no breque''.

Jefferson assegura que, desde aquela conversa, foi interrompida a farra do mensalão. É muito pouco. Em vez de denunciar o absurdo e castigar os responsáveis, Lula preferiu calar-se, a exemplo do que haviam feito os ministros. Tal omissão configura crime de responsabilidade. Delitos semelhantes bastaram para desencadear o processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello.

O chefe de governo está obrigado a informar se, onde, como e quando soube do ''mensalão''. O vice José Alencar deve explicações sobre o envolvimento do seu PL no esquema ignominioso. Sejam quais forem as respostas, a CPI dos Correios agora tornou-se, mais que recomendável, urgentíssima. É essencial saber-se até que ponto o partido alçado ao poder no papel de guardião da moralidade afundou no pântano das tentações do mando.

As denúncias de agora, insista-se, reafirmam a montagem na Praça dos Três Poderes de uma feira de negócios suspeitíssimos. As barracas foram atingidas pelos torpedos de Roberto Jefferson - a quem o presidente Lula garantiu que não perderia o sono se lhe oferecesse um ''cheque em branco''. Dos escombros emergiram comerciantes de votos que se valem de siglas sem programa, sem projeto, sem princípios, mas com muita gula por dinheiro e poder. Esses partidos de fantasia precisam acabar. Já.

Lancetados os tumores enfim radiografados, em outro episódio que reitera a relevância da imprensa livre e independente, a democracia pode tornar-se até beneficiária da crise em curso. Que os homens de bem e os políticos decentes do governo e da oposição se unam na pronta resposta. Precisam comprovar que o regime dispõe de instrumentos para deter a corrupção. É a hora do ponto final na impunidade.

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