Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, junho 14, 2005

Luiz Garcia:Ih, esqueci!

o globo
Já se disse que a designação "agência de inteligência" é uma contradição em termos. A espionagem doméstica oficial ganhou infame notoriedade durante a ditadura militar, com a criação do Serviço Nacional de Informações em junho de 1964.


Mas desde 1946 existia o discretíssimo Serviço Federal de Informações. O fato de que nunca freqüentou manchetes pode provar que era altamente eficiente — ou totalmente inoperante. Nunca se saberá ao certo. Ele morreu em 1964, quando o regime militar instituiu o SNI, de infame notoriedade. O SNI foi extinto no governo Collor, e no mandato de Itamar Franco nasceu a Subsecretaria de Inteligência, subordinada à Secretaria de Assuntos Estratégicos. Esta passou em branco e foi substituída no governo seguinte pela Agência Brasileira de Informações.

A Abin, pelo visto, pode ser tudo, menos discreta.

Sua atuação nas tribulações atuais tem componentes estranhos. Dois fatos:

1. A agência tinha — fato confirmado por sua direção geral — um agente infiltrado nos Correios que é amigo (dado igualmente declarado ou confessado oficialmente) de um araponga privado. Este último faz parte do grupo acusado de gravar a reunião em que o então chefe de compras da ECT negociou o pagamento de suborno com dois supostos empresários.

Mandar amigo investigar amigo parece ser, pelo menos para amadores em arapongagem, um tanto imprudente: pelo menos, sugere relações perigosas entre o pessoal que grava conversas por dinheiro (ex-agentes do SNI, em muitos casos) e a turma que grava conversas em nome da pátria. No caso dos Correios, o agente da Abin e o frila que gravou são ambos ex-agentes do SNI. É o caso de se perguntar o que realmente mudou com a troca de siglas.

2. Segundo o diretor-geral da Abin, Mauro Marcelo de Lins e Silva, a investigação nos Correios era uma missão oficial. Mas ele não tem explicação para o fato de que, até quinta-feira passada, a infiltração nos Correios não fora informada à Polícia Federal, que investiga formal e oficialmente o caso. Foi, disse, "uma falha de comunicação".

Há forte odor de conversa fiada nessa explicação. Não se tratava de uma investigação entre muitas, e sim do episódio mais explosivo dos últimos anos na história política do país. E a Abin se esqueceu de contar à Polícia Federal — e, portanto, ao Palácio do Planalto — que dias antes de o escândalo explodir (nas páginas da revista "Veja") já sabia da gravação e conhecia o nome de um dos possíveis responsáveis por ela.

O comportamento da agência nada tem a ver com a denúncia do mensalão pelo deputado Roberto Jefferson. E o governo Lula já deu provas suficientes de ser perfeitamente capaz de se enrolar sem qualquer ajuda de agências oficiais.

Mas o episódio sugere — no mínimo sugere — que a agência de informações do governo federal trabalha com agenda própria. Ou sua incompetência é espetacular.

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