Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, junho 02, 2005

Miriam Leitão:Ajuste na previsão

As próximas semanas vão mostrar uma queda das previsões de crescimento do PIB, porque os analistas estarão ajustando suas expectativas ao que aconteceu no primeiro trimestre. A inflação, em compensação, pode cair nos próximos meses e, assim, melhorar a perspectiva do ano. Se ela cair fortemente, isso pode apressar a decisão do Banco Central de reduzir os juros.
O problema é que há sazonalidade também nos preços e eles costumam subir mais fortemente no segundo semestre. A esperança é de que a elevação dos juros e a queda do dólar, enfim, permitam a redução dos preços. Os juros ocupam espaço tão exagerado no debate brasileiro quanto no esforço fiscal do país. Até agora, a discussão foi sobre o fim do período de aumento das taxas. Em junho, há uma grande chance de que o ciclo de alta seja interrompido. Aí começa uma segunda etapa da interminável discussão sobre o tema: quando eles começarão a cair.


O IPCA de maio deve cair para perto de 0,60%. Em junho, vai cair de novo; para perto de 0,40%. O problema é julho, quando pode voltar a subir por causa de alguns aumentos de preços administrados, entre eles energia em São Paulo.

A intensidade dessa queda vai determinar o rumo da política de juros. Por enquanto, a esperança é de que em setembro os juros comecem a cair. A grande dúvida é o que acontecerá com o ano eleitoral de 2006. Se houver novos episódios de alta de inflação, será possível subir de novo a Selic num momento em que o governo estará lutando por mais um período de quatro anos?

A agropecuária, que segurou o PIB no primeiro trimestre, deve, em algum momento, mostrar na estatística o efeito da quebra de 20% da safra de grãos, que aconteceu no Sul do país pelo longo período de seca. Os economistas acham que o setor agrícola, que foi o que mais cresceu no primeiro trimestre de 2005, fechará o ano com crescimento zero. Por enquanto, os dados ainda estão positivos, mostrando o efeito das altas do café e da carne no mercado internacional. Mas o setor como um todo está com problemas.

Diante dos dados divulgados esta semana, os economistas tentarão projetar o que será preciso acontecer para que se chegue ao crescimento do PIB imaginado para 2005. Com apenas 0,3% de crescimento no primeiro trimestre, o país precisaria crescer 1,6% a cada trimestre até o fim do ano para se chegar a um crescimento de 4%. Se for 3,5%, o crescimento trimestral terá que ser de 1,2%. Por isso, os analistas começam a ajustar seus cenários. Como não farão a mudança todos ao mesmo tempo, as próximas semanas vão mostrar essa queda lenta para um patamar de crescimento menor. Em março deste ano, a média das previsões era de um crescimento de 3,7%. Está em 3,5% e vai cair para 3%.

O ano não está perdido. Ainda há muita coisa boa acontecendo. Os bancos acham que, nas próximas semanas, deve se confirmar o cenário de queda da inflação, apesar de o segundo semestre ser sazonalmente de números piores. A perspectiva é de que aconteça o oposto e a queda do câmbio chegue finalmente aos preços. Os empresários trabalhavam com a hipótese de que o câmbio valorizado era temporário, mas agora já vêem esse patamar como uma tendência. Isso vai acelerar a passagem da queda do câmbio para os preços. Se assim acontecer, a inflação cairá no segundo e no terceiro trimestres, permitindo a redução dos juros.

No setor externo, as notícias continuam boas; quando se comparam as previsões feitas meses atrás com as de hoje, dá para ver quanto o cenário melhorou. No começo do ano, a previsão dos bancos e consultorias era de um saldo da balança comercial de US$ 26 bilhões. Agora é de US$ 35 bilhões, US$ 9 bilhões a mais, apesar de o dólar em queda favorecer a importação. Aliás, no setor externo, a velocidade e a profundidade da mudança do cenário impressionam. No começo de 2003, quando convidados a estimar o balanço externo em 2005, os bancos e consultoria disseram que haveria um déficit de US$ 7 bilhões na conta de transações correntes. Agora apostam em um superávit de US$ 9,4 bilhões. Os dados já confirmados mostram que o país saiu de um déficit de US$ 23 bilhões em 2001 para um superávit de US$ 11 bilhões em 2004. Ou seja, um ajuste de US$ 34 bilhões em três anos.

Mas esses bons números impressionam apenas os especialistas; os profissionais que vivem de analisar, estimar e calcular as previsões dos indicadores econômicos é que valorizam a virada externa. A população tem se mostrado cada vez mais pessimista. Os dados da pesquisa de opinião pública, divulgados esta semana pela CNT-Sensus, mostram que 45,2% dos entrevistados acham que a economia está sendo administrada de forma equivocada, cinco pontos a mais que na última pesquisa. Isso representa uma parcela de 54,6% dos que responderam a questão.

O pessimismo econômico pode aumentar ainda mais o pessimismo político. E vice-versa. Apenas 17% acham que a corrupção no governo Lula diminuiu e 77% acham que ficou igual ou aumentou. Esse não é o momento para o governo jogar com armas tão discutíveis, como tem jogado, para evitar uma CPI.

O eleitor brasileiro, decepcionado com a constatação de que o PT não era um partido melhor que os outros, como apregoava, vai enfrentar uma conjuntura econômica sem brilho, em que as más notícias serão preponderantes.

o globo

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